O trigo (Triticum aestivum) é o cereal mais cultivado no Brasil como uma opção de cultura de inverno. De acordo com a Companhia Nacional de Abastecimento- CONAB (2023), a área de cultivo para a safra 2022/23 prevê um aumento de 11,1% em comparação com a safra anterior. A contribuição do melhoramento genético foi fundamental para a expansão da cultura do trigo ao longo da história da triticultura brasileira, conforme destacam Guarienti et al. (2022), esse avanço se deu por meio da criação de cultivares com características agronômicas e fitossanitárias e de qualidade tecnológica adequadas aos variados ambientes, sistemas de produção e propósitos de utilização.

A classificação comercial do trigo no Brasil é oficialmente regulamentada pela Instrução Normativa do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento n° 38/2010. Essa normativa estabelece o padrão oficial de classificação, incluindo os requisitos de identidade e qualidade, diretrizes para amostragem, apresentação do produto e orientações sobre marcação ou rotulagem. Por meio dessa regulamentação, são definidos critérios claros e objetivos que garantem a qualidade e uniformidade do trigo comercializado no mercado nacional. A qualidade de grãos e farinhas de cereais é determinada por uma variedade de características que assumem diferentes significados, dependendo da designação de uso ou do tipo de produto (Smanhotto et al. 2006).

Conforme a ABITRIGO (2011), o trigo é o único grão que possui glúten em quantidade expressiva. Neto & Santos (2017), destacam que durante o processo de moagem do grão são obtidos o farelo, o endosperma e o gérmen, os quais são considerados matérias-primas para a indústria. O farelo de trigo é formado pelo pericarpo, que corresponde à camada mais externa e protetora do grão. O endosperma dá origem à farinha de trigo branca propriamente dita, sendo que esta é a parte mais utilizada e conhecida comercialmente. O gérmen que também é obtido durante o processo de moagem, é frequentemente removido durante o processo de extração por conter lipídios que limitam a manutenção da qualidade da farinha.

Tabela 1. Composição química do grão de trigo integral, do farelo, do endosperma e do gérmen (% base seca).

Fonte: Gwirtz et al., 2014 apud. Neto & Santos (2017).

O trigo é classificado em grupos, classes e tipos, os grupos se dividem em dois, sendo que o grupo I refere-se ao trigo destinado diretamente à alimentação humana e o grupo II é destinado à moagem e outras finalidades. As classes de trigo do grupo II, são definidas de acordo com a Força do Glúten ou a Estabilidade e o Número de queda, conforme podemos observar na tabela 2, a seguir.

Tabela 2. Classificação de trigo do Grupo II, destinado à moagem e a outras finalidades.

Fonte: Cunha & Caierão (2023).

A força do glúten, de acordo com Miranda et al. (2009), é expressa em 10-4 J e representa o trabalho de deformação da massa, indicando a qualidade panificativa da farinha (força da farinha). A estabilidade é expressa em minutos e representa a capacidade da massa de tolerar a mistura durante o processo de panificação, estando diretamente relacionada à força da massa. Por outro lado, o número de queda, também conhecido como “falling number”, é obtido por meio do método 56-81B utilizando o equipamento “Falling Number”. Essa medida quantifica a atividade da enzima a-amilase no grão do trigo e é expressa em segundos. Altos valores de número de queda indicam baixa atividade da enzima a-amilase, enquanto baixos valores indicam alta atividade. Farinhas com alta atividade enzimática (NQ < 200s) são propensas a produzir pães com miolo escuro e pegajoso, conforme destaca Miranda et al. (2009).



De acordo com Neto & Santos (2017), os principais usos da farinha de trigo de acordo com a classificação são:  Pães industriais, massas alimentícias secas e biscoitos tipo cracker (classes de trigo Melhorador e Pão); uso doméstico e pães caseiros (classes de trigo Doméstico e Pão); e biscoitos semidoces duros e bolos (classes de trigo Básico e Outros Usos). Na Classe de trigo “Outros Usos” também estão incluídos produtos que não se enquadram nos usos tradicionais, como produção de ração animal e utilização industrial.

A tipificação do trigo do Grupo II é realizada por meio da avaliação de diversos parâmetros importantes que afetam a qualidade do produto. São eles: o peso do hectolitro, o teor de matéria estranha e impureza, os danos causados por insetos, os danos causados por calor, a presença de mofo e grãos ardidos, o teor de grãos chochos, triguilho e quebrados, onde a soma total de defeitos, determina o tipo do trigo.

Tabela 3. Tipificação do trigo do Grupo II, destinado à moagem e outras finalidades.

Fonte: Cunha & Caierão (2023).

Cunha & Caierão (2023), afirmam que a classificação comercial é uma estimativa da aptidão tecnológica de cultivares de trigo em diferentes regiões homogêneas de adaptação. No entanto, destacam que essa classificação não pode garantir o desempenho uniforme de um lote comercial, uma vez que este dependerá de variáveis como condições climáticas, características do solo, práticas agrícolas, processos de secagem e armazenamento. A classificação comercial é uma ferramenta importante para orientar na seleção de cultivares mais adequadas às necessidades e regiões de cultivo. Ela oferece uma referência sobre a aptidão das cultivares para determinadas finalidades e ambientes de produção. Contudo, é fundamental compreender que a classificação de um lote de trigo dependerá de múltiplos fatores que podem variar significativamente de uma safra para outra e de uma região para outra.

Nesse sentido, é importante além de considerar essa informação, também levar em consideração as particularidades do ambiente de cultivo, adotar boas práticas agrícolas e gerenciar corretamente os processos de secagem e armazenamento.

Tabela 4. Indicações de características de qualidade por produto à base de trigo.

Fonte: Cunha & Caierão (2023).

Veja mais: Uso de Redutor de Crescimento no Trigo



Referências:

ABITRIGO. O TRITICULTOR E O MERCADO. Associação Brasileira da Indústria do Trigo, São Paulo – SP, 2011. Disponível em: < https://www.abitrigo.com.br/wp-content/uploads/2019/08/cartilha_triticutor.pdf >, acesso em: 01/08/2023.

CONAB. ACOMPANHAMENTO DA SAFRA BRASILEIRA GRÃOS. Safra 2022/23, 10° levantamento, Brasília – DF, 2023. Disponível em: < https://www.conab.gov.br/component/k2/item/download/48137_6239e58c7fc01900f76618eb4ca2bb01 >, acesso em: 01/08/2023.

CUNHA, G. R.; CAIERÃO, E. INFORMAÇÕES TÉCNICAS PARA TRIGO E TRITICALE SAFRA 2023. 15ª Reunião da Comissão Brasileira de Pesquisa de Trigo e Triticale Brasília – DF, 2023. Disponível em: < https://ainfo.cnptia.embrapa.br/digital/bitstream/doc/1153536/1/InformacoesTecnicasTrigoTriticale-Safra2023.pdf >, acesso em: 01/08/2023.

GUARIENTI, E. M. et al. NORMAS DE CLASSIFICAÇÃO COMERCIAL DE TRIGO E DE FARINHA DE TRIGO NO BRASIL: UMA PERSPECTIVA HISTÓRICA. Embrapa Trigo, Passo Fundo – RS, 2022. Disponível em: < https://ainfo.cnptia.embrapa.br/digital/bitstream/doc/1143607/1/Documentos-199-online.pdf >, acesso em: 01/08/2023.

MINISTÉRIO DA AGRICULTURA, PECUÁRIA E ABASTECIMENTO. INSTRUÇÃO NORMATIVA 38/2010. MAPA, IN 38/2010. Disponível em: < https://sistemasweb.agricultura.gov.br/sislegis/action/detalhaAto.do?method=visualizarAtoPortalMapa&chave=358389789 >, acesso em: 01/08/2023.

MIRANDA, M. Z. et al. QUALIDADE COMERCIAL DO TRIGO BRASILEIRO: SAFRA 2006. Documentos online 112, Embrapa, 2009. Disponível em: < http://www.cnpt.embrapa.br/biblio/do/p_do112.pdf >, acesso em: 01/08/2023.

NETO, A. A. O.; SANTOS, C. M. R. A CULTURA DO TRIGO. CONAB, Brasília – DF, 2017. Disponível em: < https://www.conab.gov.br/uploads/arquivos/17_04_25_11_40_00_a_cultura_do_trigo_versao_digital_final.pdf >, acesso em: 01/08/2023.

SMANHOTTO, A. et al. CARACTERÍSTICAS FÍSICAS E FISIOLÓGICAS NA QUALIDADE INDUSTRIAL DE CULTIVARES E LINHAGENS DE TRIGO E TRITICALE. Revista Brasileira de Engenharia Agrícola e Ambiental, v. 10, n. 4, p. 867-872. Campina Grande – PB, 2006. Disponível em: < https://www.scielo.br/j/rbeaa/a/dG6GT3rq5nXp3Mjmb6wZpgq/?format=pdf&lang=pt >, acesso em: 01/08/2023.

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Redação: Vívian Oliveira Costa, Eng. Agrônoma pela Universidade Federal de Santa Maria.

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