Fonte: Circular Técnica nº 252 da Embrapa.
No presente trabalho foi avaliada a reação de híbridos comerciais de milho
quanto à severidade da ferrugem-polissora em diferentes locais de plantio no
Estado do Tocantins, na safrinha.
Autores: Rodrigo Véras da Costa, Luciano Viana Cota, Dagma Dionízia da Silva, Rodrigo Estevam Munhoz de Almeida, Leonardo José Motta Campos.
A ferrugem-polissora, (Puccinia polysora Underwood), é considerada uma das principais doenças foliares da cultura do milho no Brasil em regiões de baixa altitude e clima quente e úmido. A severidade da doença é maior em áreas de clima quente (entre 26 e 30°C), baixa altitude e elevada umidade relativa do ar. Perdas superiores a 50% na produtividade de grãos têm sido detectadas sob condições ambientais favoráveis (Costa et al., 2015; Casela;
Ferreira, 2002; Von Pinho, 1998). Os danos causados pela doença incluem redução da área foliar, redução do peso dos grãos, senescência precoce e acamamento de plantas. Os sintomas da doença são caracterizados pela presença de pústulas circulares a ovais, de coloração marrom-clara a alaranjada medindo 0,2 a 2,0 mm de comprimento e distribuídas, principalmente, na superfície superior das folhas. Os urediniósporos têm coloração amarela a dourada e são tipicamente elipsoides ou ovoides (Dudienas et al., 2013). Os teliossoros são raros, aparecendo em círculos ao redor das pústulas urediniais, com 0,2 a 0,5 mm de diâmetro, de cor marrom a preta. Os teliósporos e os uredionósporos do patógeno são considerados inóculos primário e secundário da doença, respectivamente. Não existem, ou não são conhecidos, hospedeiros alternativos de P. polysora (Pataky, 2000). O fungo geralmente infecta folhas completamente expandidas da planta, e a doença torna-se mais severa à medida que a planta se desenvolve.
Reação de híbridos de milho à Ferrugem-Polissora
A dispersão do fungo a longas distâncias ocorre através do vento e a sua sobrevivência no ambiente depende da presença de plantas de milho, por tratar-se de um potógeno biotrófico. As principais medidas recomendadas para o manejo da ferrugem-polissora são a resistência genética e o uso de fungicidas foliares. O uso da resistência genética é dificultado pela elevada variabilidade do patógeno, o que resulta no surgimento de novas raças do fungo, tornando importante a avaliação da resistência em diferentes regiões e épocas de plantio (Casela; Ferreira, 2002). Desse modo, faz-se necessária uma constante avaliação dos híbridos de milho disponíveis no mercado quanto ao nível de resistência ou suscetibilidade que possuem em relação à ferrugem-polissora. As condições ambientais também exercem grande influência sobre o desenvolvimento da doença em caráter epidêmico. Sob condições favoráveis (temperatura em torno de 27 °C e elevada umidade relativa) a reprodução e a dispersão do fungo ocorrem rapidamente, podendo causar grandes epidemias mesmo a partir de um reduzido inóculo inicial. No presente trabalho foi avaliada a reação de híbridos comerciais de milho quanto à severidade da ferrugem polissora em diferentes locais de plantio no Estado do Tocantins, na safrinha. Foram conduzidos três experimentos em campo, em fazendas de produção de grãos (soja verão e milho safrinha) localizadas nos municípios de Pedro Afonso-TO (Fazenda Pedra Azul), Aparecida do Rio Negro-TO (Fazenda Boa Esperança) e Porto Nacional-TO (Fazenda Frigovale). As condições de clima e solo nas três localidades são semelhantes e se caracterizam por chuvas de verão e inverno seco, típico do bioma do Cerrado. A temperatura média na região é de 32 °C na estação seca (abril a setembro) e 26 °C na estação chuvosa (outubro a março). O solo nas três localidades é classificado como Latossolo Vermelho distrófico típico.
Trinta híbridos de milho foram avaliados no período da safrinha, após o cultivo da soja no verão. As semeaduras dos ensaios foram realizadas em 15/02/2017 (Pedro Afonso), 24/02/2017 (Aparecida do Rio Negro) e 14/03/2017 (Porto Nacional). Foi utilizado o delineamento experimental de blocos ao acaso, com os tratamentos dispostos em arranjo fatorial 3 x 30 (locais x híbridos de milho) e três repetições. As parcelas experimentais foram constituídas por quatro linhas de cinco metros, com espaçamento de 0,50 metro entre linhas e densidade média de 65.000 plantas ha-1. As duas linhas centrais foram consideradas como área útil e as duas linhas laterais, como bordadura. As sementes foram tratadas com tiametoxam na dose de 0,08 L 60.000 sementes-1. A adubação consistiu de 130 kg ha-1 de P2O5, 67,5 kg ha-1 de K2O e 27 kg ha-1 de nitrogênio na semeadura, mais 90 kg ha-1 de nitrogênio em cobertura, na forma de ureia, aplicada nas fases de 4 a 6 folhas. Não foi realizada aplicação de fungicida para o manejo de doenças, em função do
objetivo do experimento.
As avaliações da intensidade da ferrugem-polissora foram realizadas aos 80 dias após a emergência, durante o estádio reprodutivo das plantas. A severidade da ferrugem-polissora foi avaliada em 11/05/2017 (Pedro Afonso), 19/05/2017 (Aparecida do Rio Negro) e 02/06/2017 (Porto Nacional). Para tal, utilizou-se uma escala de notas de 1 (0% de severidade) a 9 (75% de severidade a 100% das folhas com lesões) (Agroceres, 1996). Foi atribuída uma nota média de severidade da doença em cada parcela. As notas de severidade foram submetidas à análise de variância para os diferentes locais, cada local representando uma época distinta de semeadura, e as médias, quando necessário, foram comparadas pelo teste Scott-Knott, a 5% de significância. Os dados de precipitação foram obtidos em cada localidade utilizando um pluviômetro. A precipitação mensal e o volume total obtido para cada localidade, para os meses de janeiro a junho de 2017, foram coletados (Figura 1). O volume e a distribuição de chuvas foram semelhantes nos três locais, superando a 1.000 mm no período, com volume total ligeiramente superior em Porto Nacional. Em Pedro Afonso e Aparecida do Rio Negro, foram registrados volumes de chuva em todos os meses, embora estes tenham sido menores nos meses de maio e junho. Em Porto Nacional, apesar do maior volume total, não foi registrada chuva no mês de junho (Figura 1).
Figura 1. Precipitação média mensal (mm) nos três locais de condução dos experimentos de milho safrinha: Pedro Afonso (semeadura em 15/02), Aparecida do Rio Negro (semeadura em 24/02) e Porto Nacional (semeadura em14/03), na safrinha de 2017, no Estado do Tocantins.
De acordo com a análise de variância, houve interação significativa entre os fatores local de plantio e híbrido para a severidade da doença, indicando que os efeitos isolados dos fatores não explicam toda a variação encontrada para esta característica. Observou-se diferença entre as médias de severidade nas três épocas de semeadura (Tabela 1). A menor severidade média foi observada em Pedro Afonso (primeira época de semeadura), seguida de Porto Nacional (terceira época de semeadura) e Aparecida de Rio Negro (segunda época de semeadura). Em Pedro Afonso não foi verificada diferença entre os híbridos, em razão da baixa severidade da doença. Em Aparecida de Rio Negro e Porto Nacional, as notas variaram de 1,5 a 7,3, e de 1,0 a 4,3, respectivamente. Na média conjunta das notas de severidade, para os três locais de plantio, os híbridos mais suscetíveis foram SYN 5T78 VIP e LG6033 PRO, seguidos dos híbridos MG580 PW e Fórmula VIP2. No grupo dos mais resistentes, 22 híbridos apresentaram nota média inferior a 2,0.
Tabela 1. Notas de severidade da ferrugem-polissora (Puccinia polysora) em 30 híbridos de milho em relação aos locais de avaliação e às datas de semeadura, na safrinha de 2017.
Tabela 1 cont. Notas de severidade da ferrugem-polissora (Puccinia polysora) em 30 híbridos de milho em relação aos locais de avaliação e às datas de semeadura, na safrinha de 2017.
Segundo Chagas et al. (2015) e Costa et al. (2015), a ferrugem-polissora está entre as principais doenças foliares do milho no Estado do Tocantins. Os resultados obtidos no presente trabalho estão de acordo com os referidos autores quanto à importância da ferrugem-polissora para o milho safrinha na região de Tocantins. Considerando as condições favoráveis para o desenvolvimento da doença e os genótipos suscetíveis, é imprescindível que se adotem medidas de controle para redução dos danos provocados pela doença em plantios de milho no Tocantins. Entre as medidas de controle destaca-se a resistência genética (Casela; Ferreira, 2002; Dudienas et al., 2013). No presente trabalho observou-se variabilidade entre os híbridos quanto a reação à ferrugem-polissora. Resultados semelhantes têm sido relatados na literatura. Von Pinho et al. (2001), verificaram a diferença entre híbridos quanto a reação à ferrugem-polissora. Segundo os autores, os híbridos mais resistentes a P. polysora foram Z 8392, C 909 e C 333, e os mais suscetíveis foram P 3069, AG 9012, C 956. Resultados semelhantes têm sido relatados em outros trabalhos (Vieira et al., 2011; Nihei; Ferreira, 2012).
Em condição controlada, Costa et al. (2015) avaliaram 46 híbridos de milho com inoculação artificial e relataram três híbridos resistentes (2B710, Impacto VIP e P30F80), três moderadamente resistentes (Impacto, P30F35 e P30F35HX) e 89% dos híbridos foram classificados como suscetíveis ou altamente suscetíveis à doença. Além disso, verificaram diferenças entre a reação à doença nas versões transgênicas e convencionais do mesmo híbrido, como foi o caso do híbrido Impacto e Impacto VIP, que foram considerados como resistentes e moderadamente resistentes ao fungo, respectivamente. Costa et al. (2015) obtiveram resultados semelhantes de resistência para o híbrido P30F35. No entanto, resultados divergentes foram observados para o híbrido DKB390 PRO3, que apresentou reação de resistência no presente trabalho, mas foi classificado como suscetível pelos referidos autores. Esta diferença pode estar relacionada à alta variabilidade genética do patógeno, indicando a existência de diferentes raças do fungo na natureza, conforme descrito por Casela e Ferreira (2002). A severidade média da ferrugem-polissora foi maior no ensaio conduzido em Aparecida do Rio Negro, segunda época de semeadura (Tabela1; Figura 2).
As condições de chuva e temperatura média (em torno de 26 °C) para Pedro Afonso (primeira época de semeadura) e Aparecida do Rio Negro (segunda época de semeadura) foram muito próximas, portanto, outros fatores podem ter contribuído para a menor severidade das doenças na primeira época de semeadura. A primeira época corresponde aos primeiros plantios de milho safrinha na região, após a colheita da soja cultivada no verão. Pelo fato de o fungo P. polysora ser um parasita obrigatório e não ter outros hospedeiros conhecidos (Pataky, 2000), os primeiros plantios foram submetidos a uma menor pressão de inóculo, resultando em menor severidade da doença no campo. Para os plantios subsequentes é provável que o inóculo (urediniósporos) da doença, produzido nos primeiros plantios, se disperse com maior rapidez e produza novas infecções mais rapidamente em condições ambientais favoráveis.
Figura 2. Notas médias de severidade da ferrugem-polissora avaliada em três locais, Pedro Afonso (semeadura em 15/02/2017), Aparecida do Rio Negro (semeadura em 24/02/2017) e Porto Nacional (semeadura em 14/03/2017), na safrinha de 2017, no Estado do Tocantins.
No caso do ensaio de Porto Nacional (terceira época de semeadura), a menor severidade da ferrugem em relação a Aparecida do Rio Negro (segunda época de semeadura) está relacionada à maior restrição hídrica, ocasionada pela semeadura tardia. Em Aparecida do Rio Negro, o florescimento das plantas ocorreu na segunda quinzena de abril, com chuvas suficientes para o desenvolvimento da doença, inclusive no mês de maio (Figura 1). Em Porto Nacional, o florescimento ocorreu em maio, no final do período chuvoso, com maior restrição hídrica e condições menos favoráveis ao desenvolvimento da doença. É conhecido que as plantas de milho se tornam mais suscetíveis ao ataque de doenças após a fase de florescimento e, para o desenvolvimento dos patógenos, é necessário um período de molhamento foliar de 2 a 24 horas (Hollier; King, 1985; Godoy et al., 1999). Estes resultados corroboram os dados obtidos por Dudienas et al. (2013), com plantios em diferentes locais do Estado de São Paulo, onde a menor severidade da ferrugem-polissora ocorreu em ambientes com menor precipitação após o florescimento do milho.
Portanto, alterações na época de semeadura que resultem em condições restritivas de umidade após o florescimento desfavorecem a ocorrência de algumas doenças foliares, como é o caso da ferrugem-polissora. Juliatti e Souza (2005) avaliaram o efeito de duas épocas de semeadura, em 06/02/2002 e 04/03/2002, no desenvolvimento das doenças foliares do milho safrinha na região de Itumbiara-GO. Segundo os autores, ferrugem-polissora, ferrugem-branca e mancha-de-turcicum ocorrem em maior severidade no plantio realizado no mês de fevereiro, e a mancha-de-bipolaris ocorreu em maior severidade na semeadura realizada em março. No presente trabalho, resultados semelhantes foram observados. A ferrugem-polissora apresentou maior severidade na semeadura realizada em 24 de fevereiro, quando houve menor restrição hídrica na fase de florescimento e enchimento de grãos (Figuras 1 e 2). Baseado nos resultados obtidos, conclui-se: I. há variabilidade nos genótipos de milho quanto à resistência à ferrugem-polissora, e híbridos com bons níveis de resistência a esta ferrugem foram identificados; II. A época de semeadura influenciou a severidade da ferrugem-polissora; e III. A severidade da ferrugem-polissora foi maior na semeadura realizada no último decêndio de fevereiro.
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Referências
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