O glifosato é um dos herbicidas mais utilizados no manejo e controle de plantas daninhas em soja, especialmente em cultivares consideradas tolerantes (Roundup Ready – RR), em que é possível utilizar o glifosato na pós-emergência da cultura. Sobretudo, embora apresente grande aptidão para uso na cultura da soja, dependendo das condições de ambiente, manejo e cultivar, o glifosato pode desencadear alguns efeitos indesejados na soja, afetando características fisiológicas da planta como a nodulação.
A boa nodulação da soja é indispensável para a obtenção de altas produtividades. Através da fixação biológica de nitrogênio (FBN) que ocorre nos nódulos das raízes, todo o nitrogênio requerido pela soja para boas produtividades é fornecido para a cultura, por meio da simbiose que ocorre entre planta e bactérias fixadoras de nitrogênio.
Visando altas produtividades, o ideal é que durante o período de V3 – V4 a planta de soja apresente pelo menos 10 nódulos viáveis, com tamanho igual ou superior a 2 mm (Hungria & Nogueira, 2020). Quando a soja atingir o período do florescimento, a soja deve apresentar de 15 e 30 nódulos viáveis para que sua exigência de nitrogênio seja suprida.
Figura 1. Raiz de soja nodulada (A) e corte de nódulo (B), mostrando a coloração rósea interna indicativa de atividade da nitrogenase, pela presença de leg-hemoglobina funcional.

Glifosato e a nodulação da soja
A influência do glifosato na nodulação da soja tem sido analisada por diversos estudos ao longo dos anos, principalmente após a difusão do glifosato como ferramenta de manejo na pós-emergência da cultura. Analisando os efeitos causados pelas aplicações de glifosato sobre 20 cultivares de soja RR, Oliveira Junior et al. (2008) observaram diferenças significativas, expressando redução do número de nódulos em função da utilização do glifosato em diferentes modalidade de aplicação (tabela 1), mas com variação de acordo com a cultivar.
Tabela 1. Modalidades de aplicação com glifosato, doses (kg e.a. ha-1), épocas de aplicação e estádios de desenvolvimento da soja.

Os resultados apresentados pelos autores indicam que a resposta da soja ao glifosato, no que se refere à nodulação, depende diretamente do nível de tolerância de cada cultivar. Observou-se que determinados grupos de cultivares mais sensíveis apresentaram maior redução no número de nódulos quando submetidos à aplicação única em dose menor, em comparação aos demais grupos. Em aplicações sequenciais com dose mais elevada, esse mesmo conjunto de cultivares sensíveis, ampliado por outras que também demonstraram baixa tolerância, novamente exibiu as maiores reduções na nodulação.
Já na aplicação única em dose maior, as cultivares se distribuíram em três grupos distintos: um grupo mais afetado, um grupo intermediário (que apresentou redução moderada no número de nódulos) e um grupo menos afetado. Esses resultados evidenciam que a interferência do glifosato na nodulação da soja não é uniforme, variando conforme o grupo de cultivares e seu respectivo nível de tolerância ao herbicida (Oliveira Junior et al., 2008).
Quadro 1. Produção relativa de número de nódulos (NN) em 20 variedades de soja RR, em função de cinco modalidades de aplicação com glifosato.

De acordo com Oliveira Junior et al. (2008), todas as doses e modalidades de aplicação de glifosato causaram redução em todas as variáveis avaliadas (incluindo nodulação), quando comparado a testemunha, além disso, os autores destacam que os efeitos do glifosato sobre a soja RR são dependentes de fatores como variedade, grupo de maturação, época de aplicação e dose. Estudos mais recentes corroboram o observado por Oliveira Junior et al. (2008). Conforme observado por Ferreira et al. (2022), sob determinadas condições, a aplicação de glifosato pode reduzir a nodulação da soja.
Dentre as principais hipóteses relacionadas a causa, destacam-se a relação da nodulação com o fitormônio etileno. A molécula do glifosato inibi a enzima 5-enolpiruvilshiquimato-3-fosfato sintase (EPSPS), a qual é catalisadora das reações de síntese dos aminoácidos aromáticos fenilalanina, tirosina e triptofano. No entanto, além de inibição direta dessa enzima, essa molécula também atua influenciando o metabolismo vegetal, em processos, como a inibição da síntese de clorofila, estimula a produção de etileno, reduz a síntese de proteínas e o aumento da concentração do ácido indol-acético (IAA), prejudiciais ao crescimento e sobrevivência da planta (Gazziero et al., 2016).
Em plantas tolerantes como a soja RR, essa interferência no metabolismo não é suficiente para levar a planta à morte, entretanto, efeitos adversos podem ser observados, sendo um deles, a redução da nodulação em cultivares consideradas mais sensíveis. Tal fato decorre em função da produção endógena de etileno, que pode prejudicar a nodulação da soja, contudo, em alguns casos, a inibição da nodulação por etileno, pode ser compensada pela produção de rizobiotoxina por Bradyrhizobium elkanii. Tal mecanismo de limitação da produção de etileno não é conhecido em outras espécies de rizóbios, logo, plantas de soja inoculadas com estirpes de B. japonicum podem ter sua nodulação mais afetada do que as inoculadas com estirpes de B. elkanii (Mattos et al., 2019).
Nesse contexto, além do adequado posicionamento de herbicidas em soja, definir as bactérias fixadoras de nitrogênio que irão compor a inoculação da soja, bem como a coinoculação, são estratégias de manejo que podem mitigar os efeitos do glifosato na nodulação da soja. De forma conjunta, a adubação da cultura com micronutrientes essenciais para a FBN como Cobalto e Molibdênio pode contribuir para uma melhor e mais eficiente nodulação das plantas.
Em síntese, dependendo da cultivar, a aplicação de glifosato pode estimular a planta a elevar a produção de etileno, prejudicando a nodulação da soja, e consequentemente afetando o número de nódulos viáveis da FBN. Sobretudo, vale destacar que essa condição não é uniforme e depende da cultivar.
FERREIRA, M. M. et al. GM SOYBEAN NODULATION AND YIELD IN RESPONSE TO GLYFOSATE APPLICATIONS AND CO-INOCULATION. Rev. Bras. Cienc. Agrar. 2022. Disponível em: < https://agraria.pro.br/ojs32/index.php/RBCA/article/view/v17i4a2623/1493 >, acesso em: 03/12/2025.
GAZZIERO, D. L. P. et al. A ERA GLYPHOSATE: AGRICULTURA, MEIO AMBIENTE E HOMEM. CAP. 1, “A MOLÉCULA DE GLYPHOSATE”, 2016. Disponível em: < https://www.alice.cnptia.embrapa.br/alice/handle/doc/1048102 >, acesso em: 03/12/2025.
HUNGRIA, M.; NOGUEIRA, M. A. FIXAÇÃO BIOLÓGICA DE NITROGÊNIO. Tecnologias de Produção de Soja, sistemas de produção, 17, cap. 8. Embrapa Soja, Londrina – PR, 2020. Disponível em: < https://www.infoteca.cnptia.embrapa.br/infoteca/bitstream/doc/1123928/1/SP-17-2020-online-1.pdf >, acesso em: 03/12/2025.
HUNGRIA, M.; NOGUEIRA, M. A. FIXAÇÃO BIOLÓGICA DO NITROGÊNIO. Bioinsumos na cultura da soja, cap. 8. Embrapa, 2022. Disponível em: < https://www.embrapa.br/en/busca-de-publicacoes/-/publicacao/1143066/bioinsumos-na-cultura-da-soja >, acesso em: 03/12/2025.
OLIVEIRA JUNIOR, R. S. INFLUÊNCIA DO GLYPHOSATE SOBRE A NODULAÇÃO E O CRESCIMENTO DE CULTIVARES DE SOJA RESISTENTE AO GLYPHOSATE. Planta Daninha, 2008. Disponível em: < https://www.scielo.br/j/pd/a/ZTqTNsSGh6fsfycyyTBjhJN/?format=pdf&lang=pt >, acesso em: 03/12/2025.





