Por Luís Eduardo Pacifici Rangel, membro do Conselho Científico Agro Sustentável (CCAS), Engenheiro Agrônomo, Ex-Secretário de Defesa Agropecuária e Ex-Diretor de Análise Econômica e Políticas Públicas do MAPA

Por muito tempo, o Brasil foi retratado como vilão ambiental. Mas os dados contam outra história. Uma história de avanço técnico, inovação tropical e eficiência sustentável. A pergunta que fica é: vamos continuar deixando que os outros escrevam nossa narrativa?

Uma transformação silenciosa, mas radical

Entre 1990 e 2021, enquanto o mundo falava de sustentabilidade, a agropecuária brasileira produziu mais, emitiu menos e usou melhor seus recursos. Não é discurso: é evidência empírica. Estudamos o setor sob a base da Produtividade Total dos Fatores (PTF), um indicador que mede o quanto conseguimos produzir com a combinação de terra, trabalho e capital. E o mais impressionante: quando ajustamos essa produtividade pelas emissões de gases de efeito estufa (GEE), a performance brasileira continua acima da média de países como Estados Unidos e França.

Isso significa que não só estamos produzindo mais — estamos produzindo melhor, com menor impacto ambiental por tonelada gerada.

O tal “desacoplamento” que poucos conseguiram

Você já ouviu falar no termo “desacoplamento”? É quando a produção econômica cresce, mas as emissões não acompanham esse crescimento. É isso que o Brasil começou a fazer de forma clara depois do Acordo de Paris (2015). Antes disso, para cada ponto que a PTF crescia, as emissões cresciam 1,47 vezes. Depois do Acordo, essa relação caiu para 0,74. Ou seja: dobramos a eficiência ambiental relativa da produção.

E tem mais: o índice que usamos para medir isso “Malmquist-Luenberger (GML)”, mostra que somos mais sustentáveis tecnicamente do que grandes potências agroexportadoras. Isso porque o GML considera tanto o que se produz (output desejado) quanto o que se emite (output indesejado). E o Brasil se destacou mesmo quando consideramos uso de fertilizantes, defensivos, capital, terra e trabalho.

Sustentabilidade real: muito além da propaganda

Desenvolvemos uma nova hipótese para medir a sustentabilidade ampla: o Índice Global de Sustentabilidade (IGS), que mede o equilíbrio entre as dimensões econômica, social e ambiental. Ele mostra que o Brasil está em um grupo de desempenho médio-alto — atrás de poucos, à frente de muitos. O curioso é que países com altíssimo desempenho ambiental, como a França, têm produtividade abaixo da média. Já os EUA e a Austrália seguem com alta intensidade de emissões, ainda que com avanços tecnológicos.

A lição? Ser verde de verdade significa encontrar o ponto de equilíbrio. Não adianta ser tecnicamente eficiente e socialmente excludente. Tampouco adianta preservar floresta e importar alimentos de alta emissão. O Brasil, com todos os seus desafios, construiu um caminho próprio, baseado em tecnologia tropical, políticas públicas (como o Plano ABC e o novo indicador PTF/GEE do PPA 2024–2027) e ciência aplicada ao campo.

Medir, comparar, agir: o segredo está nos indicadores

Sabe por que muita gente ainda não valoriza o que o Brasil está fazendo? Porque não conhece os indicadores certos. Quando usamos métricas padronizadas e comparáveis internacionalmente, como os índices GML e IGS, a verdade aparece. E ela diz que a agropecuária brasileira é uma das que mais evoluíram em sustentabilidade técnica nas últimas décadas.

Esses dados vêm de fontes robustas como FAOSTAT, UNFCCC, USDA e Banco Mundial. O modelo usado no estudo é baseado em z-score, regressões e PCA (análise de componentes principais), tudo com base científica. Não é opinião: é ciência aplicada à política agrícola.

Mas o quebra-cabeça não está completo

Apesar de todo esse avanço, a dimensão social continua sendo o calcanhar de Aquiles. A modernização reduziu a participação da agricultura no emprego total e aumentou a informalidade e a exclusão de pequenos produtores. A produtividade da terra em propriedades familiares é alta, mas a PTF ainda é baixa por falta de acesso a capital, tecnologia e mercados.

Sem resolver isso, não há sustentabilidade verdadeira. O caminho passa por diversificação produtiva, assistência técnica, crédito orientado à transição e políticas territoriais diferenciadas.

E agora? Escalar, integrar e comunicar

Se já sabemos fazer, por que ainda não estamos liderando a agenda global? Porque falta transformar tudo isso em política integrada. Os dados precisam virar instrumento de crédito, rastreabilidade, certificação e reputação.

A proposta é clara:

  • Usar a razão PTF/GEE como métrica de performance para concessão de crédito agrícola.
  • Valorizar boas práticas com diferenciação fiscal e acesso a novos mercados.
  • Estimular a medição contínua da saúde do solo, como com o BioAS da Embrapa.
  • Criar um selo nacional de sustentabilidade agropecuária, com base nos indicadores reais.

Provocações finais

Se já estamos acima da média mundial em eficiência sustentável, por que ainda exportamos commodities como se fôssemos básicos?

Se a PTF ajustada às emissões já é política pública oficial, por que o consumidor brasileiro ainda não sabe disso?

Se nossos dados são mais robustos que os de muitos países da OCDE, por que deixamos que nos rotulem com base em percepções, não evidências?

Conclusão: o agro brasileiro precisa se reconhecer — e se posicionar

A evolução da agropecuária brasileira rumo à sustentabilidade é uma realidade medida, analisada e comprovada. O Brasil já tem os fundamentos para ser não só um celeiro do mundo, mas o celeiro mais sustentável entre as grandes potências agroalimentares.

A hora agora é de comunicar, integrar e transformar essa vantagem técnica em valor econômico, reputacional e político. Não basta ser sustentável. É preciso mostrar, medir e monetizar isso. Afinal, o futuro da agropecuária será verde — e o Brasil já saiu na frente.

Sobre o CCAS

O Conselho Científico Agro Sustentável (CCAS) é uma organização da Sociedade Civil, criada em 15 de abril de 2011, com domicilio, sede e foro no município de São Paulo (SP), com o objetivo precípuo de discutir temas relacionados à sustentabilidade da agricultura e se posicionar, de maneira clara, sobre o assunto.

O CCAS é uma entidade privada, de natureza associativa, sem fins econômicos, pautando suas ações na imparcialidade, ética e transparência, sempre valorizando o conhecimento científico.

Os associados do CCAS são profissionais de diferentes formações e áreas de atuação, tanto na área pública quanto privada, que comungam o objetivo comum de pugnar pela sustentabilidade da agricultura brasileira. São profissionais que se destacam por suas atividades técnico-científicas e que se dispõem a apresentar fatos, lastreados em verdades científicas, para comprovar a sustentabilidade das atividades agrícolas.

A agricultura, por sua importância fundamental para o país e para cada cidadão, tem sua reputação e imagem em construção, alternando percepções positivas e negativas. É preciso que professores, pesquisadores e especialistas no tema apresentem e discutam suas teses, estudos e opiniões, para melhor informação da sociedade. Não podemos deixar de lembrar que a evolução da civilização só foi possível devido à agricultura. É importante que todo o conhecimento acumulado nas Universidades e Instituições de Pesquisa, assim como a larga experiência dos agricultores, seja colocado à disposição da população, para que a realidade da agricultura, em especial seu caráter de sustentabilidade, transpareça. Mais informações no website: Link. Acompanhe também o CCAS nas redes sociais:

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Fonte: Assessoria de Imprensa CCAS



 

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