Nesta semana, as cotações da soja em Chicago literalmente explodiram, com altas de quase dois dólares por bushel, com o mesmo ultrapassando os US$ 17,00 no início do pregão do dia 24/02, algo que não era visto desde 2012. Posteriormente o mercado cedeu bastante, e o fechamento desta quinta-feira (24) ficou em US$ 16,61/bushel, contra US$ 15,92 uma semana antes. Lembrando que o recorde histórico em Chicago se deu no dia 04/09/2012, quando o bushel bateu em US$ 17,71.

O motivo para este excepcional movimento, além da pressão altista provocada pela continuidade da seca e das perdas, em grandes regiões dos principais países produtores da América do Sul, surgiu com a invasão da Ucrânia pela Rússia na madrugada brasileira deste dia 24/02. Estamos falando da principal região produtora e exportadora de trigo do mundo, além de controladora de parte do petróleo e gás natural do Planeta. Uma tensão armada deste calibre, que tentava ser evitada a qualquer custo pelo mundo ocidental, provoca uma escalada de preços e dúvidas sem precedentes. Com o petróleo ultrapassando os US$ 100,00/barril, pela primeira vez em sete anos no mundo, devido ao conflito, o valor do óleo de soja em Chicago volta a ultrapassar os 70 centavos de dólar por libra-peso, chegando próximo aos seus recordes históricos. O farelo igualmente dispara, se aproximando dos US$ 500,00/tonelada curta naquela Bolsa. Com isso, o grão encontra mais elementos para subir. A questão, agora, é verificar quanto tempo este conflito irá durar. Pois, assim como sobe no conflito, o mercado desce quando o sentimento é que os motivos não dão mais sustentação às altas. Durante o pregão, o recuo do bushel indica isso, porém, ainda é cedo para conclusões e tudo pode acontecer nos próximos dias.

Dito isso, durante a semana, antes da invasão russa, o mercado assinalava que na semana encerrada em 17/02 os EUA haviam embarcado 975.102 toneladas de soja, ficando dentro do esperado. Com isso, em todo o atual ano comercial o volume embarcado atinge a 39,8 milhões de toneladas, ainda 22% menor do que o praticado no mesmo período do ano anterior. A China estaria comprando bons volumes nos EUA, deixando parcialmente de lado o Brasil devido ao alto preço de nossa soja no momento (a quebra da safra, provocando elevação dos prêmios nos portos em pleno início de colheita por aqui, e a revalorização do Real, tornam nosso produto mais caro).

Assim, os EUA já teriam vendido 4,5 milhões de toneladas da safra nova 2022/23, ainda não plantada, sendo que 60% deste volume foi para a China. Nesta última semana o país asiático teria comprado apenas cinco navios de soja no Brasil, quando o normal é algo entre 25 a 30 navios. (cf. Agrinvest Commodities) Ao mesmo tempo, a China teria revendido soja brasileira no destino (cerca de 10 navios), pois as margens de esmagamento estão ruins naquele país, não compensando trabalhar com soja muito cara procedente do Brasil. (cf. Bloomberg)

A China igualmente estaria na iminência de realizar leilões de seus estoques de soja, entre 1,5 a 6 milhões de toneladas, visando reduzir os preços internos e melhorar as margens de esmagamento das indústrias locais. Quanto mais próximo de 6 milhões for o volume, maior será a possibilidade de os processadores chineses se afastarem das compras de soja brasileira, causando um prejuízo aos negócios nacionais da oleaginosa. (cf. Brandalizze Consulting)

Enfim, ainda no cenário internacional, a Índia estaria contratando um volume recorde de importação de óleo de soja dos EUA. O mesmo chegaria ao redor de 100.000 toneladas e substituiria o produto sul-americano, pouco disponível devido a seca, e também porque o óleo de palma bateu em valores elevados historicamente. As compras do produto estadunidense subiram quase 20% neste ano, chegando perto do seu maior nível em uma década. A Índia geralmente obtém dois terços de suas necessidades de óleo de soja na Argentina, e o restante no Brasil. Mas neste ano, diante da seca, não será o caso. O óleo de girassol também poderia ser uma alternativa para os indianos. Este produto viria do Mar do Norte, porém, o conflito Rússia/Ucrânia impede, no momento, tais negócios.

Nesta semana, o óleo de palma bruto (CPO), na Índia, estava sendo oferecido por cerca de 1.575 dólares por tonelada, incluindo custo, seguro e frete (CIF), para embarques em março, enquanto o de soja bruto atingia a 1.620 dólares e o de girassol bruto 1.515 dólares, segundo traders. O óleo de soja foi mais barato que o óleo de palma e girassol no mês passado, mas o salto repentino na demanda por óleo de soja elevou os preços em 16%, em um mês, atingindo o maior valor em 14 anos.

Na prática, a Índia obtém quase dois terços de suas necessidades de óleo comestível por meio de importações, principalmente óleo de palma da Indonésia e Malásia. Mas a decisão da Indonésia de reduzir as exportações de óleo de palma elevou o preço a um recorde e criou escassez no mercado de óleo comestível. Neste contexto, a Índia poderia importar até 160.000 toneladas de óleo de soja dos Estados Unidos em 2021/22, superando largamente as 36.000 toneladas de um ano atrás.

E aqui no Brasil os preços, apesar da movimentação em Chicago, acabaram ficando represados em função de novas baixas do dólar. O Real, na semana, chegou a ser cotado a R$ 5,00 por dólar, algo que não era visto desde o final de junho do ano passado (todavia, em função do conflito no Leste Europeu, a moeda estadunidense subia para R$ 5,13 no início da tarde desta quinta-feira, 24/02). Pelo sim ou pelo não, o fato é que a média gaúcha fechou a semana em R$ 195,95/saco, contra R$ 194,60 uma semana antes e R$ 190,81 duas semanas atrás. Nas demais praças nacionais o preço da soja aos produtores oscilou entre R$ 169,00 e R$ 194,00/saco, nesta semana. Na semana anterior os mesmos ficaram entre R$ 166,00 e R$ 188,00/saco, enquanto duas semanas atrás os mesmos se estabeleceram entre R$ 170,00 e R$ 186,00/saco.

Dito isso, nova revisão da safra brasileira de soja dá conta de que nossa produção deverá ficar em 122 milhões de toneladas. (cf. Pátria Negócios) Neste contexto de quebra de safra e preços altos, quem tem soja está aproveitando para fechar negócios. Tal realidade está favorecendo em muito os sojicultores do Centro-Oeste, Norte e Nordeste do país, que não enfrentaram muitos problemas com a seca, e aqueles que foram menos atingidos pela intempérie no Centro-Sul. A alta dos preços, agora também puxada pelo conflito armado entre Rússia e Ucrânia, ajuda a compensar o forte aumento nos custos de produção, com estes produtores nacionais até conseguindo margens positivas neste momento.

Diante de todos estes fatos, neste mês de fevereiro o ritmo de negociação da atual safra 2021/22 está abaixo do registrado nos dois últimos anos.

No Rio Grande do Sul, com o retorno de chuvas esparsas em algumas regiões, o plantio da atual safra de soja finalmente teria sido concluído. O atraso no mesmo, em relação ao normal, é imenso. Até meados de fevereiro, segundo a Emater local, 4% da área semeada estava em maturação, 44% em enchimento de grãos, 37% em floração e 15% ainda em germinação e desenvolvimento vegetativo.

Quanto às exportações brasileiras de soja, conforme a Secex, nos 18 primeiros dias úteis do mês de fevereiro o país alcançou 3,39 milhões de toneladas. O volume é bem maior do que tudo o que o país exportou em fevereiro do ano passado, que foi 2,65 milhões de toneladas. Em todo o ano de 2022 o Brasil já teria embarcado mais de 5,8 milhões de toneladas de soja, sendo um recorde histórico. Todavia, 90% deste volume é para atender contratos já firmados anteriormente pelos produtores brasileiros. Ou seja, exportação nova tem muito pouco.

Neste contexto, o mercado considera que março e abril terão dias muito tensos em relação a comercialização da soja, podendo ser um período de muita volatilidade diante dos atuais acontecimentos.

Por sua vez, a colheita de soja teria atingido a 36% da área total brasileira nesta semana, contra 18% na mesma época do ano passado. O Mato Grosso já teria colhido 71,5%, embora as chuvas tenham diminuído o ritmo de corte nesta semana. Aliás, o excesso de chuvas no Centro-Oeste tem prejudicado a soja no final da colheita local. (cf. AgResource Brasil)


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Fonte: Informativo CEEMA UNIJUI, do prof. Dr. Argemiro Luís Brum (1)

1 – Professor Titular do PPGDR da UNIJUI, doutor em Economia Internacional pela EHESS de Paris-França, coordenador, pesquisador e analista de mercado da CEEMA (FIDENE/UNIJUI).

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