O cultivo da soja safrinha, também chamada soja de segunda safra, tem como principal objetivo agregar na rentabilidade do produtor rural, com a possibilidade de cultivar duas culturas nobres na mesma safra de verão. Em síntese, considera-se soja safrinha quando a semeadura é realizada após 31 de dezembro, no período em que as plantas de soja estariam se encaminhando para o final do seu ciclo natural de safra. Atualmente, a área total semeada com soja safrinha no Rio Grande do Sul encontra-se entre 250 mil e 300 mil hectares, concentrados principalmente no noroeste do estado, onde a ausência de geadas tardias possibilita semeadura precoce do milho (em meados de agosto) e subsequente cultivo de soja na mesma área.

Em geral, a soja safrinha é semeada após a colheita de uma safra precoce de milho, mas também pode ocorrer em sequência a outra safra de soja. Esse modelo de cultivo requer alguns cuidados específicos em relação a pragas e doenças, principalmente quando se opta pelo cultivo soja sobre soja. Nesse caso, o cultivo tardio pode enfrentar severos problemas fitossanitários pela maior presença de inóculo de doenças (como ferrugem asiática) e alta pressão de pragas desde o estabelecimento da cultura. Neste texto, vamos abordar mais sobre as pragas que tem sido predominantes nas últimas safrinhas de soja e seus pontos relevantes.

Em meados de março inicia-se a colheita da safra principal de soja. Nesse momento, as pragas presentes na lavoura iniciam um movimento de procura por novas fontes de alimento e abrigos para reprodução, e as áreas de soja safrinha tornam-se o principal alvo dessa migração. Assim, mantém-se a disponibilidade de alimento no campo por um maior período de tempo, favorecendo a multiplicação e ocorrência das pragas de parte aérea, especialmente dos sugadores.

Uma das pragas que vem ganhando destaque nas últimas safrinhas de soja é a mosca-da-haste, Melanagromyza sojae. A cultura da soja é o principal hospedeiro de M. sojae, sendo que as plantas atacadas praticamente não apresentam danos externos visíveis, salvo do encurtamento dos entrenós na haste principal (POZEBON et al., 2020). Sendo assim, torna-se necessária a abertura da haste principal das plantas de soja para realização do monitoramento da lavoura, visto que é possível visualizar a presença dos espécimes (larva ou pupa) da mosca-da-haste e/ou das suas galerias de alimentação, que constituem o principal dano ocasionado pela praga (Figura 1).

Figura 1. Galeria em haste de soja causada pela presença da larva de M. sojae (esquerda) e planta com sintoma de encurtamento de entrenós (direita).

Fonte: Grupo de Manejo e Genética de Pragas (UFSM) e Vitorio et al. (2019). Confira a imagem original Clicando aqui

Segundo Arnemann et al. (2019), essas galerias dificultam a passagem de água e nutrientes para a parte superior da planta, tendo danos significativos que podem ocasionar redução de produtividade de até 36%, dependendo da intensidade e severidade do ataque. Quanto mais curto for o ciclo da cultura, maior será o dano por mosca-da-haste, pois ao acelerar o ciclo as plantas de soja acumulam menos matéria seca e perdem a capacidade de compensar a injúria sofrida (TALEKAR, 1989). Para saber mais sobre o modo como a mosca-da-haste danifica as plantas de soja, acesse: https://maissoja.com.br/como-a-mosca-da-haste-danifica-as-plantas-de-soja/

A eficiência do controle químico para essa praga é baixa, devido ao fato da larva permanecer protegida no interior da haste e não ser atingida pelas pulverizações de inseticidas, mesmo daqueles dotados de ação sistêmica. Apesar disso, Curioletti et al. (2018) recomendam a aplicação de clorantraniliprole via tratamento de sementes, seguido por uma aplicação foliar de clorpirifós em até 10 dias após a emergência da cultura. Assim, as plantas da soja são protegidas durante o seu período de maior suscetibilidade ao ataque de M. sojae, que são as três primeiras semanas após a emergência da cultura.

Além da mosca-da-haste, os complexos de percevejos e mosca-branca representam duas espécies de sugadores que tem desafiado os produtores na soja safrinha, ocorrendo de forma simultânea principalmente durante a fase de enchimento de grãos. Os percevejos migram com facilidade de uma lavoura para a outra em busca de alimento. Esses insetos causam danos expressivos que resultam no aborto de vagens e grãos, redução da qualidade, do peso de grãos e da produtividade final (Figura 2). Segundo Triunfo (2020), um percevejo por metro quadrado acarreta em uma redução de 49 a 120 kg de grãos/ha. Essa variação de dano por área depende da espécie de percevejo, do clima, fase da cultura, cultivar de soja e seu potencial de produtividade.

Figura 2 – Percevejo-marrom (Euschistus heros) em soja (esquerda) e danos nos grãos ocasionados pela sua alimentação (direita).

Fonte: Embrapa e Bayer. Confira a imagem original Clicando aqui

A mosca-branca Bemisia tabaci (Figura 3) é considerada a segunda praga invasiva de maior importância mundial (WILLIS, 2017). Além disso, seu potencial médio de redução na produtividade da soja é de 22% (VIEIRA et al., 2013). Logo, também é um alvo forte a ser combatido na safrinha de soja, visto que as ninfas e adultos de mosca-branca causam danos diretos (sucção da seiva) e indiretos (transmissão de vírus fitopatogênicos). Além disso, durante seu processo de alimentação a mosca-branca libera nas folhas uma excreção açucarada denominada honeydew, que favorece a formação da fumagina e afeta a capacidade fotossintética da planta. Para saber mais sobre esse tipo de dano, clique aqui.

Figura 3 – Adulto (esquerda) e ninfa (direita) de mosca branca (Bemisia tabaci) em folha de soja.

Fonte: Arnemann et al. (2019). Confira a imagem original clicando aqui

Por último, mas não menos importante, os ácaros e tripes (Figura 4) podem ocorrer em grandes proporções na soja safrinha. Porém, essas espécies são dependentes do clima favorável para aumentar suas pressões populacionais: períodos secos são determinantes para presença de ácaros e tripes e sua multiplicação nas lavouras de soja. O potencial médio de redução na produtividade da soja devido ao ataque do ácaro-rajado (Tetranychus urticae) e outros ácaros da família Tetranychidae é de 20% (ARNEMANN et al., 2018). Já para tripes, as perdas variam de 10 a 25% na produtividade da soja (GUMANDI et. al. 2005). Ainda, segundo Padilha et al. (2020) a densidade populacional de um ácaro-rajado por cm2 de área foliar acarreta numa redução de produtividade de 0,35 g de grãos por planta, ou 42 kg de grãos por hectare.

Figura 4 – Tripes adulto (Frankliniella schultzei) à esquerda e ácaro rajado adulto (Tetranychus urticae) à direita.

Fonte: Embrapa Soja. Confira a imagem original clicando aqui

Portanto, essas são as principais pragas que acometem o cultivo de soja safrinha, sendo necessário um cuidado especial para evitar altas infestações e perdas na produtividade de grãos. Em geral, há uma grande dificuldade de adotar-se um manejo integrado de pragas (MIP) no cultivo de soja safrinha, pelo fato do estabelecimento da lavoura ocorrer concomitantemente ao período de maior pressão populacional das pragas, por conta de sua multiplicação no período do verão.

Além disso, o uso excessivo de inseticidas químicos no sistema soja sobre soja, sem preconizar a rotação de modos de ação, pode favorecer o surgimento de populações resistentes de insetos. Como a soja safrinha está sujeita a uma maior pressão populacional de pragas, em uma área menor de cultivo em relação à safra normal e com um período mais rápido de desenvolvimento, torna-se necessário monitorar as lavouras com maior frequência e rigor, buscando assim evitar perdas de produtividade.

 Elaboração do texto: Rodrigo Krammes e Solange Andressa Figur, estudantes do Curso de Agronomia na UFSM e membros do grupo Manejo e Genética de Pragas – UFSM

Revisão: Henrique Pozebon, Mestrando PPGAgro  e Prof. Jonas Arnemann, PhD. e Coordenador do Grupo de Manejo e Genética de Pragas – UFSM

Foto de capa: Grupo de Manejo e Genética de Pragas (UFSM) e Vitorio et al. (2019).



REFERÊNCIAS: 

Arnemann J.A. Mosca-da-haste: a larva e seus danos. Mais Soja. 31 de out. de 2020. Disponível em https://www.youtube.com/watch?v=uNhCj4w1usg

ARNEMANN, J. A. et al. Assessment of damage caused by the spider mite Mononychellus planki (McGregor) on soybean cultivars in South America. Australian Journal of Crop Science, Brisbane, v. 12, p. 1989-1996, 2018.

CURIOLETTI, L. E., ARNEMANN, J. A., MURARO, D. S., MELO, A. A., PERINI, C. R., CAVALLIN, L. A., GUEDES, J. V. C. Primeiras descobertas sobre o controle da mosca-do-caule da soja (SSF) Melanagromyza sojae na América do Sul. Australian Journal of Crop Science. Disponível em https://www.researchgate.net/publication/325391265_First_insights_of_soybean_stem_fly_SSF_Melanagromyza_sojae_control_in_South_America

Gamundi, J.C.; Perotti, E. Evaluación de daño de Frankliniella schultzei (Trybom) y Caliothrips phaseoli (Hood) en diferentes es- tados fenológicos del cultivo de soja. INTA EEA Oliveros – Para mejorar la produccion. 42, 2005. Disponível em https://inta.gob.ar/sites/default/files/script-tmp-evaluacion_daos_en_soja.pdf

PADILHA, G. et al. Damage assessment and economic injury level of the two-spotted
spider mite Tetranychus urticae in soybean. Pesquisa Agropecuária Brasileira, v.55, e01836, 2020. https://doi.org/10.1590/S1678-3921.pab2020.v55.01836

Pozebon H. et al. Arthropod invasions versus soybean production in Brazil: a review. Journal of Economic Entomology, v. 113, n. 4, p. 1591–1608, 2020.

TALEKAR, N. S. Characteristics of Melanagromyza sojae (Diptera: Agromyzidae) damage in soybean. Journal of Economic Entomology, v. 82, p. 584-588, 1989.

Triunfo S. Percevejo pode provocar perda de até 30% na cultura da soja. Sementes Triunfo. 20 de março de 2020. Disponível em https://triunfosementes.com.br/2020/03/20/percevejo-pode-provocar-perda-de-ate-30-na-cultura-da-soja/

VIEIRA S. S. et al. Different timing of whitefly control and soybean yield. Ciência Rural, Santa Maria, v. 43, p. 247-253, 2013.

VITORIO, L. et al. First record of the soybean stem fly Melanagromyza sojae (Diptera: Agromyzidae) in Bolivia. Genetics and Molecular Research, v. 18, gmr18222, 2019.

Willis KJ. Estado das plantas do mundo. Royal Botanic Gardens, Kew (2017). Disponível em: https://issuu.com/fernandoruz/docs/sotwp_2017

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