Autor: Dr. Argemiro Luís Brum
A cotação do trigo, em Chicago, para o primeiro mês cotado, após recuar para US$ 9,84/bushel no dia 1º de abril, voltou a subir, fechando a quinta-feira (07) em US$ 10,20, contra US$ 10,06 uma semana antes. Lembrando que o valor de 1º de abril não era visto desde o final de fevereiro. Ao mesmo tempo, a média de março atingiu a US$ 11,24/bushel, ganhando 39,4% sobre a média de fevereiro. Em março de 2021 a média havia sido de US$ 6,35/bushel. Ou seja, no espaço de 12 meses o trigo ganhou quase cinco dólares em Chicago. Obviamente, a guerra entre Rússia e Ucrânia, iniciada no final de fevereiro passado, é um dos principais elementos deste forte aumento, já que a média de janeiro/22 foi de US$ 7,72/bushel. Isso significa dizer que nos últimos dois meses (fevereiro e março) a média do trigo em Chicago ganhou quase quatro dólares por bushel.
Dito isso, o mercado aguardava o relatório de oferta e demanda do USDA, anunciado neste dia 08/04, o qual iremos analisar, com detalhes, no próximo comentário.
Além disso, nos EUA o plantio do trigo de primavera atingia a 3% da área esperada no dia 03/04, contra 2% na média histórica para a data.
Por sua vez, ainda nos EUA, os embarques de trigo atingiram a 297.341 toneladas na semana encerrada em 31/03, ficando dentro das projeções do mercado. Em todo o ano comercial atual, os EUA embarcaram 17,2 milhões de toneladas de trigo, ou seja, 18% a menos do que em igual período do ano anterior.
Enquanto isso, na Rússia, aumentou-se a previsão para as exportações de trigo do país, apesar da guerra contra a Ucrânia. Agora, para este ano 2021/22, os russos esperam exportar 33,9 milhões de toneladas, contra 39,1 milhões no ano anterior. Dentre os motivos deste aumento nas exportações, em relação ao que estava projetado antes, estão: os altos preços mundiais do cereal; a forte desvalorização do rublo; os embarques mais rápidos ocorridos na segunda quinzena de março; e, particularmente, o fato de parte da demanda de trigo mudar da Ucrânia para a Rússia em função de problemas logísticos provocados pela guerra em ambos os países. (cf. Sovecon, via Reuters)
Por outro lado, a Índia igualmente tira proveito do conflito no Leste Europeu e teria aumentado suas vendas externas de trigo, chegando a 7,85 milhões de toneladas no ano comercial encerrado em março. Trata-se de um recorde histórico, após 2,1 milhões de toneladas exportadas no ano anterior. Apesar da Índia ser o terceiro maior produtor mundial de trigo, atrás apenas da China e da União Europeia, com previsão de 109,6 milhões de toneladas para este ano 2021/22, suas exportações são reduzidas, pois o país consome quase toda sua produção em seu mercado interno. Os maiores compradores do trigo indiano, neste último ano, foram Bangladesh, Coreia do Sul, Sri Lanka, Omã e Catar.
Já na Ucrânia, o sindicato de traders de grãos pediu ao governo que cancele as restrições às exportações de trigo, pois os estoques locais estão muito altos e os embarques não afetariam a segurança alimentar ucraniana, apesar da guerra. Lembramos que, em março, a Ucrânia introduziu licenças de exportação para trigo, milho e óleo de girassol. Duas semanas depois, o governo cancelou as restrições à exportação de milho e de óleo de girassol, mantendo-as para o trigo. A Ucrânia teria colhido 33 milhões de toneladas de trigo em 2021 e, antes da guerra, planejava exportar 25,3 milhões de toneladas no ano comercial 2021/22 (julho-junho). Todavia, os embarques quase pararam, desde o final de fevereiro, devido à invasão pela Rússia e ao bloqueio dos portos do Mar Negro e do Mar de Azov. Assim, cerca de 12 milhões de toneladas de trigo ainda estão armazenadas na Ucrânia, enquanto faltam menos de 3 meses para a nova colheita, e o consumo interno pode ser de apenas 1,5 milhão de toneladas. A grande incógnita é o que será colhido nesta nova safra diante dos efeitos nocivos da guerra.
Em paralelo, na União Europeia as exportações do cereal devem igualmente aumentar, na esteira da guerra. Segundo a Comissão Europeia, os embarques de trigo macio, por parte da União, poderão atingir a 40 milhões de toneladas em 2022/23, ano comercial que se inicia agora em julho, contra 33 milhões no ano anterior. A menor oferta da Ucrânia, bloqueada pela guerra, seria o principal motivo deste aumento nas exportações da União Europeia. Além disso, a União deverá importar bem menos milho, atingindo a 9 milhões de toneladas, contra 14 milhões no ano comercial anterior. Lembramos que a União Europeia é um importador líquido de milho para a alimentação animal, tendo a Ucrânia como um de seus maiores fornecedores deste cereal.
Por fim, ainda no front externo, o Egito, normalmente o maior importador individual de trigo, no mundo, aumentou suas compras oriundas da Rússia em março, mesmo diante das dificuldades motivadas pela guerra. O país norte-africano recebeu 479.195 toneladas do cereal russo no mês de março, volume que representou 24% acima do registrado no mesmo mês do ano anterior. Já as importações egípcias de trigo ucraniano caíram 42% em relação a março de 2021, ficando em apenas 124.500 toneladas. A vantagem russa é que seus portos, apesar da guerra, permanecem abertos, lembrando que em 2021 o Egito importou, da Rússia e da Ucrânia, cerca de 80% do trigo que comprou no exterior.
E no Brasil, os preços do trigo permaneceram relativamente estáveis, porém, com viés de baixa, nesta primeira semana de abril. O balcão gaúcho fechou a semana na média de R$ 93,96/saco, contra R$ 94,60 na semana anterior, enquanto no Paraná o produto oscilou entre R$ 92,00 e R$ 95,00/saco.
De forma geral, o mercado cede um pouco, diante da valorização do Real, a qual torna as importações do cereal mais competitivas. Dito isso, as cotações das farinhas seguiram em alta, devido ao elevado custo com a matéria-prima e ao fato de alguns moinhos já terem sinalizado previsão de novos reajustes positivos em abril. No caso dos farelos, o repasse dos custos e a realização de negócios estão mais difíceis, pois há disponibilidade de substitutos com menor preço para a alimentação animal. (cf. Cepea)
Afora isso, no norte do Paraná, na região de Maringá, os primeiros plantios de trigo da nova safra começam a ocorrer neste início de abril. Segundo o Deral, 375 hectares com o cereal teriam sido semeados, enquanto a área total esperada no Estado deverá superar a um milhão de hectares. Por enquanto, o clima naquela região está favorável ao plantio. A safra total de trigo, no Paraná, em 2022, está projetada em 3,87 milhões de toneladas, após 3,2 milhões no ano passado.
Enfim, enquanto no Brasil o preço do pão francês (popular cacetinho no Rio Grande do Sul) aumentou 20% em alguns Estados, puxado pela forte elevação nos preços do trigo mundial, na Argentina o governo local intervém no mercado, mais uma vez. O governo do vizinho país assinou um acordo com representantes do setor de panificação para manter os preços de referência do quilo do pão por 90 dias. Dito de outra maneira, o governo está congelando os preços ao consumidor local. Uma política que ajuda no curto prazo mas que causa grandes problemas para a economia em geral e o setor atingido em particular, na sequência. Principalmente porque o Estado argentino, para bancar tal política, terá que subsidiar o valor do trigo para os moinhos (os moinhos comprarão trigo ao preço de mercado e repassarão a farinha, dali resultante, a um valor proporcionalmente mais baixo ao consumo final, sendo a diferença bancada pelo Estado argentino). (cf. Canal Rural)
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Fonte: Informativo CEEMA UNIJUI, do prof. Dr. Argemiro Luís Brum (1)
1 – Professor Titular do PPGDR da UNIJUI, doutor em Economia Internacional pela EHESS de Paris-França, coordenador, pesquisador e analista de mercado da CEEMA (FIDENE/UNIJUI).