O mofo-branco, causado pelo fungo Sclerotinia sclerotiorum (Lib.) de Bary, um fitopatógeno necrotrófico, é uma das mais importantes doenças da cultura da soja no Brasil, proporcionando reduções médias de produtividade de 20% a 30%, podendo chegar a 70% em algumas lavouras. Estima-se que cerca de 28% da área de produção de soja brasileira esteja infestada pelo patógeno, totalizando mais de 10 milhões de hectares que necessitam da adoção de medidas integradas de manejo da doença.
Fonte: Embrapa, CIRCULAR TÉCNICA 152, Agosto, 2019.
Os estados mais afetados pelo mofo-branco são Goiás e Paraná (com mais de dois milhões de hectares infestados em cada estado), Rio Grande do Sul, Bahia e Mato Grosso (com um a dois milhões de hectares infestados), Minas Gerais (com meio a um milhão de hectares infestados) e Mato Grosso do Sul, São Paulo e Santa Catarina (com menos de meio milhão de hectares infestados) (Meyer, 2018).
Uma característica de fundamental importância epidemiológica de S. sclerotiorum é a produção de escleródios, que são as estruturas de sobrevivência do fungo no solo e constituem a fonte primária de inóculo da doença para a safra subsequente. Em condições favoráveis, esses escleródios germinam, formando apotécios, de onde são produzidos os ascosporos que colonizam as pétalas de soja, que servem de substrato para o fungo no início da infecção nas hastes e nos pecíolos (Grau; Hartman, 2015).
A manutenção da umidade do solo é fundamental para a ocorrência da doença, pois a germinação dos escleródios depende de alta umidade (chuvas frequentes), de temperaturas entre 15°C e 25°C, e de pouca incidência de luz solar (sombreamento do solo pelas plantas).
Pela dependência dessas condições, a ocorrência de mofo-branco em soja varia de intensidade entre as safras (Jaccoud Filho et al., 2017; Reis et al., 2019). O manejo do mofo-branco em soja requer a adoção integrada de medidas de controle cultural, químico e biológico.
O controle químico, por meio da aplicação de fungicidas foliares, é uma das principais medidas de controle da doença, e deve ser adotado para proteger as plantas da infecção pelo patógeno, no período de maior vulnerabilidade da soja, que compreende o início da floração ou fechamento das entrelinhas até o início de formação de vagens (Meyer et al., 2018).
A eficiência do controle químico de mofo-branco em soja vem sendo avaliada desde a safra 2008/2009, por meio da rede de ensaios cooperativos conduzidos por pesquisadores de instituições de pesquisa e experimentação, nos estados de maior ocorrência da doença. Com base nos resultados destes ensaios, para cada ponto percentual de aumento da incidência de mofo-branco ocorre uma redução média na produtividade da soja de 17,2 kg ha-1, e um incremento na produção de escleródios de 100 g ha-1 (Lehner et al., 2016).
O objetivo dos experimentos cooperativos de controle químico de mofo-branco em soja é a avaliação da eficiência de controle de cada fungicida no alvo biológico. Para isso são utilizadas aplicações sequenciais de fungicidas, o que não constitui uma recomendação de controle. As informações contidas nessa publicação devem ser utilizadas para embasar programas de controle químico de mofo-branco, priorizando sempre a rotação ou a associação de fungicidas com diferentes modos de ação para atrasar o aparecimento de resistência do fungo e obter níveis mais eficientes de controle.
Material e Métodos
Os experimentos da safra 2018/19 foram realizados em 13 locais distribuídos nos Estados do Paraná, de Goiás, da Bahia, do Mato Grosso do Sul, de Minas Gerais e no Distrito Federal (Tabela 1), com o objetivo de avaliar a eficiência de fungicidas no controle do mofo-branco da soja.
O protocolo utilizado no experimentos com os fungicidas, doses e épocas de aplicação é apresentado na Tabela 2. Os experimentos foram realizados em delineamento de blocos casualizados, com quatro repetições e parcelas de seis linhas de 6 m de comprimento (16,2
m2 a 18 m2 ), estabelecendo-se uma parcela útil de 4 linhas de 5 m. As aplicações foram realizadas com pulverizador costal pressurizado com CO2 e volume de calda variando entre 150 L ha-1 e 200 L ha-1.
Foram realizadas pelo menos três avaliações da incidência de mofo-branco durante a fase reprodutiva da soja, pela contagem do número de plantas com e sem sinais de S. sclerotiorum nas duas linhas centrais da parcela útil (mínimo de 80 plantas por parcela).
Foi avaliada a produtividade da soja e quantificada a massa de escleródios obtida na trilha das plantas de cada parcela. Os resultados foram analisados individualmente para cada local, observando-se o quadrado médio residual, a assimetria e curtose foram avaliadas pelos gráficos de boxplot, a normalidade da distribuição dos resíduos (Shapiro; Wilk, 1965), o teste de informação de Akaike (AIC) foi utilizado para a seleção do melhor modelo e, neste caso foi aceito o modelo com efeitos aleatórios , e a homogeneidade de variâncias dos tratamentos foi comparada pelo teste de Levene (1952).
A análise de resíduos foi avaliada no intervalo entre -2 e +2, desta forma, valores que ultrapassassem este intervalo foram considerados não representativos no conjunto de dados. Além das análises exploratórias individuais, a correlação entre a incidência de mofo-branco em início e final de formação de grãos (R5.2 e R5.5); incidência em R5.5; produtividade e massa de escleródios e a razão de quadrados médios também foram utilizadas na seleção dos ensaios que compuseram as análises conjuntas.
O teste de comparações múltiplas de médias de Tukey (p≤0,05) foi aplicado à análise conjunta, a fim de se obter grupos de tratamentos com efeitos semelhantes. Todas as análises foram realizadas utilizando o módulo GLIMMIX do programa SAS® versão 9.4 (SAS/STAT, 2016). As estimativas dos parâmetros foram realizadas pelo método de Máxima
Verossimilhança Restrita (REML).
Resultados e Discussão
Dos 13 locais onde os ensaios foram conduzidos, cinco locais não foram utilizados na análise conjunta (locais 2, 3, 5, 10 e 13, Tabela 1) por apresentarem baixa incidência da doença em razão das condições de ambiente desfavoráveis ao seu desenvolvimento.
Em função da homogeneidade dos dados, as análises conjuntas para incidência de mofo-branco e produtividade da soja foram compostas pelos dados de oito locais e, para massa de escleródios, pelos dados de cinco locais. A incidência média de mofo-branco no tratamento sem aplicação de fungicidas (T1) foi de 46,1%.
Os melhores níveis de controle químico observados nos ensaios da safra 20018/19 foram inferiores aos dos ensaios das safras passadas, variando de 50% a 58% entre os tratamentos T3 a T6 (Tabela 3). Essa redução nas médias de controle de mofo-branco se deve, provavelmente, às instabilidades das condições climáticas verificadas durante a safra, comprometendo a eficiência do controle químico.
Foi observada redução de 31% na produtividade da soja, no tratamento sem controle de mofo-branco (T1) em relação ao tratamento mais produtivo (T5), que superou os demais tratamentos fungicidas (Tabela 3).
A média da produção de escleródios (massa de escleródios) de S. sclerotiorum coletados das plantas do tratamento sem controle (T1) foi de 12366 g ha-1. Apesar de apresentar redução de até 70% na produção de escleródios, não houve diferença estatística entre os tratamentos fungicidas, nem mesmo em relação ao tratamento sem controle (T1) (Tabela 3).
O controle químico de mofo-branco continua sendo uma das principais medidas de controle da doença na cultura da soja, entretanto, devido a constante produção de inóculo, mesmo que reduzida com a aplicação de fungicidas eficientes, e considerando-se também as variações ambientais que afetam a eficiência do controle químico, a adoção das demais medidas de controle devem ser mantidas para o manejo da doença.
É importante ressaltar que os fungicidas mais eficientes no controle de mofo-branco em soja estão distribuídos em diferentes grupos relacionados ao modo de ação sobre S. sclerotiorum possibilitando rotacioná-los, de forma que exerçam menor pressão de seleção sobre o patógeno e viabilize a adoção de estratégias antirresistência do fungo aos fungicidas, preservando a eficiência das moléculas pelo maior tempo possível.
Fonte: Embrapa, CIRCULAR TÉCNICA 152, Agosto, 2019.
Autores: Maurício Conrado Meyer, Hercules Diniz Campos, Claudia Vieira Godoy, Carlos Mitinori Utiamada, Alfredo Riciere Dias, David de Souza Jaccoud Filho, Fernanda Carvalho Lopes de Medeiros, Jeane Valim Galdino, José Nunes Junior, Luís Henrique Carregal Pereira da Silva, Luiz Nobuo Sato, Maria Cristina Neves de Oliveira, Mônica Cagnin Martins, Nédio
Rodrigo Tormen.
Referências
CAMPOS, H. D.; SILVA, L. H. C. P.; MEYER, M. C.; SILVA, J. R. C.; NUNES JÚNIOR, J. Mofo branco na cultura da soja e os desafios da pesquisa no Brasil. Tropical Plant Pathology, Brasília, v. 35, p. C-CI, ago. 2010.
GRAU, C. R.; HARTMAN, G. L. Sclerotinia stem rot. In: HARTMAN, G. L.; RUPE, J. C.; SIKORA, E. J.; DOMIER, L. L.; DAVIS, J. A.; STEFFEY, K. L. (Ed.). Compendium of soybean diseases and pests. 5. ed. St. Paul, MN: American Phytopathological Society, 2015. p.59-62.
JACCOUD FILHO, D. S.; NASSER, L. C. B.; HENNENBERG, L.; GRABICOSKI, E. M. G.; JULIATTI, F. C. Mofo-branco: Introdução, histórico, situação atual e perspectivas. In:
JACOOUD FILHO, D. S.; NASSER, L. C. B.; HENNENBERG, L.; GRABICOSKI, E. M. G. (Ed.).
Mofo branco. Ponta Grossa: Toda Palavra, 2017. p. 29-73.
LEHNER, M. S.; PETHYBRIDGE, S. J.; MEYER, M. C.; DEL PONTE, E. M. Meta-analytic modelling of the incidence-yield and incidencesclerotial production relationships in soybean white mold epidemics. Plant Pathology, v. 66, n. 3, p. 460-468, 2017.
LEVENE H. On the power function of tests of randomness based on runs up and down. The Annals of Mathematical Statistics, v. 23, p. 34-56, 1952.
MEYER, M. C. Mofo-branco na cultura da soja. Revista do Produtor Rural do Paraná, v. 11, n. 68, p.12, 2018.
MEYER, M. C.; CAMPOS, H. D.; GODOY, C. V.; UTIAMADA, C. M.; SEII, A. H.; DIAS, A. R.; JACCOUD FILHO, D. S.; BORGES, E. P.; JULIATTI, F. C.; NUNES JUNIOR, J.; SILVA, L. H. C. P. da; SATO, L. N.; MARTINS, M. C.; VENANCIO, W. S. Eficiência de fungicidas para controle de mofo-branco (Sclerotinia sclerotiorum) em soja, na safra 2017/18: resultados sumarizados dos ensaios cooperativos. Londrina: Embrapa Soja, 2018. 5 p. (Embrapa Soja.
Circular Técnica, 140).
REIS, E. M.; ZANATTA, M.; REIS, A. C. Mofo-branco da soja. Passo Fundo: Berthier, 2019. 96 p.
SAS/STAT®. Versão 9.4 do sistema SAS para Windows. Cary, NC: SAS Institute Inc., 2016.
SHAPIRO, S. S.; WILK, M. B. An analysis of variance test for normality. Biometrika, Oxford, v. 52, p. 591-611,1965.