Inseticidas são ferramentas essenciais na proteção de culturas agrícolas, inclusive da soja. Os ingredientes ativos disponíveis atualmente são classificados pelo Comitê de Ação contra Resistência a Inseticidas (IRAC) em cerca de 30 grupos diferentes, cada qual apresentando um modo de ação distinto. Inseticidas dotados de novos modos de ação surgem no mercado apenas a cada cinco ou dez anos, denotando a importância de prevenir-se o surgimento de resistência em pragas por meio da rotação de modos de ação nas lavouras.

Além da classificação por modos de ação, os inseticidas podem ser agrupados em quatro grandes categorias, de acordo com o processo biológico que é afetado no inseto: sistema nervoso e muscular, crescimento e desenvolvimento, respiração celular e sistema digestivo. Juntamente com os processos de absorção, distribuição, metabolismo e excreção do inseticida no organismo do inseto, os modos de ação determinam a eficácia de controle dos diferentes ingredientes ativos. Há ainda inseticidas que não se encaixam nessa classificação por atuarem simultaneamente em mais de um sítio, ou cujo sítio de ação ainda é desconhecido.

Esse é o quinto artigo de uma série de textos abordando os diversos grupos químicos de inseticidas e seus distintos modos de ação. Hoje, falaremos sobre as avermectinas e os derivados de piridina, inseticidas neuromusculares pertencentes ao Grupo 6 (moduladores alostéricos dos canais de cloro mediados pelo glutamato) e Grupo 9 (moduladores de canais TRPV dos órgãos cordonotais), respectivamente. Essa classificação é fornecida pelo IRAC, de acordo com o sítio de ação primário de cada inseticida. Para conhecer os inseticidas pertencentes aos grupos 4 (moduladores competitivos dos receptores nicotínicos da acetilcolina) e 5 (moduladores alostéricos dos receptores nicotínicos da acetilcolina), acesse o texto anterior clicando aqui.

No segundo artigo dessa série, vimos como os canais de íons são ativados por moléculas neurotransmissoras e possibilitam o transporte de íons inorgânicos (Na+, K+, Ca2+ e Cl) através das membranas celulares, constituindo a base para geração de bioeletricidade nos processos orgânicos (Figura 1). Os quatro principais neurotransmissores encontrados nos insetos são a acetilcolina, o glutamato, a octopamina e o ácido gama-aminobutírico, ou GABA.

Os canais de cloro, um tipo de canal de íons, possibilitam a entrada de íons de cloro (Cl) na célula pós-sináptica. Como essas partículas são carregadas negativamente, geram um efeito inibitório e interrompem a transmissão dos sinais nervosos, que possuem carga positiva. O processo de inibição dos impulsos elétricos é tão importante para o sistema nervoso dos insetos quanto o processo de excitação: caso não ocorra, o inseto morre por hiper-excitação nervosa; e caso ocorra de forma contínua, o inseto é levado à morte por paralisia.

Figura 1. Canais de íons são ativados por neurotransmissores, conduzindo íons através da membrana plasmática das células.

Fonte: SALGADO, V. L. (2013). Confira a imagem original clicando aqui

Os ciclodienos e fenilpirazois, pertencentes ao Grupo 2 de inseticidas, bloqueiam os canais de cloro mediados pelo GABA, interrompendo o processo de inibição do sinal nervoso e levando o inseto à morte por hiper-excitação nervosa. Já as avermectinas atuam como moduladores nos canais de cloro mediados pelo glutamato, ligando-se a um sítio secundário do canal (ou seja, de forma alostérica) e ativando-os de forma ininterrupta (Figura 2). Lembre-se de que a ativação do canal de cloro tem um efeito inibitório na célula nervosa. Como os canais de cloro mediados pelo glutamato estão espalhados por todos os músculos e células nervosas dos insetos, a sua ativação contínua leva o organismo à morte por paralisia generalizada.

Figura 2. Sítios de ligação dos inseticidas nos canais de íons.

Fonte: SALGADO, V. L. (2013). Confira a imagem original clicando aqui

Semelhantemente às espinosinas (Grupo 5), as avermectinas e as milbemicinas são compostos produzidos naturalmente por bactérias do solo, as actinobactérias. Abamectina, o principal representante desse grupo, foi descoberto em 1985 a partir da fermentação da bactéria Streptomyces avermitilis. É um composto com ação inseticida, acaricida e nematicida, largamente utilizado no controle de ácaros em plantas e carrapatos em animais. Outros ingredientes ativos incluem lepimectina, benzoato de emamectina e milbemectina. Múltiplos mecanismos de resistência à abamectina foram descobertos em populações de ácaro-rajado (Tetranychus urticae), incluindo metabolização enzimática e alteração no sítio de ação.

Embora sejam potencialmente tóxicos para peixes e mamíferos, as avermectinas e milbemicinas apresentam baixa penetração na pele e são formuladas de forma específica para reduzir os riscos de contaminação. São moléculas tóxicas para abelhas, e não devem ser aplicados durante a floração de plantas ou próximo a estas. Por outro lado, são compostos rapidamente absorvidos pelas plantas, e resíduos remanescentes são rapidamente degradados pelos raios UV. Além disso, ligam-se fortemente às partículas do solo, reduzindo os riscos de lixiviação.

Enquanto alguns inseticidas apresentam amplo espectro de ação, outros são altamente seletivos. É o caso dos ingredientes ativos pertencentes ao Grupo 9, que atuam especificamente sobre membros da ordem Hemiptera, como pulgões, cigarrinhas, mosca-branca e outras pragas sugadoras de seiva. Assim, são considerados uma importante alternativa para rotação com os neonicotinoides. Embora seu modo de ação ainda não seja totalmente compreendido, sabe-se que eles atuam nos órgãos cordonotais, estruturais sensoriais espalhadas pelo corpo do inseto que auxiliam na audição, percepção da gravidade e coordenação motora. O efeito gerado no inseto é uma rápida interrupção na alimentação e morte por inanição.

Descobertos na década de 90 como derivados das moléculas piridina e azometina, esses inseticidas podem atuar por contato direto com a praga, translocação no interior da planta ou sistemicidade local, isto é, penetrando no tecido foliar e formando um depósito de ingrediente ativo no seu interior. Os ingredientes ativos pimetrozina e flonicamida são os principais representantes desse grupo. Devido à sua alta seletividade e baixa toxicidade para abelhas e outros insetos benéficos, são inseticidas apropriados para um programa de manejo integrado de pragas (MIP).

Embora os modos de ação sejam distintos, insetos resistentes aos neonicotinoides costumam apresentar resistência cruzada à pimetrozina, já que ambos os compostos podem ser metabolizados pelas enzimas mono-oxigenases do complexo citocromo P450. Por outro lado, não há registro de resistência aos inseticidas do Grupo 9 por alteração no sítio de ação.

Portanto, as avermectinas e os derivados de piridina representam ferramentas indispensáveis no controle de ácaros e sugadores, respectivamente. Na próxima semana, entenderemos o funcionamento do último e mais recente grupo de inseticidas neuromusculares: as diamidas.

A reprodução desse texto, ou partes dele, deve ser precedida de autorização dos autores e acompanhada de citação da seguinte fonte: POZEBON, H.; ARNEMANN, J. A. Como funcionam os inseticidas avermectinas e piridinas? Portal Mais Soja. 2021. Disponível online.

Revisão: Prof. Jonas Arnemann, PhD. e coordenador do Grupo de Manejo e Genética de Pragas – UFSM



REFERÊNCIAS:

SALGADO, V. L. 2013. BASF Insecticide Mode of Action Technical Training Manual. Disponível em:https://agriculture.basf.com/global/assets/en/Crop%20Protection/innovation/BASF_Insecticide_MoA_Manual_2014.pdf

IRAC. 2018. Mode of Action Classification Scheme.
Disponível em: https://www.irac-online.org/documents/moa-structures-poster-english/?ext=pdf

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