Autores: Adriano Vilmar Garcia – Engº. Agrº., Pesquisador do Interdisicplinary Research Group on Environmental Biogechemistry (IRGEB) e mestrando do Programa de Pós Graduação em Ciência do Solo da UFRGS. E-mail: adrivilmar@gmail.com.

Amanda Posselt Martins – Engª. Agrª., Dra. em Ciência do Solo, Professora do Departamento de Solos da UFRGS, Vice-Diretora do Núcleo Regional Sul da Sociedade Brasileira de Ciência do Solo e Pesquisadora do IRGEB. E-mail: amanda.posselt@ufrgs.br.


Alternativas para a sustentabilidade da lavoura orizícola e dos solos de várzea

Na grande maioria das regiões arrozeiras do Rio Grande do Sul (RS), o monocultivo de arroz irrigado vem se tornando insustentável, ano após ano. A queda nos preços pago pelo saco de arroz ao produtor, aliado ao, cada vez mais alto, custo de produção, fruto de inúmeros problemas que o sistema tradicional de cultivo de produção traz à lavoura arrozeira, vem fazendo com que se busquem alternativas para esse cenário. Nesse contexto, urge a necessidade de adoção de práticas de manejo do solo mais conservacionistas, como o plantio direto, e a diversificação de atividades agrícolas (rotação com soja) e pecuárias (integração lavoura-pecuária).

Apesar de diversos trabalhos já demonstrarem o benefício dessas práticas, muitos produtores enfrentam barreiras econômicas, logísticas e até mesmo culturais para diversificar a atividade orizícola como a rotação com soja ou inserção do componente pecuário no sistema de produção. Por isso, outras alternativas podem ser vislumbradas, visando o aumento da sustentabilidade das áreas de produção de arroz mesmo que sob monocultivo.



Nesse contexto, o Centro Tecnológico Integrar/Agrinova implementou um experimento em 2018, na região da Planície Costeira do RS, para testar diferentes sistemas de produção de arroz, de menor ou maior intensidade temporal do seu cultivo, com a missão de tornar sustentável a atividade orizícola para qualquer perfil de produtor e propriedade rural.

Os diferentes arranjos estudados buscam avaliar como o plantio direto, a cobertura hibernal, a rotação com a soja e a integração com a pecuária (Figura 1) podem ser utilizados para melhorar as características da fertilidade do solo, aliadas à melhoria nos rendimentos produtivos e econômicos.

Figura 1. Plantio direto (A), soja em rotação (B) e pecuária hibernal (C) são algumas das alternativas para a atividade orizícola testadas no Centro Tecnológico Integrar/Agrinova.

A seguir, será detalhado como apenas a adoção do manejo conservacionista do solo e a introdução de uma planta de cobertura de inverno, mesmo que sem o pastejo, pode auxiliar a viabilidade técnica e econômica da produção de arroz, contribuindo principalmente na diminuição dos custos de adubação.

Leguminosa hibernal: existe algum benefício para o arroz em sucessão?

Diante do cenário apresentado anteriormente, o IRGEB, grupo de pesquisa da UFRGS, iniciou uma pesquisa específica em apenas dois dos sete sistemas de produção testados no experimento do Centro Tecnológico Integrar/Agrinova, que visa esclarecer a seguinte questão: “A presença de uma planta leguminosa hibernal, antecedendo o cultivo de arroz irrigado, promove algum tipo de incremento na produção?

Para responder a esta questão, uma série de avaliações foram realizadas na safra 2018/2019. A pesquisa iniciou com a semeadura de algumas áreas, no dia 30/05/2018, com o trevo persa (Trifolium resupinatum) (Figura 2), uma leguminosa extremamente tolerante a ambientes alagados. A densidade de semeadura utilizada foi de 8 kg/ha. Para comparação, áreas testemunhas em pousio também foram mantidas, respeitando o delineamento experimental de blocos ao acaso com 3 repetições. Cada repetição teve o tamanho aproximado de 0,5 ha, para que a variabilidade natural da área fosse representada. A dessecação do trevo, pré-plantio do arroz, foi feita no dia 06/10/2018, com 4 L/ha de glifosato.

Figura 2. Aspecto da área pré-plantio da cobertura hibernal (A), trevo-persa 90 dias após a semeadura (B) e dessecado no pré-plantio do arroz (C).

Na safra de arroz no verão, foi utilizada a cultivar BRS Pampeira, com a semeadura realizada no dia 23/10/2018 com 110 kg/ha de sementes. A adubação de base foi de 350 kg/ha de 07-18-27, para ambos sistemas (com e sem trevo persa). Todos os manejos de pragas e invasoras seguiram as recomendações de controle preventivo em ponto de agulha e em V3-V4. Quando o arroz atingiu esse estádio, foram feitas parcelas de 2 x 5 m dentro de cada sistema para observar a resposta do arroz irrigado a doses de ureia (0,109, 217, 326 e 435 kg/ha), equivalente a 0, 50, 100, 150 e 200 kg de N/ha, respectivamente, aplicados em V4 (Figura 3), seguido do alagamento da lavoura. Além disso, a dose de 150 kg N/ha também foi testada de forma fracionada (2/3 em V4 e 1/3 na DPF).

Figura 3. Aspecto da lavoura de arroz após a aplicação de N em cobertura (A) e comparação visual do arroz após duas semanas da aplicação de diferentes doses de nitrogênio via ureia (B).

Os custos da semeadura do trevo persa foram de R$ 234/ha (R$ 184/ha de sementes + R$ 50/ha de operação). Os custos de aplicação de 150 kg N/ha foram de R$ 426/ha (R$ 360/ha de 326 kg de ureia + R$ 66/ha de operação). No entanto, a densidade de semeadura do trevo pode ser reduzida para 4 kg/ha de sementes, deixando o custo de semeadura mais barato, em R$ 142/ha, equivalente ao custo de aplicação de 109 kg/ha de ureia (50 kg de N/ha).

Os resultados de produtividade demonstraram que com o cultivo de uma leguminosa hibernal, como o trevo persa, o incremento de produtividade do arroz adubado com 150 kg N/ha é maior quando não é realizado o fracionamento da ureia (Figura 4), apesar do maior patamar produtivo com a adubação fracionada (14,7 t/ha com fracionamento e 12,2 t/ha sem fracionamento). O incremento observado, devido ao trevo persa, foi de 1,2 t/ha quando o N foi aplicado em uma única época e de 700 kg/ha quando o N foi fracionado em duas épocas.

Figura 4. Comparativo da produtividade de arroz com casca entre o sistema com e sem trevo persa nas diferentes doses (A) e fracionamento (B) de nitrogênio.

Além disso, os resultados também demonstraram que o investimento feito no inverno pode ser recuperado com a redução da dose de ureia aplicada no arroz irrigado no verão. O incremento mínimo em um sistema com cultivo de trevo persa no inverno reverteu em aumento de 700 kg/ha com possível rendimento de até R$ 490/ha a mais que o sistema de pousio. Isto é, além de pagar os custos com a implantação do trevo persa, ainda gera um excedente na receita (R$ 490 – R$ 234 = R$ 256).

A ureia é o adubo que representa 50% dos custos totais com adubação da lavoura de arroz irrigado e através desta simples alternativa de uso do solo no inverno podemos reduzi-los e ainda ganhar em produtividade. Dessa forma, fica evidente a alternativa promissora que o trevo persa se constitui, tanto para produtores como para pesquisadores do setor orizícola. No experimento aqui apresentado, a pesquisa segue (Figura 5) com perspectivas de longo prazo, para trazer resultados consolidados que poderão ser incorporados nas futuras recomendações de adubação nitrogenada para o arroz.

Figura 5. Aspecto da área com cultivo de trevo persa no inverno (direita) e em pousio (esquerda) em agosto de 2019, no Centro Tecnológico Integrar/Agrinova.

Considerações finais

Além da possível estratégia para redução nos custos com a adubação, o cultivo de trevo persa durante o inverno trouxe incremento de produtividade suficiente para justificar sua implantação. Ressaltamos ainda que o fracionamento da dose de ureia em duas épocas de aplicação (V4 e DPF), traz ganhos ainda maiores quando aliados à presença do trevo persa no inverno.

Os ganhos com o cultivo de leguminosas como o trevo persa são vistos em muitos trabalhos científicos, comprovando que, para solos arenosos e com baixa CTC como os da Planície Costeira Externa e Interna, o incremento de matéria orgânica (MO) no solo aumenta a fertilidade, com a complexação do alumínio tóxico, o aumento da CTC, maior suprimento de N, entre outros benefícios. É comprovado que o aumento eficiente da MO no solo é diretamente dependente do cultivo de leguminosas juntamente com gramíneas. Logo, o cultivo de trevo persa não só está reduzindo os custos e aumentando os ganhos de receita, mas também está melhorando a qualidade química do solo arrozeiro de forma a construir sua fertilidade, reduzindo custos futuros e minimizando impactos ambientais.



Agradecimentos 

Agradecemos a toda equipe do Centro Tecnológico Integrar/Agrinova, que sempre se dispuseram em ajudar durante atividades realizadas. Agradecemos também a todos os colegas e funcionários do Departamento de Solos da UFRGS, em especial ao grupo de pesquisa IRGEB, que auxiliaram nas coletas, nas análises, na discussão e na demonstração
dos resultados obtidos para este trabalho.


Entendendo a dinâmica do nitrogênio com o trevo persa no cultivo de arroz irrigado: imobilização e mineralização pelos microrganismos do solo

A adubação corresponde a 11% dos custos vinculados ao cultivo de arroz irrigado, sendo que o nitrogênio representa metade desses recursos. Logo, se tratando de um nutriente que é tão importante para a produção e que corresponde a maior parte dos gastos com adubação, o manejo inteligente dos sistemas para seu melhor aproveitamento é crucial para atingir maiores tetos produtivos com menores custos.

Portanto, alternativas como o suprimento de N através de microrganismos com plantas
leguminosas deve ser melhor estudado para que se elabore novas estratégias de adubação
nitrogenada.



Estamos de casa nova!

Em parceria com a Agrinova, nossa Estação Experimental está agora localizada em Capivari do Sul, em um dos mais importantes polos agropecuários do Rio Grande do Sul, onde se destacam a produção de arroz, soja e pecuária. É mais visibilidade para nossos clientes, e maior potencial de impacto das tecnologias geradas. E mais!

Além dos protocolos em arroz, soja, milho e espécies forrageiras, demos início a um projeto denominado “Integração lavoura-pecuária nas planícies costeiras do Rio Grande do Sul”, onde testaremos diferentes modelos de ILP, para a maior sustentabilidade produtiva, econômica e ambiental no ambiente das terras baixas. Fique atento aos eventos que promoveremos, e venha conhecer nossa área!

Fonte: Informativo INTEGRAR – Nº 27 – Setembro/2019.

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