Pesticidas aprovados no Brasil e utilizados pelos agricultores brasileiros não estão proibidos em outros países. Entenda esse assunto com a gente.
Mesmo com processos de avaliação rigorosos e totalmente embasados na ciência, os pesticidas ainda são alvo de questionamentos sobre sua segurança. No Brasil, onde o controle de pragas e doenças é mais desafiador, por conta do clima predominantemente tropical e tamanho da agricultura, com frequência, o país é acusado de utilizar defensivos proibidos em outros países.
Uma prova disso é que muito provavelmente a frase “o Brasil aprova agrotóxicos que são banidos em outros países” já foi lida ou escutada por você. Mas será que essa afirmação está correta?
Para esclarecer o tema, o estudo “Aprovações e Proibições de agrotóxicos em diferentes países” divulgado pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) comparou ingredientes ativos (IAs) registrados no Brasil para uso como agrotóxicos com a sua situação regulatória na União Europeia, Estados Unidos, Austrália, Japão e Canadá. Em todos os casos, os autores utilizaram informações divulgadas pelos órgãos reguladores de cada país.
Dados da Anvisa e Agrofit do MAPA foram utilizados para o Brasil; enquanto para a União Europeia foram considerados os dados da Database Pesticides da Agência de Segurança Alimentar Europeia (EFSA); a Pesticides Research da Agência de Proteção Ambiental para os Estados Unidos; a Australian Pesticides and Veterinary Medicines Authority (APVMA) foi a fonte australiana consultada; assim como a Food and Agricultural Materials Inspection Center (FAMIC) para o Japão e a Health Canada para o Canadá.
Cada país tem os seus desafios agrícolas
A afirmação de que o Brasil aprova pesticidas proibidos em outros países é falsa. Ela desconsidera o porquê de um produto não estar em uso em um determinado país ou bloco econômico.
Afinal, as condições agrícolas em relação à flora, fauna e clima em diferentes países resultam em grande variedade de insetos/pragas, plantas daninhas e doenças que afetam as lavouras. Por isso, o controle eficaz somente é possível com produtos especialmente desenvolvidos para esse fim.
O fato de um produto para proteção de culturas não ser registrado em algum país, de maneira alguma determina a sua segurança e sim a necessidade e as condições agronômicas específicas de cada região. Os tipos de cultura também são completamente diferentes entre uma região e outra.
Enquanto o Brasil é o maior produtor de soja do mundo, na União Europeia, por exemplo, a cultura é inexpressiva. Se considerarmos que, durante todo o ciclo da soja, a cultura está sujeita ao ataque de diferentes pragas, concluímos que a demanda brasileira por uma grande diversificação de produtos é alta.
Mas, além das diferenças nos desafios agrícolas de cada região do mundo, mesmo havendo um elevado alinhamento técnico sobre os processos de avaliação de risco de cada produto, existem diferenças administrativas nas agências reguladoras que levam a interpretações distintas sobre uma substância “não aprovada/não autorizada” ou banida.
Por isso, antes de se afirmar, é preciso checar o real status regulatório de um ingrediente ativo seja ele para uso agronômico ou não.
Grande parte da confusão deriva da própria aplicação nasceu da legislação europeia
Para entender melhor sobre a polêmica da “proibição dos pesticidas” precisamos compreender o atual sistema regulatório do bloco Europeu. Temos no centro dessa questão a Diretiva nº 414, de 15 de julho de 1991 que determinou a necessidade de que todos os ingredientes ativos, utilizados em diferentes países do bloco, fossem submetidos a uma nova avaliação em um período de 12 anos.
Até que o prazo fosse cumprido, essas moléculas poderiam continuar sendo utilizadas desde que tivessem sido submetidas a EFSA (Autoridade Europeia para a Segurança Alimentar) órgão responsável pela aprovação de pesticidas.
Com isso, foi construído um banco com aproximadamente 900 ingredientes ativos para avaliação futura. Apenas após essa avaliação os compostos poderiam ser considerados “aprovado” pela UE.
Contudo, nem todas as moléculas chegaram a ser avaliadas pela EFSA e após o prazo de 12 anos passaram a ser consideradas “não aprovadas”. Como resultado, 520 ingredientes ativos (IAs) foram denominadas como não aprovadas, o que é erroneamente interpretado como “banido”. Portanto, não aprovação não está relacionada com risco de toxicidade ou exigências regulatórias.
O que de fato aconteceu com os 520 IAs retirados do mercado europeu não foi um “banimento” mas sim uma falta de investimento no processo de reavaliação desses IAs para adequação na Diretiva n° 414. Ou seja, na maioria dos casos não se pode dizer nem que esses produtos “não foram aprovados” ou “banidos” uma vez que eles nunca passaram por uma nova avaliação.
A não aprovação de um IA não está, necessariamente, relacionada a risco de toxicidade
Ao contrário do que se propaga, na maioria das situações a “não aprovação” refere-se a substâncias:
- Nunca avaliadas pelas autoridades governamentais de um país;
- Que não tiveram pedidos para renovação ou registro;
- Que tiveram seu cancelamento por ausência de pagamentos de taxas para manutenção de registro.
É importante ter conhecimento de que cada país tem suas próprias legislações, essas determinam os processos pelos quais cada tecnologia deve passar. Por isso, afirmações tão generalistas como a de que o Brasil aprova moléculas químicas proibidas em outros países não podem ser prontamente aceitas.
Qual a situação da segurança alimentar?
Quantos IAs estão registrados no Brasil?
Em nossas casas sempre queremos aquela tecnologia mais nova, o último lançamento, certo? Pois bem, no Brasil existem 279 ingredientes ativos registrados para uso na agricultura e a maioria vem sendo utilizada a mais de 20 anos. É esperado que o registro de moléculas antigas não seja renovado, mas o motivo não é falta de segurança e sim questões como:
- Perda de eficácia;
- Entrada de novas moléculas;
- Dinâmica de mercado de custos de matérias primas;
- Ausência de fabricantes;
GHS – Nova classificação toxicológica dos defensivos agrícolas
Os IAs registrados no Brasil são utilizados em outros países?
Ao contrário do que muitos dizem, os IAs registrados no Brasil também foram aprovados e são utilizados por agricultores de outros países. Isso pode ser visto quando analisamos a situação (registrado ou não registrado) dos 279 IAs em uso no Brasil em relação aos Estados Unidos, Canadá, Austrália, Japão e União Europeia. Apenas 1 substância não está registrada em nenhum dos outros países mencionados.
Quando olhamos para os IAs aprovados simultaneamente em mais de um país, verificamos que dos 279 IAs registrados no Brasil apenas 111 IAs não possuem registro nos Estados Unidos, União Europeia e Canadá. Já, 42 IAs não são aprovados na União Europeia e nos Estados Unidos.
Entretanto, os mesmos ingredientes ativos possuem registros na Austrália, Canadá ou Japão. Na figura abaixo é possível observar o número de IAs que não estão registrados em mais de um país – quantidade representada pelos números nas intersecções.
A situação (ausência de aprovação em mais de um país) mostra que a não simultaneidade de registros de pesticidas é algo comum e decorrente da necessidade de cada país ter uma certa tecnologia registrada. Como mencionamos antes, por que aprovar um pesticida utilizado para controle de uma praga de soja em um país que não cultiva soja?
Na análise de substâncias aprovadas, dos 279 ingredientes ativos registrados no Brasil em cada um desses países, 228 que também estão aprovados na Austrália, 218 nos Estados Unidos e Canadá, 205 no Japão e 136 na União Europeia.
Afinal, quantos são os produtos proibidos pela União Europeia que usamos no Brasil?
Para ficar claro que as substâncias “não aprovadas” não foram banidas por motivos de perigos toxicológicos , é conveniente verificar os 143 ingredientes ativos que não estão aprovados na União Europeia. Desses, 71% nunca foram avaliados pela EFSA, 17% não tiveram sua avaliação concluída e apenas 11% demonstraram algum tipo de risco para meio ambiente ou para a saúde de trabalhadores e consumidores.
Da mesma forma, existem 90 ingredientes ativos registrados na UE e que não possuem registros em território brasileiro – 77 são substâncias nunca submetidas para registro no país; 9 por ausência de fabricantes e 4 são ingredientes ativos novos. Uma demonstração simples de que a não simultaneidade de registros em todos os países não necessariamente significa uma proibição por riscos à saúde ou ao meio ambiente.
A ausência de registros de pesticidas em um país ou outro não traz conclusões sobre sua segurança
A ausência de registro de um pesticida em um país e o seu registro em outros, não significa necessariamente que aquele ingrediente ativo tenha sido proibido por riscos à saúde ou ao meio ambiente. Ou ainda, que o IA possa ser proibido no Brasil sem passar por um processo de avaliação dos seus riscos.
Cada substância deve ser avaliada caso a caso e de acordo com as legislações nacionais. Ainda assim, as recomendações de uso, culturas agrícolas a que se destina, quantidade e número de aplicações, que variam de acordo com o clima, tipo de solo, tamanho da área, dentre outros fatores, podem levar a diferentes conclusões na avaliação.
O registro de uma substância ativa, para controle de pragas e doenças em plantas, em determinado país ocorre ou deixa de ocorrer por vários motivos que incluem:
- a demanda por tal substância (existência de cultivos e a incidência de alvos biológicos a que se destina),
- o grau de eficácia, as estratégias de mercado (concorrência, disponibilidade de produtos de menor preço, disponibilidade de matérias primas dentre outros) e
- as exigências regulatórias.
Diante disso, é difícil ocorrer a simultaneidade nos registros de substâncias entre países com condições ambientais, climáticas e processos regulatórios tão diversos.
Fonte: CropLife Brasil
Principal fonte:
Da Silva, L. R., Rembichevisk, P. e Rangel, L. E. Aprovações e Proibições de agrotóxicos em diferentes países. Disponível em: https://www.gov.br/agricultura/pt-br/arquivos/aprov-proib-agts-comp-paises.pdf/. Acesso em: 14/06/2022
quem é que vai comentar???
Afinal o agro é pop