A cigarrinha-do-milho está presente em todas as regiões agrícolas do Brasil, visto que o milho é cultivado ao longo de todo o ano em diferentes épocas e regiões do país (seja em safra ou safrinha) e a praga possui capacidade de migração a longas distâncias. O impacto direto desse inseto sugador é baixíssimo; porém, quando as cigarrinhas se tornam infecciosas e capazes de atuar como vetores de doenças, passam a ser uma das pragas mais importantes na cultura do milho.
À medida que o inverno fica menos rigoroso, a semeadura do milho inicia-se no sul do Brasil (fim de julho/início de agosto), visando uma colheita antecipada e a semeadura subseqüente da soja safrinha em meados de janeiro. Da mesma forma, a colonização das cigarrinhas se reinicia, atingindo seu pico em torno de 77 dias após a emergência do milho, sendo favorecida por temperaturas elevadas e invernos amenos (Meneses et. al., 2016).
Somado a essa questão, a presença de plantas voluntárias (milho guaxo ou tiguera) favorece a sobrevivência da cigarrinha durante o inverno e períodos de entressafra, visto que serve de refúgio para a praga após a colheita da cultura. Além disso, o inseto migra das lavouras mais velhas para as mais novas, aumentando sua população de forma exponencial, atacando desde campos recém germinados até lavouras em fase de florescimento (Portal Syngenta, 2018).
As cigarrinhas alimentam-se da seiva das plantas de milho e realizam a oviposição sob a epiderme da folha, especialmente na nervura central de folhas do cartucho (Figura 1) (Embrapa, 2018).
Figura 1. Adultos de cigarrinha no interior do cartucho da planta de milho.
Fonte: Aristides Garcia.
Ao se alimentar de uma planta de milho contaminada com o complexo de enfezamento, o inseto adquire o(s) patógeno(s), que se alojam nas suas glândulas salivares e tornam-no um agente infeccioso, capaz de infectar outras plantas sadias. A cigarrinha é o único inseto-vetor dos molicutes espiroplasma e fitoplasma, ocasionando o enfezamento-pálido e o enfezamento-vermelho, respectivamente. Os danos decorrentes do complexo de enfezamento podem ocasionar reduções de 70 % ou mais na produtividade da cultura, dependendo da suscetibilidade da cultivar e do estágio em que a planta foi infectada (Sabato et al., 2016).
Geralmente, os sintomas de enfezamento aparecem no período de enchimento de grãos do milho, embora a infecção com molicutes ocorra nos estágios iniciais da cultura (Castelões, 2017). Ainda, a praga pode transmitir o chamado vírus-da-risca do milho (MRFV), com sintomas de pontos cloróticos que se fundem formando riscos finos (Figura 2) (Waquil, 2004).
Figura 2. Da esquerda para a direita: sintomas do vírus da risca, enfezamento-pálido e enfezamento-vermelho.
Fonte: Epagri. Imagem original disponível clicando aqui
Essas doenças causam desordens fisiológicas no comportamento das plantas de milho, ocasionando multiespigamento, perfilhamento, senecência prematura, redução de porte, grãos chochos e tombamento de plantas. Como efeito secundário aos molicutes, a planta fica mais suscetível à infecção de fungos oportunistas do solo, como Pythium e Fusarium.
É importante lembrar que esse inseto se alimenta e se reproduz somente na cultura do milho, embora possa se abrigar em algumas espécies da família Poaceae (gramíneas) na ausência de milho. Ainda, conforme estudos de Oliveira et. al. (2002), a cigarrinha é capaz de migrar por longas distâncias. Desse modo, para sobreviver no inverno do Sul do Brasil, a mesma possui como alternativa se abrigar em plantas guaxas de milho ou migrar para regiões mais quentes.
Uma situação que agrava a disseminação e ocorrência do enfezamento é que indivíduos de cigarrinha infectados pelos molicutes apresentam maior capacidade de sobrevivência em comparação aos não-infectados, mesmo em condições de temperaturas baixas. Logo, a infecção do inseto pelos molicutes torna-o mais tolerante às condições climáticas adversas que predominam durante a entressafra, possibilitando a sua sobrevivência e a ocorrência de infestações da praga na safra subseqüente (Ebbert & Nault, 1994).
Portanto, é necessário mitigar os riscos, visto que a cigarrinha-do-milho sobrevive no inverno e pode atacar a cultura do milho logo no seu estabelecimento. Estratégias em conjunto devem ser tomadas, como a eliminação de milho tiguera, utilização de materiais tolerantes, manejos químico e biológico, e controle regional por parte dos produtores.
Revisão: Henrique Pozebon, Mestrando PPGAgro e Prof. Jonas Arnemann, PhD. e Coordenador do Grupo de Manejo e Genética de Pragas – UFSM
REFERÊNCIAS:
Castelões L. Enfezamento do milho aparece como problema nesta safra. Embrapa. 2017. Disponível em https://www.embrapa.br/en/busca-de-noticias/-/noticia/21567441/enfezamento-do-milho-aparece-como-problema-nesta-safra
Ebbert M.A., Nault L.R. Improved Overwintering Ability in Dalbulus maidis (Homoptera: Cicadellidae) Vectors Infected with Spiroplasma kunkelii (Mycoplasmatales: Spiroplasmataceae). Environmental Entomology. Volume 23. 1994. Disponível em https://academic.oup.com/ee/article-abstract/23/3/634/417953?redirectedFrom=fulltext
Embrapa. Controle da cigarrinha do milho: Enfezamentos por molicutes e cigarrinha no milho. Embrapa: corn leafhopper control. 2018. Disponível em https://www.embrapa.br/en/controle-da-cigarrinha-do-milho
Meneses A.R., Querino R.B., Oliveira C.M, Maia A.H.N., Silva P.R.R. Seasonal and Vertical Distribution of Dalbulus maidis (Hemiptera: Cicadellidae) in Brazilian Corn Fields. Florida Entomologist. Volume 99, No, 4. 2016. Disponível em https://ainfo.cnptia.embrapa.br/digital/bitstream/item/153786/1/Dalbulus-maidis-Seasonal-and-Vertical-Distribution-Menezes-et-al.-2016.pdf
Oliveira C.M., Molina R., Albres R., Lopes J.R.S. Disseminação de molicutes do milho a longas distancias por Dalbulus maidis (Hemiptera: Cicadellidae). Fitopatologia Brasileira. 2002. Disponível em https://www.scielo.br/pdf/fb/v27n1/8475.pdf
Portal Syngenta. Cigarrinha-do-milho: dicas para controlar a praga na lavoura. Syngenta Brasil. 2018. Disponível em https://portalsyngenta.com.br/noticias-do-campo/cigarrinha-do-milho-dicas-para-controlar-a-praga-na-lavoura
Sabato E.O., Barros A.C.S., Oliveira I.R. Cenário e Manejo de Doenças Disseminadas pela Cigarrinha no Milho. Embrapa Milho e Sorgo. Cartilha. Sete Lagoas, MG. 2016. Disponível em https://ainfo.cnptia.embrapa.br/digital/bitstream/item/152185/1/Cenario-manejo-1.pdf
Waquil J.M. Cigarrinha-do-milho: vetor de molicutes e vírus. Embrapa Milho e Sorgo-Circular Técnica. 2004. Disponível em: https://www.embrapa.br/documents/1344498/2767891/cigarrinha-do-milho-vetor-de-molicutes-e-virus.pdf/17d847e1-e4f1-4000-9d4f-7b7a0c720fd0
Foto de capa: Fonte: Embrapa Milho e Sorgo – Foto: Elizabeth de Oliveira Sabato.