O presidente do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), o general João Carlos Corrêa, descartou a possibilidade de novos assentamentos para trabalhadores rurais serem feitos pelo governo, em audiência pública na Câmara dos Deputados nesta quinta-feira (4). “Com orçamento praticamente zerado, não é possível abrir novos assentamentos. Seria total irresponsabilidade”, disse.
No debate promovido pela Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural, a pedido do deputado Vilson da Fetaemg (PSB-MG), o presidente do Incra atribuiu a falta de recursos ao governo anterior. Conforme ele, quando houver recursos, a prioridade do governo será a titulação das terras. “É algo que vai ser feito, mas quando vai ser feito? Em breve”, afirmou.
Corrêa descartou ainda promover a democratização das terras no Brasil por meio da desapropriação de terras improdutivas. “Desapropriações é algo que tem que ser revisto. Isso não é algo que deu certo”, disse. Ele atribuiu a atual situação precária dos assentamentos a governos anteriores. “Desapropriações massivas foram feitas sem planejamento, houve reforma agrária desenfreada – muita coisa deu certo, outras errado por conta de planejamento equivocado -, acarretando descontrole fundiário e precariedade nos assentamentos”, avaliou.
Fragilidade operacional
O deputado Airton Faleiro (PT-PA) criticou a fala do presidente do Incra por se centrar em críticas ao governo anterior. “Essa não é uma tentativa ideológica de se segurar politicamente diante da fragilidade operacional do governo nas políticas de reforma agrária?”, questionou. “Nós temos que debater aqui o que este novo governo vai fazer. Aí acho que o senhor foi fraco para caramba na sua exposição”, opinou, sendo aplaudido por trabalhadores rurais que lotaram a comissão.
Na audiência, trabalhadores rurais assentados prestaram depoimento afirmando que hoje não passam fome graças à reforma agrária.
Segundo o presidente do Incra, entre 1995 e 2016, R$15 bilhões foram utilizados para desapropriações de terras e, em muitas áreas, hoje não há nenhum assentado. Ele acrescentou que mais R$ 16,5 bilhões foram empregados na infraestrutura desses assentamentos, no fomento e na assistência técnica, mas não chegaram ao seu destino. Para ele, a reforma agrária foi feita sem planejamento. Segundo ele, o governo seguirá a Constituição e fará a reforma agrária, mas em outro formato, sem assentar pessoas em terras improdutivas.
Liberação de créditos
Secretário de Finanças e Administração da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), Juraci Souto ressaltou que é a falta de acesso à crédito para produzir que leva os agricultores a deixarem as terras onde foram assentados. “Foram assentadas quase 1,350 milhão de famílias desde a década de 70, e, dessas, 970 mil pessoas continuam na terra. Ninguém deixa o lote por querer abandonar o seu pedaço de terra. É exatamente por falta de recursos, por falta de apoio”, observou. Segundo Juraci, há famílias assentadas há mais de dez anos que continuam sem acesso à moradia. O déficit de moradias em assentamentos seria de 125 mil unidades.
Juraci cobrou a liberação de crédito para assentamentos. Ele apontou que decreto de governo de 2018 previu crédito para os assentamentos, mas eles não estão sendo aplicados. “Existe distanciamento muito grande da edição de normas e sua real execução”, destacou. “A Lei Orçamentaria Anual de 2019 para reforma agrária e assentamentos é a menor de toda a história”, acrescentou Juraci.
O dirigente da Contag salientou ainda que a luta pelo acesso à terra – direito previsto na Constituição de 1988 – continua sendo a demanda número um dos trabalhadores rurais e defendeu as desapropriações como modo de desconcentrar as terras. “O Brasil é um dos países que mais concentra terras no mundo”, afirmou. Assentado em Paracatu (GO), Otacílio Cândido Pereira acrescentou que o Brasil é um dos poucos países do mundo que não têm regras para limitar o tamanho das propriedades. Para o agricultor, com o devido apoio, os trabalhadores rurais assentados têm condições de se contrapor ao “envenenamento” da produção alimentar do agronegócio por agrotóxicos.
Edição – Marcia Becker