No Brasil, o cultivo sucessivo de culturas agrícolas e condições de clima tropical são favoráveis ao desenvolvimento de pragas e doenças, sendo as moscas-brancas de grande relevância neste cenário. Os danos diretos da praga incluem sucção da seiva e injeção de toxinas nas plantas, além de atuar como vetor de diversas viroses. Já os danos indiretos ocorrem devido à excreção de substâncias açucaradas sobre as folhas, favorecendo a proliferação de fumagina, uma camada fúngica escura que reduz a taxa fotossintética das plantas.
Dentre as diferentes espécies de mosca-branca, o complexo Bemisia tabaci e a espécie Trialeurodes vaporariorum são as que possuem maior destaque. No complexo B. tabaci, há várias espécies crípticas (ou seja, de difícil identificação) que apresentam alta polifagia, baixa suscetibilidade a inseticidas e eficiência de dispersão no campo.
Já a espécie T. vaporariorum, conhecida como a mosca-branca de casa de vegetação, é comum em regiões de elevada altitude e climas mais amenos, como é o caso do Sul e Sudeste do país. Contudo, apesar de sua presença estar associada frequentemente a casas de vegetação, surtos populacionais de T. vaporariorum têm sido verificados também em campo aberto no Brasil.
Figura 1. Mosca-branca em soja.
Fonte: alavoura.com.br, acesso em: 12/03/2021
Dentro do complexo B. tabaci, as principais espécies presentes no Brasil são as chamadas Middle East – Asia Minor 1 (MEAM1, anteriormente denominada biótipo B), Mediterranean (MED, anteriormente denominada biótipo Q) e New World (NW, anteriormente denominada biótipo A). Embora sejam morfologicamente idênticas, estudos moleculares revelaram que tratam-se de espécies distintas, e não apenas biótipos diferentes como se acreditou por muito tempo (DE BARRO et al., 2011). Como seus nomes indicam, a origem geográfica da espécie MEAM1 é provavelmente a região do Oriente Médio, enquanto MED é nativa da região do Mediterrâneo e NW das Américas.
Estas espécies se dispersaram de suas áreas nativas para uma abrangência global, predominantemente seguindo as rotas internacionais de comércio agrícola. Atualmente, estima-se que o complexo B. tabaci conta com no mínimo 44 espécies diferentes. Na década de 1990, o cenário de mosca-branca no Brasil foi radicalmente alterado com a introdução da B. tabaci MEAM1, então conhecida por biótipo B, através do comércio de plantas ornamentais no estado de São Paulo. Desde então, essa espécie se dispersou rapidamente pelo território nacional, sendo importante fator na disseminação de diversos vírus fitopatogênicos, inclusive na cultura da soja.
Figura 2. Estados afetados pela mosca-branca no Brasil na década de 90.
Fonte: promip.agr.br , acesso em 12/03/2021.
Duas espécies de mosca branca, NW1 (Novo Mundo 1) e NW2 (Novo Mundo 2) habitam de forma nativa no Brasil, mas as perdas de rendimento na cultura da soja devido ao ataque de mosca-branca só se toraram significativas após a introdução acidental da espécie MEAM1 no país. Diante disso, altas infestações de B. tabaci MEAM1 foram relatadas no Brasil, deixando de ser uma praga ocasional para se tornar um problema grave das lavouras de soja. A praga está atualmente espalhada pela maioria dos estados brasileiros, mas ocorre em maiores níveis de infestação na região Centro-Oeste. Além disso, nesta região a resistência a inseticidas e falhas de controle também são mais frequentes (POZEBON et al., 2020).
Segundo De Moraes et al. (2018), atualmente MEAM1 ainda é considerada a espécie predominante de mosca-branca presente no Brasil. Entretanto, MED vem se destacando e se disseminando de forma acelerada, especialmente em hortaliças, tornando-se importante compreender o comportamento, desempenho e habilidade competitiva de MED e MEAM1 em culturas de importância agrícola no país. É altamente provável que a espécie MED tenha chegado ao Brasil a partir da Argentina e do Uruguai, onde sua presença havia sido previamente detectada.
Enquanto as populações da espécie MED tendem a dominar cultivos em casas de vegetação, a espécie MEAM1 normalmente prevalece em campo aberto, e ainda é responsável pelas maiores perdas de produtividade causadas por mosca-branca na cultura da soja. As perdas econômicas ocasionadas por B. tabaci MEAM1 na agricultura brasileira, desde sua introdução na década de 90, foram estimadas em cerca de 3 bilhões de dólares (CZEPACK, 2010), denotando a importância dessa praga agrícola e a necessidade de realizar o seu correto manejo. Para saber mais sobre o controle de mosca-branca em soja, acesse: https://maissoja.com.br/como-controlar-mosca-branca-em-soja/
Revisão: Henrique Pozebon, Mestrando PPGAgro e Prof. Jonas Arnemann, PhD. e Coordenador do Grupo de Manejo e Genética de Pragas – UFSM
REFERÊNCIAS:
BELLO, Vinicius Henrique. Dispersão de Bemisa tabaci Mediterranean e vírus associados no Brasil e transmissão de polerovirus por afídeos e mosca-branca em Israel. 2020.
CZEPAK, C. Reação em Cadeia. Cultivar Hortaliças e Frutas, v. 61, p. 22–25, 2010.
DE BARRO, Paul J. et al. Bemisia tabaci: a statement of species status. Annual review of entomology, v. 56, p. 1-19, 2011.
DE MORAES, Letícia Aparecida et al. Distribution and phylogenetics of whiteflies and their endosymbiont relationships after the Mediterranean species invasion in Brazil. Scientific reports, v. 8, n. 1, p. 1-13, 2018.
POZEBON, Henrique et al. Arthropod invasions versus soybean production in Brazil: a review. Journal of Economic Entomology, v. 113, n. 4, p. 1591-1608, 2020.