O manejo de insetos-praga na agricultura envolve a aplicação de diferentes estratégias, como o controle mecânico, cultural, biológico e químico, além de técnicas de transgenia. O controle químico é atualmente o método mais rápido e efetivo comparado aos demais, embora apresente desvantagens ligadas à contaminação do meio ambiente, problemas associados à saúde humana, e seleção de insetos resistentes.

Portanto, impera a necessidade de buscar-se abordagens inovadoras e eficazes envolvendo a resistência de plantas contra insetos-praga, de forma alternativa ao controle químico comumente utilizado. Nos últimos anos, a biotecnologia forneceu ferramentas adicionais para limitar os danos causados por insetos-praga, incluindo a técnica denominada RNA de interferência (RNAi).

O  RNAi é um mecanismo conservado por meio da evolução na maioria das células eucarióticas, ocasionando redução de expressão e silenciamento de certos genes. Trata-se de um processo natural, desencadeado pela presença de RNA fita-dupla (dsRNA, double-stranded RNA) com o objetivo de inibir a produção de vírus e preservar a integridade do genoma (FIRE et al., 1998). Com o avanço nas técnicas de biologia molecular, tornou-se possível projetar e construir dsRNA específicos para o silenciamento de qualquer gene de interesse, abrindo caminho para um vasto campo de aplicações que vão desde a medicina até a agricultura (CHRISTIAENS et al., 2020).

Figura 1. Mecanismo de RNAi aplicado ao controle de pragas.

Em 1998, Andrew Fire e Craig Mello conseguiram elucidar totalmente o mecanismo e aplicá-lo no silenciamento gênico de Caenorhabditis elegans, uma espécie de nematoide. A partir daí, passou-se a explorar a viabilidade da técnica em uma ampla gama de insetos, incluindo abelhas, mosquitos, mariposas e outros artrópodes, como carrapatos. Recentemente, Ji et al. (2020) utilizaram RNAi para silenciar um gene conhecido como imitation switch (ISWI), que confere tolerância à temperatura em mosca-branca (Bemisia tabaci). Como resultado, o inseto-praga passou a apresentar tolerância significativamente reduzida ao estresse por calor e frio, diminuindo sua capacidade de sobrevivência.

Pensando na aplicação em campo, a técnica de RNAi pode ser incorporada diretamente nas plantas, através da produção de variedades geneticamente modificadas que expressem o gatilho de RNAi contra uma espécie-alvo. Vários estudos destacaram o potencial desta técnica no controle de insetos-praga, e recentemente o primeiro milho transgênico (MON87411) capaz de expressar dsRNA contra Diabrotica virgifera recebeu aprovação para cultivo em mais de 15 países.



Figura 2. Larvas de Diabrotica virgifera com e sem ação de RNAi, à esquerda e à direita, respectivamente.

Fonte: Embrapa. Imagem original disponível clicando aqui.

Adicionalmente, é possível realizar aplicações exógenas de dsRNA via pulverização nas plantas ou diretamente no alvo, com eficácia de controle satisfatória. Estudos já demonstraram o sucesso da aplicação do mecanismo de RNAi como agente de controle em mais de 20 espécies-praga, incluindo lepidópteros, coleópteros, himenópteros, entre outros. Os efeitos do RNAi dentro do corpo do inseto são determinados por um fator importante, o espalhamento das moléculas de RNA silenciadoras (YANG et al., 2011).

As possibilidades de silenciamento gênico e consequente ação sobre o inseto são as mais variadas possíveis. Por exemplo, para a lagarta-da-seda (Bombyx mori), o método de controle se dá através de plantas transgênicas, e os genes-alvo são o gene do relógio circadiano e o gene β-actina, que levam à interrupção da incubação dos ovos e função letal no segundo estágio larval, respectivamente (YANG et al., 2011).

Portanto, a técnica de RNAi é uma alternativa extremamente promissora a ser explorada no controle de pragas agrícolas. Uma das barreiras que podem afetar a eficácia desta técnica é a baixa estabilidade do dsRNA no meio ambiente e no trato digestivo dos insetos (CHRISTIAENS et al., 2020). Também é importante destacar que a utilização de ferramentas baseadas em RNAi não deve ser considerada uma estratégia autônoma de controle de pragas, mas sim parte de uma abordagem sinérgica no contexto do Manejo Integrado de Pragas (MIP), visando à sustentabilidade futura do controle de pragas.

Revisão: Henrique Pozebon, Doutorando PPGAgro – UFSM e Prof. Jonas Arnemann, PhD. e Coordenador do grupo de Manejo e Genética de Pragas – UFSM

REFERÊNCIAS:

CHRISTIAENS, O.; NIU, J.; NJI TIZI TANING, C. RNAi in insects: a revolution in fundamental research and pest control applications. 2020.

JI, S. et al. Using RNA interference to reveal the function of chromatin remodeling factor ISWI in temperature tolerance in Bemisia tabaci Middle East–Asia Minor 1 cryptic species. Insects, v. 11, n. 2, p. 113, 2020.

MEZZETTI, B. et al. RNAi: What is its position in agriculture?. Journal of Pest Science, v. 93, p. 1125-1130, 2020.

YANG, G. et al. Development of RNAi in insects and RNAi-based pest control. Pesticides in the Modern World-Pests Control and Pesticides Exposure and Toxicity Assessment,

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