Diversos microrganismos, incluindo fungos, bactérias e nematoides benéficos, podem interagir com as plantas, na zona rizosférica, trazendo benefícios para o crescimento e desenvolvimento vegetal, e/ou estimulando a tolerância vegetal a fatores bióticos e abióticos, por meio de relações simbióticas e/ou associativas. Esses microrganismos benéficos desempenham papéis primordiais na sustentabilidade de culturas agrícolas, contribuindo para mitigar danos decorrentes de estresses, além de contribuir para o aumento da produtividade.

Dentre esses microrganismos, um grupo em específico se destaca por apresentar uma ampla relação com diversas espécies vegetais, trazendo benefícios às plantas que vão além do estímulo ao crescimento. Trata-se dos fungos micorrízicos arbusculares (FMA).

Os fungos micorrízicos arbusculares, são fungos de solo do filo Glomeromycota, microssimbiontes obrigatórios de plantas, que se diferenciam de outros fungos por apresentar formação de arbúsculos dentro das células de raízes ou talos vegetais, hifas cenocíticas (ou as vezes esparsamente septadas) e esporos grandes, com várias paredes em camadas contendo algumas dezenas de milhares de núcleos. Normalmente, os arbúsculos são semelhantes a haustórios, entretanto, não rompem o citoplasma e têm duração efêmera na vida celular, o que caracteriza uma simbiose não patogênica ao vegetal (Saggin Júnior et al., 2011).

Figura 1. Estruturas de Fungos Micorrízicos Arbusculares: A – arbúsculo; B – Células auxiliares; C – Vesículas (v) e glomerosporos (g).

Fotos: A, B (Monte Júnior); C (Peterson et al.)

Conforme destacado por Hoffmann & Lucena (2006), as micorrizas se classificam como ecto, endo e ectoendomicorrizas. Nas ectomicorrizas, o fungo, geralmente basideomiceto, forma um manto externo e desenvolve-se também nos espaços intercelulares, sem que ocorra desenvolvimento intracelular. Nas endomicorrizas, ao contrário, o fungo desenvolve-se intracelularmente. São divididas em três tipos distintos, sendo que os tipos ericóide e orquidóide ocorrem apenas nas famílias Ericaceae e Orquidaceae, respectivamente. O terceiro tipo, micorrizas vesículoarbusculares ou, simplesmente, micorrizas arbusculares, ocorrem em cerca de 80% das espécies de plantas. Os fungos que formam endomicorrizas pertencem a uma de 130 espécies da ordem Glomales de Zigomicetos (Hoffmann & Lucena, 2006).

Jacott; Murray; Ridout (2017), explicam que os fungos micorrízicos arbusculares, são biotróficos obrigatórios, dependendo do tecido radicular vivo para completar o seu ciclo de vida assexuado. Sobretudo, esses fungos trazem benefícios que vão além do estímulo ao crescimento vegetal. Por “expandirem” o volume de solo explorado pela rizosfera, as micorrizas são capazes de aumentar a absorção de água e nutrientes pela planta, além de estimular a tolerância a estresses hídricos e salinos.

A exemplo do Fósforo (fosfato) que é considerado um nutriente imóvel no solo e facilmente retido em seus colóides, Jacott; Murray; Ridout (2017) destacam que  a simbiose com os FMA pode permitir uma utilização mais eficiente desse nutriente, através da exploração do solo, além da zona de depleção do nutriente (figura 2), contornando a limitação da difusão e acedendo a uma área maior do solo para a absorção de fosfato.

Figura 2. Efeitos positivos da colonização micorrízica arbuscular (MA). A rede de hifas dos fungos micorrízicos arbusculares (FMA) estende-se para além da zona de esgotamento (cinzento), acedendo a uma maior área do solo para a absorção de fosfato. Uma zona de depleção de fosfato micorrízico também se formará eventualmente à volta das hifas MA (púrpura). Outros nutrientes que aumentaram a assimilação nas raízes MA incluem o nitrogénio (amónio) e o zinco. Os benefícios da colonização incluem a tolerância a muitos estresses abióticos e bióticos através da indução de resistência sistémica adquirida (SAR).

Adaptado: Jacott; Murray; Ridout (2017)

Os FMA fornecem água e nutrientes às suas plantas hospedeiras, o que se espera que tenha um efeito benéfico no crescimento das plantas, entretanto, as respostas frente ao incremento de produtividade das culturas agrícolas ainda variam de estudo para estudo. O que se sabe até então, é que além da aquisição de nutrientes, os benefícios da simbiose entre micorrizas arbusculares e plantas, incluem a melhoria nas tolerâncias a estresses abióticas  (principalmente sal e seca) e bióticas (principalmente agentes patogénicos transmitidos pelo solo) (Jacott; Murray; Ridout., 2017).

Embora os FMA possam ser encontrados naturalmente no solo, o estímulo à colonização desses fungos pode ser realizado por meio da inoculação com espécies de fungos micorrízicos. Resultados observados por Miranda & Miranda (2007), demonstram que a inoculação de áreas de soja e milho, com fungos micorrízicos da espécie Glomus etunicatum proporciona aumento de produtividade na cultura da soja, no primeiro ano de cultivo, independentemente do sistema de cultivo (convencional ou plantio direto).



Os resultados observados pelos autores, demonstram que o incremento da população dos FMA no solo, pode proporcionar ganho produtivo em soja e milho, resultando em acréscimo de produtividade de até 244 kg ha-1 para soja (2001) e de 590 kg ha-1 para o milho (2002) nos primeiros anos de cultivo. Embora nos demais anos analisados por Miranda & Miranda (2007), os ganhos de produtividade em função da inoculação dos FMA não tenham sido expressivos, não houve diferença estatística que demonstrasse que a inoculação com FMA prejudicasse a produtividade das culturas, demonstrando a necessidade e importância de uma elevada comunidade desses  fungos, desde o estabelecimento do sistema produtivo.

Sobretudo, é consenso que as micorrizas arbusculares trazem distintos benefícios ao sistema produtivo, podendo inclusive influenciar na produtividade das culturas e tolerância a estresses bióticos e abióticos, sendo, portanto, uma importante ferramenta de manejo para o aumento da rentabilidade e sustentabilidade das culturas agrícolas.


Veja mais: Micorrizas são benéficas para a soja?



Referências:

HOFFMANN, L. V.; LUCENA, V. S. PARA ENTENDER MICORRIZAS ARBUSCULARES. Embrapa Algodão, 2006. Disponível em: < https://www.infoteca.cnptia.embrapa.br/bitstream/doc/276480/1/DOC156.pdf >, acesso em: 15/01/2024.

JACOTT, C. N.; MURRAY, J. D.; RIDOUT, C. TRADE-OFFS IN ARBUSCULAR MYCORRHIZAL SYMBIOSIS: DISEASE RESISTANCE, GROWTH RESPONSES AND PERSPECTIVES FOR CROP BREEDING. Agronomy 2017. Disponível em: < https://www.mdpi.com/2073-4395/7/4/75# >, acesso em: 15/01/2024.

MIRANDA, J. C. C.; MIRANDA, L. N. CONTRIBUIÇÃO DA MICORRIZA ARBUSCULAR PARA A PRODUTIVIDADE E SUSTENTABILIDADE NOS SISTEMAS DE PRODUÇÃO COM PLANTIO DIRETO E CONVENCIONAL NO CERRADO. Embrapa, Comunicado Técnico, n. 134, 2007. Disponível em: < https://www.infoteca.cnptia.embrapa.br/infoteca/bitstream/doc/557814/1/comtec134.pdf >, acesso em: 15/01/2024.

MONTE JÚNIO, I. P. FUNGOS MICORRÍZICOS ARBUSCULARES (GLOMEROMYCOTA) E ESPÉCIES DE MARACUJAZEIRO (PASSIFLORAL.): RELAÇÃO ENTRE FILOGENIA DOS FUNGOS E COMPATIBILIDADE FUNCIONAL. Universidade Federal de Pernambuco, Tese de Doutorado, 2017. Disponível em: < https://repositorio.ufpe.br/bitstream/123456789/30482/1/TESE%20In%c3%a1cio%20Pascoal%20do%20Monte%20J%c3%banior.pdf >, acesso em: 15/01/2024.

SAGGIN JÚNIOR, O. J. et al. FUNGOS MICORRÍZICOS ARBUSCULARES. Manual de Curadores de Germoplasma – Micro-organismos: Fungos Micorrízicos Arbusulares, Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, 2011. Disponível em: < https://www.embrapa.br/documents/1355163/2005846/doc334-290-76.pdf/adb755f4-51b9-49e2-aabe-d400baf644fb >, acesso em: 15/01/2024.

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