Reflexões sobre o ICA 2025
Após alguns dias intensos em Dubai, participando do evento anual da ICA (International Cotton Association) e de várias reuniões paralelas com empresas e entidades do setor, fica claro que o setor está entrando em um momento de virada decisiva.
O clima geral foi de cautela diante do cenário de preços e da imprevisibilidade geopolítica, mas também de mobilização, senso de urgência e alinhamento entre os grandes países exportadores.
Pela primeira vez, observou-se uma convergência real de discurso e propósito entre Brasil, EUA e Austrália, abrindo espaço para uma nova fase de cooperação global.
O grande tema: recuperar espaço entre as fibras têxteis
O principal foco das discussões foi a necessidade de o algodão reconquistar participação no mercado global de fibras, hoje amplamente dominado pelas sintéticas derivadas do petróleo.
O consenso é de que, após anos de retração, o setor precisa agir de forma coordenada, estratégica e assertiva.
Para cada ponto percentual de participação de mercado que o algodão recupera, isso representa aproximadamente 1,2 milhão de toneladas adicionais de consumo.
Além do impacto econômico, essa expansão significaria geração de renda no campo, mais empregos e menor emissão de microplásticos no planeta — um incentivo concreto para ação imediata.
Colaboração inédita entre Brasil, EUA e Austrália
Um dos pontos altos da ICA foi a reunião trilateral entre Brasil, Estados Unidos e Austrália, com participação ativa de Abrapa e Anea, representando o Brasil, e apoio institucional da ApexBrasil.
O encontro teve um tom extremamente colaborativo, com os países discutindo estratégias conjuntas de promoção, comunicação e defesa institucional do algodão. Também foram abordadas iniciativas legislativas em curso, como o projeto americano BACA (Buy American Cotton Act), que prevê créditos tributários (tax credits) para marcas e varejistas que utilizarem algodão americano, além de propostas de regulação internacional para reduzir a poluição por microplásticos.
A disposição dos países em trabalhar lado a lado — inclusive em temas de defesa legislativa e políticas públicas — marcou um novo capítulo nas relações entre os grandes exportadores.
Um novo encontro foi agendado para dentro de um mês, reforçando o senso de urgência e o comprometimento real com a coordenação global.
O Brasil em destaque – Cotton Brazil Luncheon
Durante o evento, Abrapa e Anea, com o apoio da ApexBrasil, promoveram o Cotton Brazil Luncheon, que reuniu mais de 150 representantes da indústria global — entre fiações, tradings, associações e agentes de origem e destino.
O almoço foi considerado um grande sucesso, fortalecendo a imagem e a credibilidade do Brasil na comunidade do ICA.
A delegação brasileira transmitiu uma mensagem clara e positiva:
•o algodão brasileiro vem registrando avanços consistentes em qualidade;
•o sistema de classificação e rastreabilidade está entre os mais confiáveis do mundo;
•e os produtores demonstram forte compromisso com sustentabilidade, eficiência e inovação.
Também foi destacada a preocupação dos produtores com o cenário de preços, e o fato de que muitos estão avaliando migrar parte da área para o milho na próxima safra, o que poderá reduzir a oferta de algodão em 2025/26.
Microplásticos – o tema central da sustentabilidade
Um dos temas mais debatidos no ICA 2025 foi o impacto dos microplásticos provenientes das fibras sintéticas.
Pesquisas apresentadas mostraram que entre 30% e 35% dos microplásticos encontrados nos oceanos têm origem em tecidos sintéticos como poliéster, nylon e acrílico, que liberam partículas microscópicas a cada lavagem.
Essas partículas não se degradam, são ingeridas por peixes e outros organismos marinhos e já foram detectadas em amostras de sangue, pulmões, cérebro e outras partes do corpo humano. O problema, antes visto apenas sob a ótica ambiental, hoje é reconhecido como questão de saúde pública global.
Para mais informações: https://scan.page/p/OnbC2j
O debate também enfatizou a necessidade de regulação internacional, com propostas para restringir a poluição por microplásticos.
Nesse contexto, o algodão se destaca como solução natural e imediata — biodegradável, renovável e livre de microplásticos — oferecendo à indústria têxtil uma alternativa concreta e positiva diante das novas exigências regulatórias e sociais.
Perspectivas de mercado
Apesar do clima de cooperação e das mensagens positivas vindas da ICA, o mercado físico e futuro segue pressionado.
•O excesso de oferta global, o consumo moderado e as compras lentas continuam pesando sobre os preços.
•Fiações e varejistas mantêm políticas de compra “just in time”, evitando estoques.
•O volume de fixações pendentes e de vendas de produtores ainda limita movimentos de alta mais consistentes.
Mesmo assim, há fatores de suporte: a necessidade das fiações em manter o abastecimento impede uma queda mais acentuada.
Além disso, preços mínimos e ajuda governamental nos EUA diminuem a pressão de venda.
Conclusão
A ICA Dubai 2025 deixou evidente que o algodão está diante de uma oportunidade histórica de reposicionamento.
O setor mostrou-se mais unido, estratégico e consciente de seu papel global, e o Brasil foi um dos protagonistas dessa nova fase, levando uma mensagem de qualidade, sustentabilidade e compromisso com o futuro.
O desafio agora é converter essa convergência institucional em resultados tangíveis — campanhas conjuntas, medidas normativas/legislativas e ações coordenadas de promoção e comunicação — que reaproximem o algodão do consumidor final e consolidem a fibra natural como a escolha inteligente, moderna e responsável para nosso futuro.
Canal do Cotton Brazil – Quer se manter atualizado sobre o mercado de algodão no mundo? Participe: https://bit.ly/Canal-CottonBrazil.
Agenda – Os próximos eventos são a Textile Exchange em Lisboa (13-17/out), o evento anual da ITMF e IAF na Indonésia (24-25/out) e a estreia brasileira no ITMA Asia + CITME (28-31/out).
Preços – Consulte tabela abaixo
Este boletim é produzido pelo Cotton Brazil – cottonbrazil@cottonbrazil.com
Fonte: Abrapa