Por Marcelo Sá – jornalista/editor e produtor literário
Agronegócio acompanha de perto momento crucial
Pela primeira vez desde a crise do tarifaço, os presidentes do Brasil e Estados Unidos se encontraram pessoalmente. Foi na Cúpula da Associação das Nações do Sudeste Asiático, na Malásia. Donald Trump e Lula estiveram frente a frente no último domingo, 26 de outubro, e sinalizaram que a tensão comercial entre os dois países deve diminuir mediante concessões mútuas. Os dois mandatários já vinham dando declarações mais amenas às vésperas da reunião bilateral, em contraste com a retórica inflamada que marcou os atritos dos últimos meses.
O setor agropecuário acompanha de perto essa distensão, até mesmo porque é um dos mais empenhados em gerenciar os momentos críticos, uma vez que as sanções ainda estão em vigor. Coube a lideranças do agro buscar novos destinos para commodities massivamente importadas pelos Estados Unidos, mas insistindo no diálogo com empresas e autoridades americanas. Além de uma solução para o tarifaço, o governo busca expandir a presença de produtos brasileiros em nações do bloco asiático, inclusive commodities agropecuárias.
Após a reunião, o chanceler brasileiro, Mauro Vieira, disse que a reunião “foi muito positiva” e que os dois países concordaram em negociar o tarifaço imposto ao Brasil. Segundo Vieira, Trump disse que daria instruções à sua equipe para iniciar um processo de negociação bilateral. O chefe da diplomacia brasileira já havia viajado, na semana anterior, para combinar detalhes do encontro entre os presidentes com seu colega americano, o Secretário de Estado Marco Rubio. Com o aceno do republicano, a expectativa é de que os EUA retirem a tarifa adicional de 40% imposta desde agosto sobre os produtos brasileiros. A taxa de 10% estabelecida em abril para todos os países continuaria em vigor.
Setor produtivo participará de eventuais concessões
Reservadamente, Lula tem informado a empresários que o acompanham na viagem sobre possibilidade do Brasil reduzir a alíquota de 18% cobrada sobre as importações de etanol americano, em troca de uma revisão do tarifaço, sobretudo no tocante ao café e carne bovina. A medida gera preocupação aos produtores nordestinos do biocombustível, que são contra esse alívio fiscal, mas a avaliação predominante é que essa é uma concessão necessária. A melhoria nas condições para exportação de etanol esteve no topo das prioridades americanas desde o início das negociações com o Brasil na área agrícola.
O governo federal garante, no entanto, que o setor produtivo deverá ser consultado antes de qualquer decisão, até porque ainda não existe um formato definido para a eventual retirada das tarifas. Mas o fato da reunião ter acontecido em clima amistoso, por si só, já é considerada um avanço pelos empresários exportadores do agronegócio. Além do segmento sucroenergético, os mercados de proteína animal e café, mais afetados pelo tarifaço, seguem atentos aos desdobramentos da negociação iniciada, enquanto monitoram seus embarques ainda na vigência das sanções.
Otimismo cauteloso dos segmentos mais impactados
Historicamente, o Brasil é o principal fornecedor de café dos EUA, com cerca de 30% do mercado. Em 2024, os produtores brasileiros exportaram 471 mil toneladas para os americanos, com faturamento superior a US$ 2 bilhões. Com a queda nas vendas, os embarques para lá estão em 249,5 mil toneladas até setembro, com renda de US$ 1,6 bilhão. A Associação Brasileira da Indústria de Café (Abic), em nota divulgada por seu presidente, Pavel Cardoso, avaliou que “o encontro entre os presidentes dos EUA e do Brasil foi positivo e, na Abic, estamos otimistas. As relações de longo prazo entre Brasil e Estados Unidos permitirão uma reavaliação equilibrada e responsável dessas tarifas, com base em critérios técnicos e em benefício mútuo.”
No caso da carne bovina, mesmo com retração nos embarques aos EUA nos dois meses de vigência do tarifaço (9,3 mil toneladas em agosto e 9,9 mil toneladas em setembro), as vendas continuam apoiadas na competitividade do produto nacional, segundo a Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (Abiec). Em nota a Abiec disse que “o encontro reforça a importância do diálogo para o fortalecimento das relações comerciais entre Brasil e Estados Unidos e demonstra a disposição de ambos os governos em avançar nas discussões sobre as tarifas atualmente em vigor, que afetam diferentes setores do comércio bilateral, incluindo as exportações de carne bovina brasileira.”
Cabe lembrar que a Abiec é presidida por Roberto Perosa, que já concedeu entrevista ao Portal SNA e se destacou ao participar da força tarefa com representantes do setor e autoridades, para conduzir os momentos mais sensíveis da crise que finalmente dá os primeiros sinais de arrefecimento.
Com informações complementares dos Ministérios da Agricultura, das Relações Exteriores e do Desenvolvimento, Indústria e Comércio.
Fonte: SNA




