Inseticidas são ferramentas essenciais na proteção de culturas agrícolas, inclusive da soja. Os ingredientes ativos disponíveis atualmente são classificados pelo Comitê de Ação contra Resistência a Inseticidas (IRAC) em cerca de 30 grupos diferentes, cada qual apresentando um modo de ação distinto. Hoje falaremos sobre os inseticidas pertencentes aos Grupos 21 e 25: inibidores dos complexos I e II da cadeia de transporte de elétrons da mitocôndria, respectivamente.

No texto anterior, vimos que estruturas intracelulares denominadas mitocôndrias são responsáveis por oxidar os nutrientes ingeridos pelos insetos (e outros animais), armazenando a energia resultante em moléculas de adenosina trifosfato (ATP) por meio de um processo denominado fosforilação oxidativa. A enzima mitocondrial ATP-sintase é responsável por realizar a fosforilação, utilizando a energia oriunda do gradiente de prótons. Esse gradiente, é construído quando elétrons circulam ao longo da membrana mitocondrial em quatro complexos protéicos diferentes, energizando bombas de íons que retiram prótons do interior da mitocôndria. O potencial de trabalho gerado por esse gradiente é a força motriz que ativa a enzima ATP-sintase e, assim, fornece moléculas de ATP altamente energizadas para serem utilizadas nos processos metabólicos celulares. Os complexos protéicos que compõem a cadeia de transporte de elétrons da membrana mitocondrial são denominados complexos I, II, III e IV. Elétrons altamente carregados do NADH entram na cadeia de transporte pelo complexo I, enquanto os elétrons oriundos do FADH2 entram via complexo II.

O Grupo 21 inclui os chamados acaricidas e inseticidas METI, representados pelos ingredientes ativos fenazaquin, fenpiroximate, pirimidifen, piridaben, tebufenpirade e tolfenpirade. Esses produtos inibem o complexo I da cadeia mitocondrial de transporte de elétrons, levando o inseto à morte por falência energética e rápida paralisia. Tebufenpirade (Masai®), descoberto pela BASF, é um dos compostos mais importantes dentro desse grupo. Altamente efetivo como acaricida, esse produto é usado para controlar ácaros tetraniquídeos em algodão, citrus, culturas olerícolas e ornamentais, além de fornecer controle sobre mosca-branca. Em geral, os acaricidas/inseticidas METI apresentam ação rápida e longo efeito residual, controlando todas as fases de vida dos ácaros e outros insetos suscetíveis.

Ronetone (Prentox®) é outro produto pertencente ao Grupo 21, embora não classificado como acaricida/inseticida METI. Apresenta boa eficiência de controle sobre pulgões, ácaros tetraniquídeos e tripes em culturas frutíferas e olerícolas, além de ser usado no controle de larvas de mosquitos e espécies invasivas de peixes. Várias espécies de ácaros já desenvolveram resistência aos acaricidas/inseticidas METI, mas em nenhum caso foi constatada mutação no sítio de ação: trata-se de resistência metabólica, frequentemente estendendo-se a outros ingredientes ativos do mesmo grupo devido às suas similaridades químicas. De forma geral, os inseticidas do Grupo 21 não são tóxicos para mamíferos e aves, mas apresentam alta toxicidade para peixes e invertebrados aquáticos. Alguns, como o fenazaquin, são tóxicos também para ácaros predadores.

Figura 1. Célula animal, mitocôndria e cadeia de transporte de elétrons na membrana mitocondrial interna, mostrando o ponto de ação dos acaricidas/inseticidas METI (Grupo 21) e dos derivados de beta-cetonitrila (Grupo 25).

Fonte: SALGADO, V. L. (2013). Confira a imagem original clicando aqui

Já o Grupo 25 compreende os chamados derivados de beta-cetonitrila, representados pelos ingredientes ativos cienopirafen (Starmite®) e ciflumetofem (Sultan®). Inclui também as carboxanilidas, representados por um único ingrediente ativo, piflubumide (Noblesse®). Tratam-se de moléculas recentes (com menos de 10 anos de mercado), altamente eficientes e seletivas para o controle de ácaros. Podem ser utilizados em diversas culturas agrícolas, desde culturas de grãos e frutíferas até hortaliças e ornamentais. Esses produtos inibem o complexo II da cadeia mitocondrial de transporte de elétrons, gerando o mesmo efeito que os acaricidas/inseticidas METI: rápida paralisia e falência energética das células (Figura 1). Ressalta-se, entretanto, que cienopirafen e ciflumetofem são pro-inseticidas, cuja ação de controle ocorre apenas após sua metabolização para compostos enóis, no interior do inseto.

Tanto os derivados de beta-cetonitrila quanto as carboxanilidas apresentam baixa toxicidade para mamíferos, aves, abelhas e outros artrópodes benéficos, incluindo ácaros predadores. Podem apresentar certo grau de toxicidade sobre peixes e invertebrados aquáticos, mas seu risco é mínimo devido à rápida degradação que sofrem na água e no solo. Ainda não há relatos de resistência a esse grupo de produtos. Portanto, tratam-se de acaricidas altamente eficientes e seletivos, adequados a um programa de manejo integrado de pragas (MIP). Por serem moléculas relativamente recentes e importadas, seu custo de aquisição é alto, motivo pelo qual ainda não são amplamente utilizados no Brasil.

Na próxima semana, entenderemos o funcionamento dos inseticidas pertencentes aos Grupos 21 e 24: inibidores dos complexos III e IV da cadeia de transporte de elétrons da mitocôndria. A reprodução desse texto, ou partes dele, deve ser precedida de autorização dos autores e acompanhada de citação da seguinte fonte: POZEBON, H.; ARNEMANN, J. A. Como funcionam os inseticidas inibidores do transporte de elétrons? (Parte 1). Portal Mais Soja. 2021. Disponível online.

Revisão: Prof. Jonas Arnemann, PhD. e coordenador do Grupo de Manejo e Genética de Pragas – UFSM



REFERÊNCIAS:

SALGADO, V. L. 2013. BASF Insecticide Mode of Action Technical Training Manual. Disponível em:https://agriculture.basf.com/global/assets/en/Crop%20Protection/innovation/BASF_Insecticide_MoA_Manual_2014.pdf

IRAC. 2018. Mode of Action Classification Scheme.
Disponível em: https://www.irac-online.org/documents/moa-structures-poster-english/?ext=pdf

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