O arroz (Oryza sativa) é uma gramínea pertencente à família Poaceae, seu plantio pode ser realizado de várias formas, cada uma exigindo um nível tecnológico específico, o qual, por sua vez, tem impacto direto na determinação da produtividade das lavouras. A estimativa para a safra 2023/24, de acordo com a CONAB (2023), é que o Brasil tenha um aumento de 5,1% na área cultivada com a cultura do arroz, atingindo 1.555,1 milhões de hectares, com uma produtividade média de 6.949 Kg ha-1. Um aspecto importante sobre a redução da área destinada ao cultivo do arroz, quando comparado aos aumentos na produtividade, está relacionado aos incrementos crescentes do potencial produtivo das lavouras (CONAB, 2023).
Figura 1. Evolução da série histórica do cultivo de arroz total.

A brusone é considerada a doença mais importante que incide sobre a cultura do arroz, causada pelo fungo Pyricularia oryzae. Em casos severos e na ausência de um manejo adequado, as perdas de produtividade podem atingir 100%. Sob condições ambientais favoráveis, essa doença pode ocorrer em altos índices de severidade e se disseminar de forma muito rápida na lavoura, representando um desafio aos produtores de arroz (Ferrari, 2020).
O fungo Pyricularia oryzae é capaz de se desenvolver em diversas condições, no entanto, as condições mais favoráveis para seu crescimento incluem dias nublados, com umidade relativa do ar superior a 93%, temperaturas que variam de 15ºC a 35 ºC, com temperaturas ótimas entre 25ºC e 28 ºC e, sobretudo, o molhamento foliar que é necessário para que ocorra a germinação dos esporos. Além disso, o patógeno pode sobreviver em restos de cultura, sementes, plantas hospedeiras e plantas de arroz que permanecem no campo, sua disseminação ocorre principalmente através do vento, contribuindo para a propagação da doença (Bedendo, 1997).
De acordo com Nunes et al. (2023), as perdas anuais causadas pela brusone são superiores a 30% em termos de produtividade. As cultivares de arroz resistentes à brusone tendem a apresentam uma vida curta, em torno de 4 a 5 anos de cultivo nas lavouras do Rio Grande do Sul. Portanto, para contribuir coma redução da disseminação da brusone, uma das estratégias de controle importante envolve o manejo das práticas culturais, com intuito de promover condições menos favoráveis para o patógeno no campo.
Os autores destacam que determinadas condições de manejo da irrigação por inundação, particularmente quando realizadas tardiamente em cultivares suscetíveis (cerca de 30 dias após a emergência) e a ocorrência de déficit hídrico em determinadas áreas de cultivo podem contribuir para o surgimento dos primeiros focos da brusone na maioria das lavouras. Além disso, fatores como a adubação nitrogenada em excesso, situações de estresse hídrico, a presença de resíduos culturais de plantas infectadas ou cultivo de soca, bem como a utilização de sementes contaminadas com patógenos, também contribuem para a ocorrência e disseminação da doença.
No Rio Grande do Sul, a tradicional combinação de arroz irrigado e pecuária extensiva de corte está passando por mudanças devido à introdução da cultura da soja no sistema, devido a seus benefícios agronômicos, econômicos e ambientais. Para otimizar o uso da água, reduzir operações de preparo do solo e economizar tempo e mão de obra, vem sendo avaliado um novo sistema de produção, onde o arroz é semeado diretamente nos camalhões criados para a soja na safra anterior, os quais são utilizados para realizar a irrigação por sulco. Nesse sentido a Embrapa desenvolveu um estudo com o objetivo avaliar a severidade da brusone neste sistema de irrigação por sulco durante a safra 2021/2022.
O estudo foi conduzido na Estação Experimental Terras Baixas, localizada no município de Capão do Leão no Rio Grande do Sul, com duas cultivares de arroz a BRS Querência e a Guri INTA CL. A irrigação por sulco foi aplicada no estádio V3/V4 das plantas, ao longo das faixas, resultando em diferentes níveis de água, sendo nas porções superior (drenada), intermediária (saturada) e inferior (inundada). Conforme o esperado, a infecção por brusone ocorreu naturalmente na área experimental.
Os resultados obtidos, demonstraram baixo índice de severidade da brusone nas folhas em ambas as cultivares, os pesquisadores destacam que provavelmente isso se deve à ocorrência de condições de seca no mês de fevereiro e vários dias com umidade relativa do ar superior a 90% no início de março. A doença começou a surgir com uma incidência maior de lesões nas folhas da cultivar Guri INTA CL no estádio R4, quando as plantas estavam com 10% de emissão de panículas. Essa ocorrência foi notada principalmente na porção drenada (parte superior) e no camalhão. Devido ao baixo índice de severidade da brusone, não foi possível estabelecer diferenças significativas entre os níveis de irrigação (drenado, saturado e inundado) nem entre as médias das duas cultivares nos três sistemas de irrigação por sulco.
No entanto, foram observadas diferenças significativas de severidade da doença entre as duas cultivares no camalhão, onde a cultivar Guri INTA CL apresentou maior severidade em comparação ao sulco. Os pesquisadores sugerem que o camalhão é mais propenso à ocorrência e desenvolvimento da brusone nas folhas, dentro do sistema de irrigação. No entanto, a severidade média da doença permaneceu baixa, devido à baixa incidência e à ausência de brusone nas folhas nas cultivares Guri INTA CL e BRS Querência, respectivamente.
Figura 2. Severidade da infecção de brusone da folha na primeira avaliação das cultivares de arroz BRS Querência e Guri INTA CL nos três níveis de irrigação (drenado, saturado e inundado) e em dois locais de irrigação (camalhão e no sulco) em experimento realizado no município de Capão do Leão, na safra 2021/2022. Embrapa Clima Temperado, Pelotas, RS, 2023.

Com relação a brusone-de-pescoço, a severidade foi favorecida pela esporulação das lesões nas folhas, que serviram como fonte de inóculo. Essa severidade foi mais evidente no camalhão, onde as condições eram mais favoráveis, resultando em maior intensidade da doença em comparação com a brusone nas folhas. Isso levou a diferenças significativas na severidade da brusone-de-pescoço entre as duas cultivares, observadas apenas no camalhão, enquanto no sulco essa diferença não foi evidente. Portanto, devido à maior severidade da brusone-de-pescoço no camalhão, as médias variaram nos dois locais de irrigação, camalhão e sulco. Também foi observado que dentro de cada nível de irrigação, houve diferenças significativas de suscetibilidade entre o camalhão e sulco nos três níveis de irrigação.
Figura 3. Severidade de brusone de pescoço (%) na primeira avaliação das cultivares de arroz BRS Querência e Guri INTA CL nos três níveis de irrigação (drenado, saturado e inundado) e em dois locais da irrigação (camalhão e sulco), em experimento realizado no município de Capão do Leão, RS, na safra 2021/2022. Embrapa Clima Temperado, Pelotas, RS, 2023.

Ocorreu o apodrecimento dos nós dos colmos dos perfilhos na fase de maturação, com isso, não foi possível diferenciar entre os níveis de cultivares, irrigação e local na avaliação de severidade da brusone de nó.
Figura 4. Severidade da brusone de nó na fase de maturação dos grãos das cultivares de arroz, BRS Querência e Guri INTA CL, nos três níveis de irrigação (drenado, saturado e inundado) e em dois locais (camalhão e sulco), em experimento realizado no município de Capão do Leão, RS, na safra 2021/2022. Embrapa Clima Temperado, Pelotas, RS, 2023.

Na avaliação do sistema de irrigação, a qual foi realizada com base no Índice de Severidade da Brusone nas Panículas (ISBP) na fase de pré-colheita, foram identificadas diferenças significativas entre as duas cultivares nos níveis de irrigação drenado e inundado. No entanto, não foi possível diferençar a severidade da brusone ao longo da faixa irrigada por sulco-camalhão, entre as condições de drenado, saturado e inundado, as médias observadas foram de 0,23%, 0,09% e 0,19%, respectivamente, para ambas as cultivares, em relação à condição de irrigação, nessa avaliação a cultivar Guri INTA CL apresentou maior suscetibilidade.
Figura 5. Índice de severidade da brusone nas panículas (ISBP) obtidas das cultivares de arroz BRS Querência e Guri INTA CL nos três níveis de irrigação (drenado, saturado e inundado) e em dois locais (camalhão e sulco) em experimento realizado no município de Capão do Leão, RS, na safra 2021/2022. Embrapa Clima Temperado, Pelotas, RS, 2023.

A incidência de brusone afetou negativamente a produtividade das cultivares de arroz no sistema de irrigação por sulco. Observou-se que o nível drenado foi o mais impactado, registrando uma produtividade de 5.863 Kg ha-1, com diferenças significativas em comparação com os outros dois níveis, inundado e saturado, que apresentaram produtividades de 8.029 Kg ha-1 e 7.422 Kg ha-1 respectivamente.
A severidade da brusone, tanto na região do pescoço quanto na panícula, reduziu a produtividade da cultivar BRS Querência, especialmente no nível drenado, onde atingiu 4.730 Kg ha-1. Esse valor foi significativamente inferior aos níveis saturado e inundado, que alcançaram produtividades de 6.967 Kg ha-1 e 7.443 Kg ha-1, respectivamente. No entanto, a cultivar Guri INTA CL mostrou ser mais suscetível à brusone em comparação com a BRS Querência, mas não foram observadas diferenças significativas na redução de produtividade entre os níveis de irrigação.
Figura 6. Produtividade das cultivares de arroz, BRS Querência e Guri INTA CL, em três níveis de irrigação (drenado, saturado e inundado) e em dois locais (camalhão e sulco) em experimento realizado no Capão do Leão, RS, na safra 2021/2022. Embrapa Clima Temperado, Pelotas, RS, 2023.

As conclusões obtidas com o estudo indicam que a probabilidade de ocorrência de brusone em cultivar mais suscetível aumenta quando se utiliza o sistema de irrigação por sulco. Além disso, condições de estresse hídrico, como a seca, aumentam a chance de ocorrência da brusone devido à maior predisposição de suscetibilidade, principalmente nas áreas de camalhão e no nível drenado do sistema de irrigação por sulco.
Observou-se que o foco de infecção da brusone nas folhas, que é responsável pela produção de inóculo, ocorreu no camalhão no nível drenado do sistema de irrigação por sulco. Além disso, a brusone de pescoço demonstrou maior severidade no camalhão, afetando todos os três níveis de irrigação por sulco. A brusone também afetou a produtividade das cultivares, principalmente no nível drenado do sistema de irrigação por sulco.
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Referências:
BEDENDO, S. P. DOENÇAS DO ARROZ. Manual de Fitopatologia: Doenças das Plantas Cultivadas, v. 2, ed. 3. Editora Ceres, São Paulo – SP, 1997. Disponível em: < https://ppgfito.ufersa.edu.br/wp-content/uploads/sites/45/2015/02/Livro-Manual-de-Fitopatologia-vol.2.pdf >, acesso em: 20/10/2023.
CONAB. ACOMPANHAMENTO DA SAFRA BRASILEIRA DE GRÃOS: SAFRA 2023/24. Companhia Nacional de Abastecimento, 1° levantamento, v. 11, n. 1, 2023. Disponível em: < https://www.conab.gov.br/component/k2/item/download/49593_596c818070b5dc225a4d1750a9747c79 >, acesso em: 20/10/2023.
FERRARI, L. E. et al. MANEJO INTEGRADO CONTRA BRUSONE EM ARROZ. Revista Cultivar, ed. 214, 2020. Disponível em: < https://revistacultivar.com.br/artigos/manejo-integrado-contra-brusone-em-arroz >, acesso em: 20/10/2023.
NUNES, C. D. M. et al. COMPORTAMENTO DA BRUSONE NO SISTEMA DE IRRIGAÇÃO DE ARROZ POR SULCO, SAFRA 2021/2022. Embrapa, circular técnica 239. Pelotas -RS, 2023. Disponível em: < https://ainfo.cnptia.embrapa.br/digital/bitstream/doc/1156884/1/Cpact-Circular-239v2.pdf >, acesso em: 20/10/2023.