Estudos em rede conduzidos por três unidades da Embrapa em Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás e Bahia garantem base tecnológica para que cultura do algodão seja inserida com segurança e sustentabilidade em sistemas que utilizam Integração Lavoura Pecuária, ILP; tudo isso, sem abrir mão dos princípios elementares do Sistema Plantio Direto. Em entrevista exclusiva, Fernando Lamas, pesquisador da Embrapa Agropecuária Oeste, fala sobre o trabalho que já está em fase de validação.
FEBRAPDP – Para fazer a inserção do algodão na Integração Lavoura Pecuária (ILP) em Sistema Plantio Direto (SPD), em tese, seria só se organizar, plantar e colher o algodão nas janelas corretas e tudo daria certo. Mas, na prática a coisa não funciona assim. Por quê? Quais as mais significativas dificuldades para a inclusão do algodão nesse arranjo?
Fernando Lamas – Os trabalhos de pesquisa desenvolvidos pela Embrapa em Primavera do Leste, MT, Santa Helena de Goiás, GO, e Luiz Eduardo de Magalhães, BA, não deixam qualquer dúvida que é possível e viável o cultivo do algodoeiro em Sistema Plantio Direto (SPD) com rotação de culturas, não movimentação do solo e solo coberto com palha ou plantas em crescimento. No sistema Integração Lavoura Pecuária (ILP), o cultivo do algodoeiro é perfeitamente possível, sendo cultivado em áreas anteriormente ocupadas com pastagem. Não existe dificuldade significativa, apenas a área deve ser adequada para integrar o sistema – correção do solo e controle de erosão. O modelo tratado nesta entrevista não tem o componente florestal, do ILPF.
FEBRAPDP – Qual o ponto de partida dessa demanda? E há quanto tempo vem sendo pesquisada essa combinação?
Fernando Lamas – A essência da demanda está na busca, por parte dos agricultores, de modelos de produção que realmente sejam sustentáveis. A Embrapa e seus parceiros desenvolvem trabalhos com a cultura do algodoeiro em SPD desde o final dos anos de 1990. O que é fundamental para o cultivo do algodoeiro em SPD é, antes da implantação do sistema fazer as adequações necessárias: controle da erosão, eliminação de cama das compactadas e correção do solo.
FEBRAPDP – Quais os primeiros resultados alcançados e quais as projeções que a Embrapa contempla para o futuro tendo em vista o que já se sabe neste momento?
Fernando Lamas – Nos trabalhos atualmente em andamento, estamos confirmando que é possível incorporar o cultivo do algodoeiro aos sistemas integrados de produção, tendo como um dos integrantes do sistema o componente animal. A grande vantagem do modelo é que ele propicia condições de intensificar e integrar de forma sustentável a produção de grãos, carne e fibra. A área total das lavouras experimentais é de 640 hectares, divida em 4 talhões de 140 hectares cada. A produtividade do algodão tem chegado a 320 arrobas por hectare; 75 sacas por hectare de soja; 190 sacas por hectare de milho verão e 130 sacas por hectare de milho safrinha.
FEBRAPDP – O que muda em relação aos sistemas que trazem o milho e a soja como atores principais? Na prática, como tem ficado o cronograma das lavouras?
Fernando Lamas – No modelo que estamos trabalhando o cultivo de soja e milho, fazem parte também do sistema, inclusive o milho verão, além do algodoeiro e da pastagem. Em outubro se estabelece a soja, a pastagem, em novembro o milho e a pastagem, em dezembro o algodoeiro e em janeiro, na área cultivada com soja milho + braquiária. Estamos adotando um sistema de rotação de culturas entre os talhões.
FEBRAPDP – O que muda sob o ponto de vista do manejo animal?
Fernando Lamas – Nada. O que estamos constatando que os animais vão para o confinamento, com peso maior, com isto o acabamento no confinamento se dá num menor espaço de tempo. Menor custo.
FEBRAPDP – Gostaria que o senhor falasse um pouco sobre o aspecto fitossanitário nesse contexto.
Fernando Lamas – Sempre que aumentamos a biodiversidade de um agroecossistema, que é o que estamos fazendo, cultivando num mesmo ambiente soja, milho, algodoeiro e pastagem, de uma maneira geral tem-se redução na incidência de plantas daninhas, pragas, doenças e nematoides. Com o SPD verifica-se uma melhoria do solo devido ao acúmulo de matéria orgânica, melhoria da parte física e química, o que confere às plantas maior capacidade para superar eventuais estresses causados pelos agentes bióticos (pragas e doenças) e abióticos (seca) acima mencionados.
FEBRAPDP – Sob o ponto de vista econômico, sabemos que o algodão é uma lavoura com custos de produção mais elevados que milho e soja, até que ponto isso pesa em termos de risco para esse sistema?
Fernando Lamas – Embora o custo de produção do algodão seja maior que o da soja e do milho, quando o seu cultivo é feito de forma que o algodão é um componente do sistema de produção, a lucratividade do algodão é superior à da soja e do milho. É oportuno destacar que, a lucratividade do algodão depende do custo de produção, da produtividade, do preço do algodão que é muito em função da qualidade. Atualmente, para algodão de boa qualidade existe um excelente mercado e este proporciona boa rentabilidade ao produtor, podendo inclusive contribuir pra redução dos custos de produção da cultura sucessora.
FEBRAPDP – O que as pesquisas têm apurado no que tangem à viabilidade econômica do modelo?
Fernando Lamas – A viabilidade econômica é muito dependente do modelo de produção. No SPD, tem-se a melhoria dos atributos físicos, químicos e biológicos do solo. Com isto, verifica-se melhorias na produtividade e redução do custo de produção. Em um ambiente mais equilibrado, as plantas aproveitam de forma mais eficiente os fertilizantes, por exemplo. Assim, quando cultivado em SPD o algodão é uma cultura estratégica para compor um sistema de produção e assegura boa rentabilidade ao produtor.
FEBRAPDP – Qual a expectativa da chegada desse trabalho às lavouras comerciais?
Fernando Lamas – Hoje, estamos trabalhando em ambiente de produtor também, onde anualmente se cultiva algodão, soja, milho verão, milho segunda safra e pastagem. O talhão com pastagem é divido em quatro, os animais ficam sete dias em cada piquete, retornando depois de vinte e um dias. Neste sistema, a capacidade suporte da pastagem é muito boa 6 – 8 UA/ha, com ganho de peso da ordem de 600 a 800g/dia. Com esses resultados, todo o produtor da região dos chapadões (MS, MT e GO), podem adotar o modelo que está sendo validado. Um detalhe fundamental é o acompanhamento técnico em todas as fases de (produção agrícola e pecuária).
FEBRAPDP – Quem participa desse projeto?
Fernando Lamas – Da Embrapa Agropecuária Oeste: Júlio Salton, Fernando Mendes Lamas; Michely Tomasi; Alceu Richetti; da Embrapa Algodão: Alexandre Cunha de Barcellos Ferreira e Ana Luzia Dias Coelho Borin; José Edmilson Miranda; da Embrapa Arroz e Feijão: Janaine de Souza Saraiva, e da Embrapa Gado de Corte: Ademir Zimmer.
Fonte: Da Redação FEBRAPDP ( Federação Brasileira de Plantio Direto e Irrigação)