Embora os herbicidas sejam ferramentas indispensáveis no manejo de plantas daninhas na cultura da soja, o posicionamento inadequado dos produtos, aliado a condições ambientais desfavoráveis ao funcionamento de determinadas moléculas, pode desencadear estresses fisiológicos nas plantas. Esses estresses se manifestam por meio de sintomas de fitotoxicidade, má formação de estruturas vegetativas e, em casos mais severos, redução do potencial produtivo.
Tanto os herbicidas aplicados em pré-emergência quanto aqueles utilizados em pós-emergência podem gerar efeitos negativos no crescimento e desenvolvimento da soja, especialmente quando não são observadas as recomendações técnicas quanto à seletividade, estádio de aplicação e condições do ambiente. No entanto, é importante destacar que nem todo sintoma de fitotoxicidade se traduz necessariamente em perda de rendimento. A soja possui, em muitos casos, capacidade de recuperação, desde que os danos sejam leves e ocorra retomada do crescimento em condições favoráveis (sem estresses).
Devido à diversidade de mecanismos de ação dos herbicidas, os sintomas de fitotoxicidade variam amplamente, podendo incluir desde necroses em plântulas até deformações foliares ou redução do crescimento. Esses efeitos são mais críticos nas fases iniciais do ciclo, quando a cultura é naturalmente mais sensível a interferências químicas. Assim, a compreensão dos riscos e a adoção de práticas de manejo adequadas são fundamentais para garantir seletividade e minimizar impactos negativos sobre a produtividade.
Figura 1. Sintomas típicos da fitotoxicidade ocasionada por alguns herbicidas em soja.

Mito: qualquer sintoma de fitotoxicidade compromete o rendimento da soja
Nem todo efeito fitotóxico resulta diretamente em perdas de produtividade da soja. O dano da fitotoxicidade em soja pode estar relacionado a tolerância genética da planta ao herbicida, modo de ação do herbicida, condições climáticas e ambientais, bem como estádio do desenvolvimento da soja em que os danos são observados.
No geral a soja apresenta maior capacidade de se recuperar de injurias durante o período vegetativo do seu desenvolvimento. Com isso em vista, danos ocasionados por herbicidas de contato e/ou herbicidas cuja biotecnologia presente na cultivar contemple a tolerância ao herbicida, geralmente não comprometem a produtividade da cultura. Conforme observado por Marchi et al. (2013) e corroborado por Tadesco et al. (2025), a associação entre glifosato e distintos herbicidas pós-emergentes registrados para o controle de plantas daninhas na cultura da soja, não resulta em perdas significativas de produtividade, mesmo ocasionado efeitos fitotóxicos à cultura.
Marchi et al. (2013) avaliaram a associação entre glifosato e cloransulam, clorimuron, imazetapir e lactofen, enquanto Tadesco et al. (2025) analisaram os efeitos do saflufenacil de modo isolado ou associado com o glifosato sobre a cultura da soja. Vale destacar que o efeito fitotóxico decorrente da aplicação de herbicidas em especial na pós-emergência da soja, pode ser mitigado na maioria dos casos com o adequado posicionamento de substancias bioestimulantes que contribuem para reduzir os efeitos dos estresses nas plantas.
Tabela 1. Evolução da fitotoxicidade, produtividade e peso médio de 1000 grãos observados nas associações entre glifosato e diferentes herbicidas aplicados na pós-emergência da soja RR. Sinop, MT. 2010.

Verdade: a fito por alguns herbicidas pode comprometer a produtividade da soja
Os maiores danos decorrentes da fitotoxicidade são observados em cultivares suscetíveis aos herbicidas aplicados. No caso dos herbicidas pré-emergentes, o risco de prejuízos aumenta quando são utilizadas doses elevadas, associadas a condições inadequadas de aplicação, como o intervalo prolongado entre a semeadura e a aplicação (plante-aplique), ou à ocorrência de chuvas intensas que favoreçam o deslocamento do produto no perfil do solo. Nessas situações, pode haver comprometimento da emergência das plântulas, resultando em estandes desuniformes e perda de potencial produtivo.
Em relação aos herbicidas pós-emergentes, os danos mais severos ocorrem quando são aplicados em cultivares geneticamente sensíveis, como na aplicação de glifosato em soja convencional (não-RR), de glufosinato de amônio em cultivares sem a tecnologia Liberty Link, de 2,4-D em soja que não possua a tecnologia Enlist, ou de dicamba em cultivares que não apresentam a tecnologia Intacta Xtend.
Nessas condições, tanto a aplicação direta quanto à deriva desses herbicidas sobre áreas sensíveis pode provocar níveis elevados de fitotoxicidade, ocasionando desde reduções significativas na produtividade até a inviabilização da lavoura, em casos de morte generalizada das plantas.
Figura 2. Efeito de fitotoxicidade de Dicamba em soja não tolerante.

Avaliando os sintomas de injúrias de soja não tolerante ao dicamba e a produtividade da cultura após a aplicação de subdoses do herbicida em V3 e R1, Alves et al. (2021) observaram que uma deriva de dicamba de 1%, em condições tropicais, resulta em uma redução de até 12% na produtividade da soja.
Figura 3. Curvas taxa-resposta da estimativa de injúria visível 14 dias após aplicação do herbicida (A) e produtividade (B) obtida para a cultivar de soja Nidera 6906 RR2 IPRO (Glycine max) em função da aplicação de doses de dicamba (ácido equivalente) em dois estádios fenológicos da cultura. V3, estádio vegetativo; e R1, estágio reprodutivo.

Vieira (2018), também observou resultados similares, demonstrando que herbicidas auxínicos apresentam elevada capacidade em reduzir a produtividade em soja não tolerante, mesmo que pelo efeito da deriva. Ao avaliar os efeitos da aplicação do herbicida dicamba na cultura da soja, o autor observou que a severidade das injúrias, as alterações no teor de clorofila e os impactos sobre a produtividade variaram conforme o estádio fenológico da planta no momento da exposição e a dose do herbicida utilizada. Esses resultados indicam que tanto o desenvolvimento da cultura quanto a quantidade do produto são fatores determinantes na manifestação dos sintomas de fitotoxicidade e em seus reflexos agronômicos.
Mito: toda fitotoxicidade é causada por erro na aplicação
Embora os efeitos da fitotoxicidade sejam frequentemente atribuídos a falhas na pulverização, é importante destacar que diversos fatores, atuando de forma isolada ou em conjunto, podem induzir ou intensificar a fitotoxicidade de herbicidas na cultura da soja. Entre os principais fatores envolvidos, destacam-se o mau posicionamento dos herbicidas em relação à dose e ao momento da aplicação, as condições climáticas e ambientais (especialmente temperatura, umidade relativa do ar e umidade do solo), além de aspectos relacionados à tecnologia de aplicação, com ênfase na ocorrência de deriva, e na qualidade do preparo da pulverização, principalmente se tratando da limpeza de resíduos de herbicidas no tanque do pulverizador.
A interação entre esses fatores pode potencializar os efeitos fitotóxicos, mesmo quando a aplicação segue as recomendações técnicas. Assim, nem toda manifestação de fitotoxicidade pode ser atribuída exclusivamente a erros operacionais, sendo necessário considerar o contexto ambiental e fisiológico da cultura no momento da exposição ao herbicida.
Verdade: é possível reduzir o risco de fitotoxicidade com boas práticas
A adoção de algumas estratégias de manejo contribuem para reduzir os riscos de ocorrência de fitotoxicidade em soja. Dentre as principais ações, destacam-se:
- O posicionamento adequado de herbicidas, considerando o espectro de ação, seletividade, sensibilidade da cultura, dose e momento de aplicação;
- Ajuste de dose de acordo com características ambientais, tais como tipo de solo e suas características (textura, teor de matéria orgânica e pH);
- Respeitar o intervalo recomendado entre a pulverização dos herbicidas e a semeadura no caso da modalidade plante-aplique de herbicidas pré-emergentes;
- Evitar aplicações em períodos de estresse hídrico ou temperaturas extremas;
- Atentar para a biotecnologia presente na cultivar no que diz respeito a tolerância aos herbicidas;
- Adotar cuidados relacionados a tecnologia de aplicação e limpeza dos pulverizadores
Vale destacar que independentemente do herbicida utilizado, para evitar afeitos indesejados de fitotoxicidade na cultura, é essencial seguir as orientações presentes na bula, utilizando óleos e adjuvantes recomendados pelo fabricante, além de seguir criteriosamente as recomendações de dose, número e período de aplicações fornecidas na bula. Consulte um(a) engenheiro(a) agrônomo(a).
Referências:
ALVES, G. S. et al. PHYTOTOXICITY IN SOYBEAN CROP CAUSED BY SIMULATED DICAMBA DRIFT. Pesquisa Agropecuária Brasileira, v. 56, 2021. Disponível em: < https://seer.sct.embrapa.br/index.php/pab/article/download/26912/14872 >, acesso em: 25/07/2025.
MARCHI, S. R. et al. ASSOCIAÇÕES ENTRE GLIFOSATO E HERBICIDAS PÓS-EMERGENTES PARA O CONTROLE DE TRAPOERABA EM SOJA RR. Revista Brasileira de Herbicidas, 2013. Disponível em: https://www.rbherbicidas.com.br/index.php/rbh/article/download/173/pdf >, acesso em: 25/07/2025.
TADESCO, L. et al. FITOTOXICIDADE À SOJA PELA SIMULAÇÃO DE DOSES DE SAFLUFENACIL APLICADO EM ISOLADO OU ASSOCIADO AO GLYPHOSATE. 2° ENFIT-SUL, 2025. Disponível em: < https://revistas.uceff.edu.br/enfitsul/article/view/1023?utm_source=chatgpt.com >, acesso em: 25/07/2025.
VIEIRA, G. S. FITOTOXIDADE CAUSADA POR DERIVA SIMULADA DO HERBICIDA DICAMBA NA CULTURA DA SOJA. Trabalho de Conclusão de Curso, Universidade Federal de Uberlândia, 2018. Disponível em: < https://repositorio.ufu.br/bitstream/123456789/23787/2/FitotoxidadeCausadaDeriva.pdf >, acesso em: 25/07/2025.