Embora existam diferentes tipos de sistemas de produção agrícola, todos enfrentam um problema em comum: o ataque de pragas, doenças e plantas daninhas. Portanto, medidas de controle fitossanitário são necessárias em qualquer sistema de produção. O controle de pragas pode ser feito de forma cultural, química ou biológica.
Os métodos culturais baseiam-se no conhecimento das características ecológicas e biológicas das pragas, utilizando medidas como a rotação de culturas, preparo do solo, destruição de restos culturais, poda e planto direto. Já o controle biológico inclui o uso de organismos vivos (como insetos predadores, parasitoides, bactérias ou vírus) para reduzir a população de uma espécie-praga a patamares abaixo do seu nível de dano econômico. Por fim, o controle químico envolve o uso de substâncias inseticidas sintéticas ou não-sintéticas.
Independentemente do método escolhido, o controle de pragas preserva o potencial produtivo das plantas, que traduz-se em retorno financeiro para o agricultor e oferta abundante de alimento para os consumidores. Tanto o modelo convencional de produção de alimentos quanto a produção orgânica precisam necessariamente utilizar um ou mais desses métodos de controle de pragas, em maior ou menor grau.
O sistema convencional de produção preconiza o uso racional de defensivos agrícolas, dando preferência, sempre que possível, aos métodos de controle biológico e cultural. Além disso, é indicado o momento correto para aplicação de defensivos, de acordo com o nível de dano econômico das pragas. Quando outras ferramentas do Manejo Integrado de Pragas (MIP) mostram-se insuficientes para controlar a infestação da praga, o uso de defensivos agrícolas sintéticos deve ser realizado para preservar a cultura agrícola e sua produtividade.
Já no sistema orgânico, o controle de pragas e doenças é realizado com a aplicação de produtos químicos não-sintéticos, como inseticidas com função de repelência ou atração, e fungicidas à base de sulfato de alumínio e enxofre. Um exemplo comum é a calda bordalesa, uma mistura de sulfato de cobre e hidróxido de cálcio utilizada há séculos como fungicida. Ou seja, a produção orgânica também emprega defensivos agrícolas; o que muda é a natureza química desses produtos, que não pode ser sintética. Em 2016, a agricultura orgânica já era praticada em 22,5 % dos municípios brasileiros.
Figura 1. Unidades de produção orgânica no Brasil.
Fonte: MAPA, 2016. Disponível clicando aqui
Devemos ter em mente que qualquer produto utilizado na proteção de cultivos agrícolas, seja no sistema orgânico ou convencional, pode deixar resíduos inadequados caso não sejam seguidas as recomendações técnicas de dosagem e as boas práticas de aplicação. Vale aqui a famosa máxima de Paracelso (1538): “a diferença entre o remédio e o veneno é a dose”. Ou seja, o risco associado a um produto químico depende não apenas da sua toxicidade intrínseca, mas também do grau de exposição. Desse modo, o que mais impacta na produção de um alimento saudável são as boas práticas adotadas pelo agricultor, independentemente de ser uma produção orgânica, convencional, hidropônica, agroflorestal, etc.
Quando as boas práticas não são cumpridas, coloca-se em risco tanto a vida do trabalhador do campo quanto do consumidor final. Um exemplo famoso de manejo
inadequado no cultivo orgânico foi o surto de infecção por E. coli na América do Norte e Europa, em 2011, quando mais de 3.000 pessoas foram contaminadas e 39 morreram após consumirem brotos de feijão orgânico contaminados pela bactéria.
Mas afinal, diferentes sistemas de produção podem produzir alimentos mais ou menos nutritivos?
Em 2015, o periódico científico The American Journal of Clinical Nutriton (Universidade de Oxford) publicou um estudo que buscava avaliar se havia uma qualidade nutricional superior nos alimentos orgânicos em relação aos alimentos produzidos no sistema convencional. Intitulado Nutritonal quality of organic foods: a systematc review, o estudo analisou dados científicos publicados nos últimos 50 anos, e concluiu que alimentos orgânicos e convencionais não apresentam diferenças significativas em termos de nutrição, nas treze categorias de nutrientes analisadas. Portanto, o consumo desses nutrientes, nos níveis encontrados nos alimentos orgânicos, não fornece benefícios adicionais à saúde em relação aos convencionais.
Um estudo semelhante, realizado no Brasil em 2016 pelo Instituto de Tecnologia de Alimentos (Ital), também comparou propriedades nutricionais e sensoriais de alimentos provenientes de diferentes sistemas de produção, chegando à mesma conclusão que o estudo de Oxford. O estudo do Ital concluiu que as diferenças encontradas entre os alimentos não devem ser atribuídas aos sistemas de produção, mas sim aos seguintes fatores:
- Genética, com uso de diferentes variedades de uma mesma cultura. Na maioria dos estudos, este é o principal fator de variação.
- Solo, com grande variação de nutrientes nos diferentes locais de cultivo.
- Diferentes formas de adubação, tanto no sistema orgânico
quanto no convencional. - Clima e estação do ano em que o estudo foi realizado.
- Posição na planta, como frutos localizados na parte superior e, consequentemente, mais expostos à luz.
- Cultivos localizados em áreas experimentais e não em ambientes agrícolas.
- Tempo transcorrido após a colheita.
- Tipo de transporte e armazenamento.
Portanto, não é possível afirmar cientificamente que a produção orgânica aumenta o valor nutricional dos alimentos ou os torna mais saborosos e atrativos, nem que seu consumo causa algum benefício adicional à saúde em comparação aos alimentos convencionais. A agricultura sustentável deve ser uma preocupação em todos os modelos de produção agrícola. Somado a isso, a noção comum de que somente a agricultura orgânica preocupa-se com o meio ambiente não corresponde à realidade: basta lembrar que nos últimos 35 anos, a produção de grãos no Brasil aumentou 198 %, enquanto a área cultivada cresceu apenas 28 %.
Esse texto foi produzido com base em um informe técnico do Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para Defesa Vegetal (Sindiveg), a principal entidade representativa do setor de defensivos agrícolas no Brasil há mais de 75 anos. O material completo encontra-se disponível clicando aqui.
Revisão: Prof. Jonas Arnemann, PhD. e coordenador do Grupo de Manejo e Genética de Pragas – UFSM
REFERÊNCIAS:
Nutritional quality of organic foods: a systematic review. Disponível em: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/19640946/
Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para Defesa Vegetal (SINDIVEG).
2018. O que você precisa saber sobre defensivos agrícolas. Disponível em: https://sindiveg.org.br/wp-content/uploads/2020/08/SINDIVEG_Paper_REV_FINAL_2020_bxresolucao.pdf