EL NIÑO OSCILAÇÃO SUL: O QUE É E COMO NOS AFETA?

O início da safra agrícola 2023/24 contará com a atuação de um fenômeno climático de grande importância mundial, a fase quente do El Niño Oscilação Sul (ENOS).

O ENOS é um fenômeno climático natural de grande importância, caracterizado pela interação entre a atmosfera e o oceano no Pacífico Equatorial. Esse fenômeno possui duas fases distintas: o El Niño (fase quente), associada ao aquecimento anormal das águas do Oceano Pacífico, e a La Niña (fase fria), vinculada ao resfriamento dessas águas. Ambas as fases têm o potencial de influenciar significativamente os padrões climáticos ao redor do mundo, incluindo o Brasil.

Depois de quase três anos sob as condições de La Niña, que perduraram até março deste ano, o panorama climático mudou drasticamente. As águas do Pacífico Equatorial aqueceram rapidamente nos meses subsequentes e, em junho, entramos oficialmente na fase quente do fenômeno climático, o El Niño. Desde então, a intensidade tem variado de fraca a moderada, com anomalias da temperatura da superfície do mar (TSM), oscilando entre 0,9 °C e 1,3 °C até agosto. Contudo, em setembro, a intensidade do El Niño mudou para a categoria de forte, com anomalias de TSM superiores a 1,5 °C (Gráfico 1).

Na figura abaixo é mostrada a anomalia de TSM entre os dias 3 e 30 de setembro de 2023. Na parte Central do Pacífico Equatorial, houve predomínio de anomalias de até 2 °C, ultrapassando 3 °C na costa oeste da América do Sul, indicando a persistência de aquecimento das águas na região. Além disso, em grande parte dos demais oceanos, as anomalias de TSM também foram positivas, o que favoreceu o aumento das temperaturas nos dois hemisférios.

No Brasil, os impactos do ENOS são distintos em diferentes regiões, dada a extensão territorial e a diversidade climática do país. Esses impactos podem ser ainda mais ou menos intensificados de acordo com os sistemas meteorológicos locais ou de outros padrões de teleconexão atuantes, sendo mais significantes durante os meses de primavera e verão do Hemisfério Sul. De maneira geral, o El Niño contribui para uma atmosfera mais aquecida, o que serve como combustível para chuvas de verão em forma de pancadas.

Além disso, a Região Sul pode enfrentar chuvas acima da média, resultando em enchentes e deslizamentos de terra, enquanto as Regiões Norte e Nordeste passam por secas severas e aumento dos focos de incêndio (Figura 2). Nas Regiões Centro-Oeste e Sudeste, o efeito do El Niño pode não ser tão pronunciado, mas geralmente apresenta uma tendência de aumento das temperaturas médias e irregularidade nas chuvas, principalmente em áreas mais ao norte. Essas condições climáticas têm implicações em diversos setores socioeconômicos, como agricultura, gestão hídrica, saúde pública e gestão de desastres, afetando a vida e o sustento de muitas pessoas.

No entanto, é importante ressaltar que nem todo evento El Niño leva a impactos típicos, e variações significativas nos impactos podem ser observadas. Essas variações dependem da configuração e intensidade específicas de cada fenômeno El Niño, bem como de uma série de fatores locais e regionais. Estes incluem outros sistemas meteorológicos e padrões de teleconexão que podem interagir com o ENOS, modulando seus efeitos.

O entendimento detalhado do ENOS e seus impactos é crucial para o Brasil, especialmente para setores como a agricultura, que são altamente sensíveis às variações climáticas. Estratégias de mitigação e adaptação, baseadas em previsões e monitoramento contínuo do ENOS, são fundamentais para preparar e proteger as comunidades e os setores econômicos afetados por este fenômeno climático.

TENDÊNCIA DAS CONDIÇÕES OCEÂNICAS

A análise do modelo de previsão do ENOS (El Niño – Oscilação Sul), realizada pelo Instituto Internacional de Pesquisa em Clima (IRI), indica a persistência das condições de El Niño (fase quente) durante os meses de primavera, e com probabilidades maiores que 90% que o fenômeno se mantenha até o verão de 2024, considerando o trimestre dezembro, janeiro e fevereiro.

GRÁFICO 2 – PREVISÃO PROBABILÍSTICA DO IRI PARA OCORRÊNCIA DE EL NIÑO OU LA NIÑA

Fonte: IRI – https://iri.columbia.edu/our-expertise/climate/forecasts/enso/current/.

Quanto à intensidade do fenômeno, a maioria dos modelos climáticos projeta que, durante a primavera e o verão do Hemisfério Sul, o El Niño possa atingir uma intensidade forte, caracterizada por anomalias de TSM superiores a 1,5 °C.

Contudo, há divergências entre os modelos climáticos, principalmente no que concerne à intensidade do fenômeno nos próximos meses. Essa variação na intensidade e a incerteza inerente dos modelos tornam crucial o monitoramento contínuo para entender os impactos potenciais em diferentes regiões do Brasil e para auxiliar os tomadores de decisão, buscando estratégias de mitigação e adaptação eficazes.

COMO O EL NIÑO PODE AFETAR A PRODUÇÃO DE GRÃOS NO BRASIL?

Diversos estudos apontam a influência do ENOS na agricultura global, e o Brasil, com sua diversidade agrícola e climática, não é exceção. Em anos de El Niño, os padrões climáticos alterados podem ter uma série de consequências para a agricultura brasileira, impactando a produção, a distribuição das culturas agrícolas e, consequentemente, o preço final dos alimentos.

Em geral, no Brasil, em anos de El Niño, é comum observar um aumento da disponibilidade hídrica no Centro-Sul do país, o que tende a beneficiar culturas de grãos como soja e o milho primeira safra.

No entanto, o excesso de chuvas na Região Sul pode aumentar a umidade e a severidade de doenças em plantas, exigindo maior vigilância e cuidados no monitoramento e manejo das culturas, além de prejudicar as operações de colheita das culturas de inverno, como o trigo. Em áreas do Matopiba, por sua vez, a redução dos níveis de água no solo pode resultar em perdas significativas de produtividade, enquanto a irregularidade das chuvas em áreas do Brasil central pode dificultar o manejo agrícola e também afetar a produtividade.

A variabilidade climática inerente ao sistema climático global evidencia a sua complexidade, resultando em impactos distintos nas culturas agrícolas de um ano para outro. O clima do Brasil, em particular, é influenciado por uma multiplicidade de fatores e interações, não sendo o ENOS o único elemento a moldar os padrões climáticos observados no país. Portanto, é crucial considerar essa complexa rede de influências ao analisar os potenciais impactos do El Niño e outros fenômenos climáticos na agricultura e em outros setores.

Para mitigar as condições climáticas adversas, estratégias como o ajuste de genótipo para variedades mais tolerantes à seca e de alta performance, o escalonamento da data de semeadura, o preparo e correção do solo em profundidade, o uso de bioestimulantes e, quando possível, de irrigação, são fundamentais. Além disso, a adoção de fertilizantes antiestresse, a manutenção de uma cobertura adequada do solo e matéria orgânica e um controle fitossanitário integrado e rigoroso são essenciais para enfrentar os desafios impostos pelo clima na agricultura brasileira.

PERSPECTIVAS PARA O INÍCIO DA SAFRA 2023/24 – PROGNÓSTICO CLIMÁTICO PARA O BRASIL, OUTUBRO, NOVEMBRO E DEZEMBRO DE 2023

As previsões climáticas para os próximos três meses, segundo o modelo do Inmet, são mostradas na figura abaixo. O modelo indica um padrão clássico de condições de El Niño, com chuvas abaixo da média no Centro e Norte do país, enquanto no Centro-Sul há previsão de chuvas acima da média.

Em geral, essa condição favorecerá uma maior disponibilidade hídrica na Região Sul, enquanto há um aumento das condições de déficit hídrico em áreas das Regiões Norte e Nordeste, como é o caso do Matopiba. Já em áreas do Norte do Brasil Central, a irregularidade das chuvas pode ocasionar um possível atraso do início da estação chuvosa, que poderá impactar os níveis de água no solo.

Analisando separadamente cada região do país, tem-se que, para a região Norte, a previsão é de chuvas predominantemente abaixo da média, com exceção de áreas pontuais do Acre, Amazonas e Pará. Nestas áreas, as chuvas podem ficar ligeiramente acima da média, especialmente em novembro e em dezembro, o que favorecerá a elevação dos níveis de água no solo.

Em grande parte da Região Nordeste, incluindo áreas do Matopiba e Sealba, há previsão de chuvas abaixo da média, que também podem ser ocasionadas pela atuação do fenômeno El Niño.

Essa condição impactará negativamente os níveis de água no solo, agravando o déficit hídrico principalmente em outubro e em novembro. Contudo, prevê-se uma recuperação dos níveis de água no solo a partir de novembro em áreas do sul do Matopiba e da Bahia, enquanto o déficit hídrico persistirá em áreas do norte e costa leste da região durante todo o trimestre.

Já nas Regiões Centro-Oeste e Sudeste, o modelo do Inmet indica chuvas dentro ou abaixo da média em áreas do centro e norte de Goiás, Mato Grosso, Minas Gerais e Espírito Santo. Essa condição manterá os níveis de armazenamento hídrico mais baixos, especialmente em outubro, devido à irregularidade temporal e espacial das chuvas nessas áreas.

Entretanto, em novembro há previsão do retorno gradual das precipitações, marcando o início da estação chuvosa, com a formação do canal de umidade advindo da região amazônica. Já em áreas do centro-sul das duas regiões, como em Mato Grosso do Sul e São Paulo, bem como no sul de Minas Gerais, a previsão é de chuvas dentro ou acima da média, favorecendo a manutenção dos níveis de água no solo durante todo o trimestre.

Na Região Sul, a atuação do fenômeno El Niño continuará favorecendo a previsão de chuvas acima da média em toda a região. Além disso, os grandes volumes de chuva previstos deixarão os níveis de água no solo elevados, gerando inclusive excedente hídrico, principalmente em outubro e novembro.

Em relação à temperatura média do ar, o modelo continua indicando que, durante os meses de primavera, as temperaturas continuarão acima da média climatológica em praticamente todo o país, principalmente em áreas centrais do Brasil e no Matopiba, com valores médios ultrapassando 27 °C. Já em áreas da Região Sul, as temperaturas podem ficar dentro ou ligeiramente acima da média, porém com valores menores que 23 °C, principalmente em outubro devido ao aumento da nebulosidade e dias chuvosos.

Mais detalhes sobre prognóstico e monitoramento climático podem ser vistos na opção CLIMA do menu principal do site do Inmet: https://portal. inmet.gov.br.

FIGURA 3 – PREVISÃO PROBABILÍSTICA DE PRECIPITAÇÃO PARA O TRIMESTRE OUTUBRO, NOVEMBRO E DEZEMBRO DE 2023

Fonte: Inmet

Fonte: Conab



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