A lagarta Helicoverpa armigera foi considerada uma praga quarentenária no Brasil até o ano de 2013, quando foram identificados ataques expressivos em soja e algodão no Cerrado brasileiro. No entanto, de acordo com Sosa-Gómez et al. (2016) a introdução de H. armigera no Brasil provavelmente ocorreu antes de outubro de 2008, e por volta de agosto de 2012 a espécie já estava presente desde o extremo sul até o extremo norte do país.

Atualmente, esse lepidóptero é considerado a praga invasiva mais importante do mundo, apresentando alto potencial de dano em diversas culturas agrícolas.  Possui ampla distribuição mundial com ocorrência em 143 países (Figura 1), além de resistência confirmada para 49 inseticidas diferentes (Willis, 2017).

Figura 1. Distribuição geográfica de H. armigera, atualizado em 17/09/2020 pela Organização Europeia de Proteção às Plantas (EPPO).

Fonte: EPPO. Confira a imagem original clicando aqui.

 Esse inseto-praga está distribuído na Ásia, África, América do Sul, Europa e Oceania e, como é uma espécie polífaga, causa danos em diferentes culturas de importância econômica. Conforme Willis (2017), o número de gêneros hospedeiros chega a 50. No Brasil, já foram constatadas ocorrência em várias culturas, tais como algodão, soja, milho, tomate, feijão, sorgo, milheto, guandu, trigo e crotalária, além de algumas espécies de plantas daninhas. A capacidade de dispersão de H. armigera é grande, visto que sob condições de campo os adultos apresentam capacidade de se alastrar por 10 km, podendo migrar a uma distância de até 1.000 km (Figura 2).

Figura 2. Bioecologia de Helicoverpa armigera.

Fonte: Embrapa. Confira a imagem original clicando aqui.

Além disso, a espécie H. armigera é um inseto holometábolo, ou seja, apresenta metamorfose completa durante o seu desenvolvimento. O ciclo de vida dura em média 30 a 45 dias (Figura 3), sendo o seu desenvolvimento influenciado pela qualidade nutricional do alimento e por fatores ambientais, como temperatura e umidade (Guedes et al. 2018).

Figura 3. Ciclo médio de vida da Helicoverpa armigera.

Fonte: Embrapa. Confira a imagem original clicando aqui.



No contexto do manejo integrado de pragas, o controle de H. armigera baseia-se em utilizar cultivares geneticamente modificadas expressando a toxina Bacillus thuringiensis (Bt), manejo biológico e inseticidas químicos que, de preferência, sejam seletivos aos inimigos naturais. Dentre os métodos de controle disponíveis, recomenda-se principalmente o cultivo de variedades Bt como alternativa aos inseticidas químicos. No entanto, estudos têm demonstrado que a eficiência de controle com a tecnologia Bt pode ser afetada ao longo dos estádios de desenvolvimento larval de H. argmigera. De acordo com González-Cabrera et al. (2011), insetos em ínstares avançados comumente são mais tolerantes às toxinas Bt, sendo essas mais eficientes sobre lagartas pequenas (Sanahuja et al. 2011).

Ainda, o Instituto Mato-grossense do Algodão (IMAmt) dilvulgou uma Circular Técnica, em parceria com outras instituições, apresentando resultados que alertam para a crescente resistência da lagarta H. armigera às plantas com a tecnologia Bt. Segundo a Circular, o controle por meio do uso de plantas Bt foi eficiente até a safra 2015/16, porém já na safra seguinte foi constatada uma população de indivíduos na região de Primavera do Leste com sobrevivência de 40% de lagartas. Na safra 2017/18, lagartas semelhantes foram encontradas na região de Campo Verde, confirmando o crescimento de dispersão de indivíduos resistentes.

Assim, torna-se essencial o conhecimento da suscetibilidade da espécie às toxinas Bt para formulação de estratégias de manejo, e evitar a perda desta tecnologia pela ocorrência de insetos resistentes. Ainda, recomenda-se fortemente a utilização de áreas de refúgio, com semeadura de cultivares não-Bt.

Em relação aos inseticidas químicos, estudos do Laboratório de Resistência de Artrópodes da ESALQ/USP que monitoram a resistência dessa praga desde 2013 constataram um aumento significativo na sobrevivência das populações aos inseticidas carbamatos, com variações de 10% (safra 2013/2014) a mais de 50% (safra 2019/2020). Além disso, a frequência de resistência das populações a inseticidas piretroides tem sido elevada (> 50%) desde a safra 2013/2014, bem como para inseticidas oxadiazinas e diamidas, com índices de sobrevivência passando de 0% na safra 2013/2014 a mais de 20% na safra 2019/2020. No entanto,​ inseticidas dos grupos das espinosinas, avermectinas e diacilhidrazinas tem demonstrado índices de sobrevivência da praga menores que 10% nas concentrações diagnósticas testadas, mostrando-se eficientes no controle.

Portanto, além da ampla distribuição mundial, a resistência a inseticidas e o número de culturas atacadas estão entre os fatores que elevam H. armigera a um patamar preocupante. Logo, é imprescindível que se faça um monitoramento constante aliado ao Manejo Integrado de Pragas, a fim de minimizar os potenciais prejuízos que essa praga pode ocasionar na soja e em outras culturas agrícolas.

 

Revisão: Henrique Pozebon, Mestrando PPGAgro  e Prof. Jonas Arnemann, PhD. e Coordenador do Grupo de Manejo e Genética de Pragas – UFSM

REFERÊNCIAS:

Comitê de Ação à Resistência a inseticidas (IRAC). Projetos: Helicoverpa, Helicoverpa armigera. IRAC – Brasil. Disponível em: https://www.irac-br.org/helicoverpa-armigera#:~:text=A%20frequ%C3%AAncia%20de%20resist%C3%AAncia%20das,a%20piretroides%20foi%20%3E%2095%25

EPPO. 2018. Heliar/Distribuição. EPPO GLOBAL DATABASE. [Online]. 17 de setembro de 2020. Acesso: 14 de fevereiro de 2021. Disponível em: https://gd.eppo.int/taxon/HELIAR/distribution.

González-Cabrera J, Mollá O, Montón H, Urbaneja A. Efficacy of Bacillus thuringiensis (Berliner) in controlling the tomato borer, Tuta absoluta (Meyrick) (Lepidoptera: Gelechiidae). BioControl. Pag: 71-80. Janeiro de 2011. Disponível em: https://www.researchgate.net/publication/225082811_Efficacy_of_Bacillus_thuringiensis_Berliner_in_controlling_the_tomato_borer_Tuta_absoluta_Meyrick_Lepidoptera_Gelechiidae

Guedes, J. V. C., Arnemann J. A., Perini C. R., Arruê A., Rohrig A. Helicoverpa armigera: manejar ou perder. Revista Cultivar. Disponível em: https://www.grupocultivar.com.br/artigos/helicoverpa-armigera-manejar-ou-perder

Netto J.C., Rolim G.G., Scoz L., Martins E.S., Pitta R.M., Viana D.L. Helicoverpa armigera: ameaça a lavouras Bt de algodoeiro. Circular Técnica IMAmt. Nº35 / 2018. Disponível em: https://www.infoteca.cnptia.embrapa.br/infoteca/bitstream/doc/1098825/1/2018cpamtrafaelpittahelicoverpaarmigeraameacaalgodoeiro.pdf

Sanahuja G, Banakar R, Twyman RM, Capell T, Christou P. Bacillus thuringiensis: a century of research, development and commercial applications. Plant Biotechnology Journal. Pag: 283–300. 2011 Fev 25. Disponível em: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/21375687/

Sosa-Gomez DR, Specht A, Paula-Moraes SV, Lopes-Lima A, Yano SAC, Micheli A, EGF Morais EGF, Gallo P, Pereira PRVS, Salvadori JR, Botton M, Zenker MM e Azevedo-Filho WS. Timeline and geographical distribution of Helicoverpa armigera (Hübner) (Lepidoptera, Noctuidae: Heliothinae) in Brazil. Revista Brasileira de Entomologia. Volume 60, Issue 1, January–March 2016, Pages 101-104. Disponível em: https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0085562615001399?via%3Dihub

Willis KJ. Estado das plantas do mundo. Royal Botanic Gardens, Kew (2017). Disponível em: https://issuu.com/fernandoruz/docs/sotwp_2017

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