O presente estudo teve por objetivo avaliar o efeito da adição de inibidor de urease e do poder tampão do solo sobre a taxa de conversão do N-NH2 da ureia para N-NH4+ no solo e seu reflexo sobre as perdas de N da ureia por volatilização de amônia.
Autores: Fernando Viero¹; Adriana Cancian²; Eduardo Carniel2; Cimélio Bayer³
Introdução
A volatilização de amônia (NH3) é uma das principais formas de perda de nitrogênio (N) da ureia. A volatilização de amônia ocorre a partir da hidrólise da ureia pela atividade da enzima urease, a qual converte o NH2 da ureia em NH4+, promovendo uma elevação localizada do pH ao redor dos grânulos de ureia (Sherlock et al., 1987). O aumento no pH favorece a formação de NH3, que pode ser volatilizada para a atmosfera (Keller & Mengel, 1986), principalmente em solos sob plantio direto. Viero et al. (2017) verificaram perdas de N-NH3 entre 20 e 30 % do N aplicado em cobertura na cultura do milho, as quais normalmente estão associadas a elevadas temperaturas e umidade do solo (Holcomb et al., 2011), principalmente, em solos com baixa capacidade de tamponamento do pH. O uso do inibidor de urease [NBPT (N-(n-butil) tiofosfórico triamida] tem se mostrado eficiente na redução da volatilização de N, reduzindo essas perdas em média 53 %, comparado à ureia comum (Cantarella et al., 2018).
Essa redução ocorre, pois, o NBPT atua diretamente sobre o sítio ativo da enzima urease, impedindo a ligação da enzima à molécula de ureia, reduzindo a taxa de conversão do N-NH2 para N-NH4+ (Sanz-Cobena et al., 2011). Assim, com a hidrólise da ureia temporariamente inibida, o fertilizante tem um tempo maior para ser incorporado ao solo, reduzindo o potencial de volatilização (Silva et al., 2017). O presente estudo teve por objetivo avaliar o efeito da adição de inibidor de urease e do poder tampão do solo sobre a taxa de conversão do N-NH2 da ureia para N-NH4+ no solo e seu reflexo sobre as perdas de N da ureia por volatilização de amônia.
Material e Métodos
Este estudo foi realizado em três tipos de solo: Argissolo Vermelho Distrófico, Latossolo Vermelho Distrófico e Latossolo Bruno Alumínico (Embrapa, 2013), no qual foram conduzidos experimentos a campo, na safra 2016/17, para avaliação das perdas de N por volatilização, segundo metodologia descrita em Viero et al. (2017). Os atributos químicos e físicos desses solos são apresentados na Tabela 1.
Tabela 1. Atributos dos solos utilizados no estudo
Para a avaliação da taxa de conversão do NH2 em NH4+, foram incubados durante 29 dias, amostras de 5 g de solo úmido (60 % da capacidade de campo), coletadas na camada de 0 a 10 cm de profundidade, a temperatura de 25 – 28 ºC (Barth, 2009) A cada amostra de solo foi adicionado uma dose equivalente de 400 kg ha-1 de N (~500 mg kg-1), utilizando ureia comum e ureia com inibidor de urease [NBPT (N-(n-butil) tiofosfórico triamida], e um
tratamento controle sem adição de N. O delineamento experimental foi inteiramente casualizado, com três repetições, em cada local.
Resultados e Discussão
A adição de NBPT à ureia comum reduziu a taxa de amonificação do N-NH2 nos primeiros três dias após a aplicação (Figura 1), evidenciado tanto pelos menores valores do pH(H2O) (Figura 1a, 1b e 1c), bem como pelos menores teores de N-NH4+ (Figura 1d,1e e 1f), comparados à ureia comum nos três solos avaliados.
Figura 1. Variação do pH (a, b, c) e dos teores de amônio (d, e, f) no solo após o início da
incubação Barras verticais indicam a diferença mínima significativa entre os tratamentos segundo teste de Tukey (p ≤ 0,05).
No Argissolo Vermelho, aproximadamente 50 % do N aplicado (224 mg kg-1) estava na forma de NH4+ no segundo dia após o início da incubação com a aplicação de ureia comum. Por sua vez, com o uso do inibidor de urease apenas 20 % do N aplicado (109 mg kg-1) havia sido convertido a NH4+, representando uma redução em torno de 50% na taxa de amonificação. Para o Latossolo Vermelho e Latossolo Bruno, o teor de N-NH4+ foi, em média, 42 % do N aplicado (207 e 217 mg kg-1), respectivamente, dois dias após o início da incubação com a aplicação de ureia comum, reduzindo 104 e 72 mg kg-1 de NH4+ com o uso do inibidor de urease (~ 21 e 14 % do N aplicado, respectivamente), correspondendo a uma redução de 50 a 67 % na taxa de amonificação.
Esses resultados demonstram a eficiência do NBPT em inibir a atividade da enzima urease na hidrólise da ureia (Timilsena et al., 2015). A menor elevação do pH do solo com o uso do NBPT reforça a eficiência do inibidor da urease em retardar a hidrólise da ureia nos dias imediatamente após a adição do fertilizante nos três solos (Figura 1a, 1b, 1c). Com o uso do NBPT os valores de pH(H2O) foram 0,9, 0,7 e 0,6 unidades inferiores comparado à ureia comum no segundo dia após o início da incubação no Argissolo, Latossolo Vermelho e Bruno, respectivamente. A elevação do pH(H2O) comparando com o início da incubação da ureia com o solo foi de 2,6 unidades para o Argissolo, e 2,1 e 0,6 unidades para o Latossolo Vermelho e Bruno, respectivamente, o qual foi inversamente relacionada aos teores de argila e teores de MO (Tabela 1).
Esses resultados evidenciam a maior capacidade de tamponamento do pH(H2O) nos Latossolos, principalmente no Latossolo Bruno, em relação ao Argissolo. Essa maior capacidade de tamponamento do pH(H2O) pode explicar, em parte, a menor volatilização de N-NH3 observada nos Latossolos (Holcomb et al., 2011). A perda de N da ureia por volatilização de amônia foi de 28, 5 e 14 % do N aplicado no Argissolo, Latossolo Vermelho e Latossolo Bruno, respectivamente, sendo reduzidas significativamente com o uso de inibidor de urease no Argissolo e no Latossolo Bruno (76 e 50 % menores, respectivamente). Essa redução decorre da menor conversão do NH2 da ureia para NH4+ (como verificado no estudo conduzido em laboratório) reduzindo os picos de volatilização em 85, 61 e 83 % com o uso de inibidor de urease no Argissolo, Latossolo Vermelho e Latossolo Bruno, respectivamente, devido à redução da atividade da urease no solo (Timilsena et al., 2015).
A maior perda de N-NH3 da ureia no Argissolo decorre, além das condições meteorológicas do período, pelo menor poder tampão do solo, diferentemente dos Latossolos. No entanto, para que o solo atue como mitigador da volatilização é necessário que o fertilizante entre em contato com o mesmo, não permanecendo sobre a palha. Nesse caso, a ação do inibidor de urease é fundamental para reduzir a conversão do NH2 em NH4+, consequentemente a volatilização.
Conclusão
A maior capacidade de tamponamento de pH(H2O) nos Latossolos argilosos possivelmente contribui para a ocorrência de menores taxas de volatilização de amônia em comparação ao Argissolo de textura média. A adição de inibidor de urease à ureia reduz o aumento do pH, retardando a taxa de conversão de NH2 para NH4+, reduzindo as perdas de N da ureia por volatilização de amônia, independentemente do tipo de solo.
Confira nossa galeria de cursos TOTALMENTE ONLINE! Agregue conhecimento, faça já!
Referências
Barth G. Inibidores de urease e de nitrificação na eficiência de uso de adubos nitrogenados.
Universidade de São Paulo, 2009.
Cantarella H, Otto R, Soares JR e de Brito Silva AG. Agronomic efficiency of nbpt as a urease inhibitor: A review. Journal of advanced research, 2018.
EMBRAPA. Sistema brasileiro de classificação de solos. 3 ed. Brasília, Embrapa, 2013. 353 p.
Holcomb JC, Sullivan DM, Horneck DA e Clough GH. Effect of irrigation rate on ammonia volatilization. Soil Sci Soc Am J, 75:2341-2347, 2011.
Keller GD, Mengel DB. Ammonia volatilization from nitrogen fertilizers surface applied to no-till corn. Soil Sci Soc Am J. 1986; 50:1060-1063.
Sanz-Cobena A, Misselbrook T, Camp V e Vallejo A. Effect of water addition and the urease
inhibitor nbpt on the abatement of ammonia emission from surface applied urea. Atmos Environ,
45:1517-1524, 2011.
Sherlock RR, Black AS, Smith NP. Microenvironment soil pH around broadcast urea granules
and its relationship to ammonia volatilization. Nitrogen Cycling in Temperate Agricultural
Systems. 1987:316-326.
Timilsena YP, Adhikari R, Casey P, Muster T, Gill H e Adhikari B. Enhanced efficiency fertilisers: A review of formulation and nutrient release patterns. J Sci Food Agric, 95:1131 1142, 2015.
Viero F, Menegati GB, Carniel E, Silva PRF e Bayer C. Urease inhibitor and irrigation management to mitigate ammonia volatilization from urea in no-till corn. R. Bras. Ci. Solo, 41:1-11, 2017.
Informações dos autores
¹Departamento de Solos, Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Porto Alegre/RS. E-mail: fernandoviero@gmail.com;
²Programa de Pós-Graduação em Ciência do Solo, Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Porto Alegre/RS;
³Professor Associado Departamento de Solos, Universidade Federal do Rio Grande do Sul
(UFRGS), Porto Alegre/RS.
Disponível em: Anais do II Congresso Online para Aumento de Produtividade do Milho e Soja (COMSOJA), Santa Maria, 2019.