O objetivo deste trabalho foi avaliar após 6 e 12 meses as alterações provocadas pela adição de diferentes doses de calcário e gesso agrícola no valor de pH ao longo do perfil do solo em um LATOSSOLO VERMELHO, textura muito argilosa do Norte do Paraná.

Autores: Evandro Antonio Minato¹; Carolina Fedrigo Coneglian¹; Michel Esper Neto¹; Edner Betioli Júnior²; Tadeu Takeyoshi Inoue³ e Marcelo Augusto Batista³

Introdução

Solos tropicais e subtropicais são em sua maioria altamente intemperizados, apresentando condições desfavoráveis para o adequado desenvolvimento de grande parte das culturas em decorrência dos efeitos da acidez do solo. Solos ácidos apresentam limitações ao desenvolvimento do sistema radicular das plantas devido a baixos valores de pH refletindo em altas concentrações de alumínio tóxico (Al3+) associado a baixas concentrações de bases trocáveis, como cálcio (Ca2+), magnésio (Mg2+) e potássio (K+) (BRADY, 1989).

Visando reduzir os efeitos negativos da acidez do solo, a utilização de rochas carbonatadas moídas (calcário) é uma prática consagrada em solos tropicais, resultando em aumento do pH, saturaçãopor bases, distribuindo nutrientes como Ca2+ e Mg2+ reduzindo os níveis tóxicos de Al3(OLIVEIRA; PAVAN, 1996). Em sistemas de manejo conservacionistas que visem o mínimo revolvimento do solo, o calcário é aplicado em superfície sem incorporação (CAIRES et al., 2000). Devido à baixa solubilidade do calcário (ALCARDE, 2005), alguns trabalhos têm demonstrado que a aplicação do corretivo em superfície promove alterações apenas nas camadas superficiais do solo (ALLEONI et al., 2005) e em alguns casos nas camadas subsuperfície (OLIVEIRA; PAVAN, 1996; BLUM et al., 2013).

O calcário aplicado em superfície resulta em correção gradual ao longo do perfil do solo, variando de acordo com o tipo do solo (RODRIGHERO et al., 2015), regime hídrico (AMARAL, et al., 2004) presença de resíduos orgânicos (FRANCHINI et., 2001) dose e tempo decorrido da aplicação (BLUM et al., 2013, CAIRES et al., 2015). A fim de complementar o calcário, o gesso agrícola (CaSO4.2H2O) vem sendo utilizado em solos ácidos com o objetivo de melhorar o desenvolvimento do sistema radicular. Este efeito se deve ao fato do gesso agrícola diminuir os efeitos tóxicos do alumínio em subsuperfície pelos processos de adsorção de sulfato e liberação de OH (REEVE; SUMNER, 1972), formação de complexos menos tóxicos (REEVE; SUMNER, 1972), diminuição da saturação de Al3+ pelo incremento de Ca2+ na CTC (PAULETTI et al., 2014) e precipitação de Al na forma de minerais como jurbanita (AlOHSO4.5H2O), alunita [KAl3(OH)6(SO4)2] e basaluminita [Al4(OH)10SO4.5H2O] (SPOSITO, 1989).

As alterações provocadas ao longo do tempo pela aplicação do calcário e gesso agrícola no solo são complexas, levando em consideração fatores intrínsecos de cada tipo de solo e região, sendo a compreensão desta dinâmica importante a fim de definir estratégias de manejo que melhorem a sustentabilidade dos sistemas de produção. O objetivo deste trabalho foi avaliar após 6 e 12 meses as alterações provocadas pela adição de diferentes doses de calcário e gesso agrícola no valor de pH ao longo do perfil do solo em um LATOSSOLO VERMELHO, textura muito argilosa do Norte do Paraná.

Material e Métodos

O experimento foi realizado na Unidade de Difusão de Tecnologias (UDT) da Cooperativa Agroindustrial de Maringá (COCAMAR), localizada na cidade de Floresta- PR 23° 35′ S 52° 04′ W com altitude média de 392 m. O solo da área é um LATOSSOLO VERMELHO distroférrico (SANTOS et al., 2013) textura muito argilosa, e o clima da região classificado segundo Köppen como Cfa.

O delineamento experimental utilizado foi o de blocos ao acaso, em esquema fatorial cruzado 4×4, dispostos em parcelas subdivididas. As parcelas principais correspondem a quatro doses de calcário dolomítico (0, 2,6, 5,4 e 8,1 Mg ha-1) e as subparcelas correspondem a quatro doses de gesso agrícola (0, 4, 8 e 12 Mg ha-1). Tanto o calcário como o gesso agrícola foram aplicados a lanço nasuperfície do solo, tendo a dose corrigida em base seca de acordo com a umidade determinada previamente em laboratório.

O calcário dolomítico utilizado apresentava garantias de 29% de CaO e 19% MgO com PRNT de 80%, e o gesso agrícola 18% de Ca e 15% de S. Os mesmos foram aplicados no dia 06/10/2014, sendo cultivado em seguida soja e milho safrinha. As amostragens de solo foram realizadas após o cultivo da soja (21/03/15) com precipitação acumulada de 1175 mm e após o cultivo do milho safrinha (18/09/15) com precipitação acumulada de 1895 mm. As profundidades amostradas foram 0,00-0,05; 0,05-0,10; 0,10-0,20 utilizando pá de
corte e 0,20-0,30; 0,30-0,40 e 0,40-0,60 m utilizando trado holandês. As amostras de solo foram encaminhadas ao Laboratório de Fertilidade do Solo, do Departamento de Agronomia da Universidade Estadual de Maringá, onde foi determinado o pH em CaCl2 0,01 mol L-1 (relação solo:solução de 1:2,5) conforme EMBRAPA (2009).

Os dados foram estudados, individualmente de acordo com cada ano e cada profundidade sendo primeiramente os dados submetidos aos testes de homogeneidade de variância (Bartlett’) e normalidade dos erros (Kolmogorov-Smirnov) (=0,05), atendendo assim os pressupostos básicos da análise de variância (BANZATTO; KRONKA, 2008). Posteriormente os dados foram submetidos à análise de variância e as doses de calcário e gesso agrícola desdobrados em regressão polinomial, utilizando o software estatístico SAS.

Resultados e Discussão

Após 6 e 12 meses da aplicação superficial das diferentes doses de calcário e de gesso agrícola, não se observou efeito significativo da interação entre os fatores no pH (CaCl2) do solo. Este resultado demonstra que o gesso agrícola na dose de até 12 Mg ha-1 não influencia na solubilidade do calcário e seu efeito sobre o pH do solo, quando ambos são aplicados juntos em superfície. A aplicação de calcário na superfície do solo sem incorporação, proporcionou alterações significativas no pH do solo na camada de 0,00 a 0,05 m de profundidade após 6 meses (Figura 1A) e nas camadas de 0,00 a 0,05 m e 0,05 a 0,10 m de profundidade após 12 meses (Figura 1B).

Figura 1. Valor de pH do solo (CaCl2) após (A) 6 e (B) 12 meses da aplicação superficial de calcário dolomítico nas doses de 0 Mg ha-1 (●), 2,6 Mg ha-1 (○), 5,4 Mg ha-1 (▼) e 8,1 Mg ha-1 (Δ). UEM/Maringá-PR, 2018.

A elevação do pH na camada de 0,00–0,05 m, após 6 e 12 meses da aplicação apresentou comportamento quadrático (Tabela 1) de acordo com o aumento das doses, comportamento este que pode ser explicado pelo alto poder tampão existente na faixa de pH entre 6,0 a 6,5 resultante da matéria orgânica e elevada acidez potencial do solo em estudo (BRADY, 1989).

Tabela 1. Modelos de regressão polinomial ajustadas para pH em CaCl2 em diferentes profundidades de solo após 6 e 12 meses da aplicação superficial de doses de calcário e gesso agrícola. UEM/Maringá-PR, 2018.

A elevação do pH em profundidade ao longo do tempo pode ser devido a diversos fatores, tais como deslocamento físico das partículas finas do corretivo por raízes mortas (OLIVEIRA; PAVAN, 1996), espaços existentes entre os agregados (AMARAL et al., 2004), formação de complexos orgânicos solúveis por meio do manejo de resíduos vegetais (FRANCHINI et., 2001) e de galerias formadas por organismos e/ou microcanais biológicos (RHEINHEIMER et al., 2000). Outro fato que contribuiu para a correção do solo em profundidade com utilização de calcário se deve a migração de Ca(HCO3)2 e Mg(HCO3)2 para as camadas subsuperficiais quando a zona onde ocorre a dissolução do calcário (0,00-0,05 m), atingiu valor de pH (água) superiores a 5,2 e 5,6 conforme também observado por Rheinheimer et al. (2000).

A utilização de gesso agrícola após 6 meses proporcionou aumento linear pH em CaCl2 na camada de 0,30-0,40 m e 0,40-0,60 m (Figura 2A). Este efeito do gesso agrícola se deve a reações de troca de ligantes na superfície dos óxidos de ferro e alumínio, com o SO42- deslocando OH e, assim, promovendo neutralização parcial da acidez do solo (REEVE; SUMNER, 1972). Entretanto, estes efeitos em profundidade não foram observados após 12 meses da aplicação de gesso agrícola. Embora o gesso agrícola se dissocie formando SO42- e Ca2+, e o íon SO42- seja considerado uma base química, com habilidade de gerar OH- sendo quase nula (Kb = 8,3×10-13), o gesso agrícola pode possuir em sua constituição alguns contaminantes ácidos, já que este é obtido durante a fabricação do acido fosfórico podendo acidificar a camada onde este foi aplicado, conforme observado na camada 0,00–0,05 m após 12 meses (Figura 2B).

Figura 2. Valor de pH do solo (CaCl2) após (A) 6 e (B) 12 meses da aplicação superficial de Gesso Agrícola nas doses de 0 Mg ha-1 (●), 4 Mg ha-1 (○), 8 Mg ha-1 (▼) e 12 Mg ha-1 (Δ). UEM/Maringá-PR, 2018.


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Conclusões

Os efeitos da calagem aplicada em superfície sobre o pH do solo (CaCl2) foram pronunciados até a profundidade de 0,05 m após 6 meses com precipitação acumulada de 1175 mm e até a profundidade de 0,10 m após 12 meses e precipitação acumulada de 1895 mm. O gesso agrícola aumentou o pH em subsuperfície após 6 meses e diminuiu o pH da camada superficial (0,00-0,05) após 12 meses da aplicação.

Referências

ALCARDE, J. C. Corretivos de acidez do solo: características e interpretações técnicas. São Paulo: ANDA, 2005. 24 p. (Boletim técnico, 6).

ALLEONI, L. R. F.; CAMBRI, M. A. A.; CAIRES, E. F. Atributos químicos de um Latossolo de cerrado sob plantio direto, de acordo com doses e formas de aplicação de calcário. Revista Brasileira de Ciência do Solo, v. 29, p. 923-934, 2005.

AMARAL, A.S.; ANGHIONI, I.; HINRICHIS, R.; BERTOL, I. Movimentação de partículas de calcário no perfil de um Cambissolo em plantio direto. Revista Brasileira de Ciência do Solo, v. 28, p. 359-367, 2004.

BANZATTO, D.A.; KRONKA, S.N. Experimentação agrícola. 4. ed. Jaboticabal: FUNEP, 2008. 237p.

BLUM, S. C, CAIRES, E.F.; ALLEONI, L.R.F. Lime and phosphogypsum application and sulfate retention in subtropical soils under no-till system. Journal of Soil Science and Plant Nutrition, v.13, p.279-300, 2013.

BRADY, N.C. Natureza e Propriedade dos Solos. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1989. 554p.
CAIRES, E. F.; HALISKI, A.; BINI, A. R.; SCHARR, D. A. Surface liming and nitrogen fertilization for crop grain production under no-till management in Brazil. European Journal of Agronomy, v. 66, p. 41–53, 2015.

CAIRES, E.F.; BANZATTO, D.A.; FONSECA, A.F. Calagem na superfície em sistema plantio direto. Revista Brasileira de Ciência do Solo, v.24, n.1, p.161169, 2000.

EMBRAPA – Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária. Manual de Análises Químicas de Solos, Plantas e Fertilizantes. / editor técnico, Fábio Cesar da Silva. – 2a. Ed. Rev. Ampl. – Brasilia DF: Embrapa Informação Tecnológica, 2009. 627p

FRANCHINI, J.C.; MEDA, A.R.; CASSIOLATO, M.E.; MIYAZAWA, M.; PAVAN, M.A. Potencial de extratos de resíduos vegetais na mobilização do calcário no solo por métodos biológicos. Scientia Agricola, v.58, p.357-360, 2001.

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PAULETTI, V.; PIERRI, L. de; RANZAN, T.; BARTH, G.; MOTTA, A. C. V. Efeitos em longo prazo da aplicação de gesso e calcário no sistema de plantio direto. Revista Brasileira de Ciência do Solo, v. 38, p. 495-505, 2014.

REEVE, N. G.; SUMNER, M. E. Amelioration of subsoil acidity in Natal Oxisols by leaching of surface applied amendments. Agrochemophysica, v.4, p.1-6, 1972.

RHEINHEIMER, D.S.; SANTOS, E.J.S.; KAMINSKI, J.; GATIBONI, L.C.; BORTOLUZZI, E.C. Alterações de atributos do solo pela calagem superficial e incorporada a partir de pastagem natural. Revista Brasileira de Ciência do Solo, v. 24, p. 797-805, 2000.

RODRIGHERO, M. B.; BARTH, G.; CAIRES, E. F. Aplicação superficial de calcário com diferentes teores de magnésio e granulometrias em sistema plantio direto. Revista Brasileira de Ciência do Solo, v. 39, p. 17231736, 2015.

SANTOS, H.G.; ALMEIDA, J.A.; OLIVEIRA, J.B.; LUMBRERAS, J.F.; ANJOS, L.H.C.; COELHO, M.R.; JACOMINE, P.K.T.; CUNHA, T.J.F.; OLIVEIRA, V.A. Sistema brasileiro de classificação de solos. 3. ed. Brasília-DF: EMBRAPA, 2013. 353p.

SPOSITO, G. The chemistry of soils. 1.ed. Oxford: Oxford University Press, 1989, 277p.

Informações dos autores

¹Aluno do Programa de Pós-Graduação em Agronomia, da Universidade Estadual de Maringá-UEM, Av. Colombo, N° 5790, CEP 87020-900, Maringá-PR;

²Engenheiro Agrônomo Doutor da Cooperativa Agroindustrial de MaringáCOCAMAR, Floresta-PR;

³Professor adjunto do curso em agronomia, da Universidade Estadual de Maringá-UEM.

Disponível em: Anais da XII Reunião Sul-Brasileira de Ciência do Solo. Xanxerê – SC, Brasil.

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