O objetivo deste estudo foi avaliar os índices de agregação e o teor de matéria orgânica leve em diferentes sistemas de manejo do solo.
Autores: Guilherme Luis Lenz¹; Samya Uchôa Bordallo²; Thiago Stacowski dos Santos²; Euclides Schallenberger³; Rafael Ricardo Cantú³; Jucinei Jose Comin4
Introdução
O uso de plantas de cobertura é uma prática que ajuda a diminuir a erosão e a incrementar o teor de matéria orgânica do solo, proporcionando a ciclagem de nutrientes (AITA & GIACOMINI, 2006; BOER et al., 2007; TORRES et al., 2008). O aporte contínuo de material orgânico proporciona uma melhor estruturação do solo e favorece o desenvolvimento das culturas de interesse, recuperando a qualidade do solo, ou seja, sua capacidade de exercer suas funções na natureza (SILVA & MIELNICZUK, 1997; DORAN, 1997). A estrutura do solo é compreendida pela disposição e distribuição dos agregados no solo, o que influencia aspectos bióticos, físicos e químicos, portanto, considerada uma propriedade relevante para a sustentabilidade dos agroecossistemas (SIX et al., 2004).
Os sistemas de manejo do solo influenciam na estabilidade dos agregados, como demonstrado por Argenton et al. (2005), em que o preparo convencional e o reduzido modificaram a densidade e a resistência à penetração de raízes e reduziram a porosidade total. Em contrapartida, após cinco anos utilizando o sistema de plantio direto com o uso de plantas de cobertura, foi verificado a recuperação das propriedades físicas do solo. A decomposição dos resíduos e a consequente liberação de nutrientes dependem de fatores como clima, condições do solo e da composição química da biomassa. Estudos comprovaram que a sucessão de gramíneas e leguminosas favorece a maior agregação do solo, por manter quantidades adequadas de resíduos na superfície do solo e liberação gradual de nutrientes (CAMPOS et al., 1999; WOHLENBERG et al., 2004).
Dentre os indicadores que podem expressar a qualidade do solo de forma eficiente, a matéria orgânica do solo (MOS) é um parâmetro sensível às modificações no ambiente de cultivo (CONCEIÇÃO et al., 2005). A matéria orgânica leve (MOL) é uma fração ativa da MOS, constituída por resíduos orgânicos em diferentes estágios de decomposição, podendo permanecer no solo em curto e médio prazo (JANZEN et al., 1992). A MOL pode representar o potencial de ciclagem de nutrientes do solo e está diretamente relacionada ao aporte de raízes ao solo pelas plantas e na comunidade microbiológica (COMPTON & BOONE, 2002; LOSS et al., 2012). O objetivo deste estudo foi avaliar os índices de agregação e o teor de matéria orgânica leve em diferentes sistemas de manejo do solo.
Material e Métodos
Localização
O estudo foi realizado na área experimental da Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina (EPAGRI) (26° 56’ 33’’ S e 48° 45’ 29’’O), localizada no município de Itajaí/SC. O clima da região é classificado como subtropical Cfa, segundo Koppen, apresentando estações bem definidas com invernos amenos e verões quentes. A precipitação é bem distribuída ao longo do ano. O solo foi classificado no início do experimento como Cambissolo Háplico Distrófico típico com influência de disposição aluvial
decorrente de eventuais enchentes na área.
Tratamentos
O experimento foi instalado em 2006, em uma área que estava sob pousio por cinco anos. O delineamento experimental utilizado foi de blocos ao acaso com quatro repetições e parcelas com dimensões de 100 m2. Os tratamentos foram: T1 – Sistema de plantio direto com utilização de plantas de cobertura (crotalária ou feijão de porco no verão e aveia consorciada com ervilhaca no inverno); T2 – Sistemas de plantio direto com vegetação nativa; T3 – Sistema de plantio direto com cobertura de palha (palha de arroz ou capim elefante triturado); T4 – Plantio convencional com adubação orgânica; e T5 – Plantio convencional com adubação de NPK. Antes do plantio, a área foi roçada, com exceção dos tratamentos T4 e T5, às quais foram preparadas com arado e enxada rotativa.
Amostragens
Em agosto de 2017 foram coletadas quatro subamostras de solo em quatro diferentes quadrantes em cada parcela. Para isso, uma trincheira de 40 x 40 x 40 cm foi aberta em cada parcela com o auxílio de uma pá de corte. Foram coletadas amostras indeformadas de solo nas profundidades de 0-5, 5-10 e 10-20 cm. As amostras foram secas ao ar e destorroadas manualmente, seguindo fendas ou pontos de fraqueza, e peneiradas em um conjunto de peneiras de malha de 8,00 mm e 4,00 mm, obtendo-se os agregados do solo, conforme Embrapa (1997).
Procedimentos
Dos agregados retidos na peneira de 4,00 mm, foram pesados 50 g e transferidos para uma peneira de 2,00 mm, compondo um conjunto de peneiras de malhas decrescentes, com os seguintes diâmetros: 2,00; 1,00; 0,50; 0,25; 0,106 e 0,053 mm para a análise da estabilidade dos agregados, conforme metodologia descrita em Embrapa (1997). Os agregados foram colocados na peneira de 2,00 mm e umedecidos com borrifador de água, permanecendo 5 minutos, antes da submissão do conjunto de peneiras à tamisação vertical via úmida por 15 minutos no aparelho de Yoder (YODER, 1936). Transcorrido esse tempo, o material retido em cada peneira foi retirado, separado com jato d’água, colocado em recipientes de metal previamente pesados e identificados, e levados à estufa de circulação de ar, à 60ºC, até a obtenção de massa seca constante. A partir da massa seca dos agregados foram calculados os índices diâmetro médio geométrico (DMG) e o diâmetro médio ponderado (DMP) dos agregados, segundo Embrapa (1997).
Análise estatística
Os resultados foram submetidos à análise de variância e, quando os efeitos foram significativos entre camadas do mesmo tratamento e entre tratamentos na mesma camada, as médias foram comparadas pelo teste Skott Knott (0,05).
Resultados e Discussão
Foram encontrados os maiores valores de DMP nos tratamentos 1, 2 e 3 (Tabela 1) manejados com o sistema plantio direto, no qual o revolvimento do solo fica restrito à linha de plantio, o que favorece a estabilidade dos agregados e a estrutura do mesmo. Esse fato é corroborado por Tivet et al. (2013) que compararam os efeitos do sistema de plantio direto, revolvimento mínimo e sem revolvimento, em um latossolo e obtiveram como resultado maiores valores de macroagregados no tratamento sem revolvimento. Outros autores também demonstraram resultados semelhantes (SOMASUNDARAM, 2017).
Tabela 1. Valores de diâmetro médio ponderado (DMP) e diâmetro médio geométrico (DMG) de agregados, em mm, e matéria orgânica leve (MOL), em g kg-1, em diferentes sistemas de uso do solo.
Quanto aos tratamentos T4 e T5, os quais apresentaram os menores valores de DMP e DMG nas profundidades 0-5 e 5-10 cm, o resultado pode ser explicado pelo uso da prática de revolvimento do solo, que rompe os agregados. Resultados semelhantes foram verificados por Loss et al. (2009) que compararam SPD, SPC, cultivos consorciados, sistemas agroflorestais (SAFs) e áreas de plantio de figo, e encontraram os menores valores de DMP e DMG no SPC e Pinheiro et al. (2004) que verificaram menores modificações na agregação do solo em áreas de cultivo de oleráceas sob SPD.
Na profundidade 10-20 cm, os tratamentos não diferiram estatisticamente entre si para DMP e DMG. Devido ao manejo adotado, ocorre um maior aporte de resíduos nos tratamentos T1 e T2 na camada mais superficial (0-5 cm), o que resulta na elevação dos teores de MOL. Os incrementos favorecem a microbiota do solo, tornando maior a produção temporária de agentes cimentantes por microrganismos e fungos, elevando assim o DMP e o DMG. Em relação à MOL, ocorre maior acúmulo nas camadas 0-5 e 5-10 cm devido à deposição de resíduos vegetais em T1, T2 e T3.
Dentre os compartimentos da matéria orgânica do solo, a MOL pode ser considerada um compartimento lento dentro da dinâmica do carbono e nitrogênio no solo (LEITE, 2002), com isso, deve-se buscar adotar sistemas de manejo que propiciem maiores teores de MOL no solo, como T1, T2 e T3. Trabalhando com sistema de cultivo orgânico, Xavier (2006) encontrou teores de MOL maiores, até mesmo em comparação a área de mata nativa, sendo esta uma condição de referência. Em T4 e T5, onde foi utilizado o SPC, houve menor teor de carbono nessas duas camadas em consequência das práticas de manejo, o que pode estar relacionado aos seus menores valores de MOL.
Isso corrobora com o estudo feito por Pereira et al. (2011), em que no SPD foi constatado que à medida que a profundidade aumentou a MOL tendeu a diminuir. Em T3 os teores elevados de MOL na profundidade de 5-10 cm podem ser os responsáveis pelos valores de DMP e DMG dos agregados nessa mesma profundidade. Como são adicionados restos culturais de arroz e capim elefante triturados e que têm tamanho reduzido, pode ocorrer a percolação desse material após as precipitações.
Na profundidade 10-20 cm não houve diferenças para o DMP e DMG, no entanto o tratamento T4 apresentou os maiores valores de MOL nessa camada, corroborando com a elevação de 58,42% e 49,88% respectivamente, dos valores de DMP e DMG, em comparação aos valores na profundidade de 0-5 cm. Isso pode ser consequência da incorporação do adubo orgânico no solo, que apesar de ocasionar a destruição dos agregados, acaba contribuindo com o aporte de material rico em carbono em profundidade, conforme verificado por Pereira et al. (2011) em estudo sobre práticas de revolvimento do solo e o uso plantas de cobertura que propiciaram a incorporação mais profunda do carbono no solo.
Conclusões
O sistema de plantio direto favorece a agregação no solo nas camadas superficiais de 0 – 5 e 5 – 10 cm. O sistema de plantio direto com aplicação de resíduos de arroz e capim elefante triturados aumenta os teores de matéria orgânica leve nas camadas superficiais o que infere em uma maior estabilidade dos agregados. O plantio convencional com adubação orgânica propicia maior acúmulo de matéria orgânica na camada de 10 – 20 cm, o que aumenta a estabilidade dos agregados nesta profundidade.
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Referências
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Informações dos autores
¹Estudante de Mestrado do Programa de Pós-Graduação em Agroecossistemas (PPGA), Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Rod. Admar Gonzaga, 1346, Florianópolis SC, 88034-000, glenz7@gmail.com;
²Estudante de Mestrado do PPGA, UFSC;
³Pesquisador, Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina (EPAGRI);
4Professor Adjunto 1, UFSC.
Disponível em: Anais da XII Reunião Sul-Brasileira de Ciência do Solo. Xanxerê – SC, Brasil.