Um encontro virtual reuniu diversos setores do complexo agroindustrial de proteína animal no dia 15/12. O objetivo foi discutir as iniciativas que têm sido desenvolvidas visando suprir a indústria com cereais de inverno na composição das rações. A reunião foi mediada pela Embrapa e ABPA.

Valdecir Folador é criador de suínos em Barão do Cotegipe, RS. Nesta safra, ele fez a compra direta de 210 toneladas de grãos como trigo, cevada e triticale, que vão compor 10% dos cereais na formulação da ração. Esta é segunda vez que o produtor faz uso dos cereais de inverno na alimentação dos animais. A primeira vez foi em 2015, quando o preço do milho subiu muito, agora foi a escassez de milho no mercado que incentivou o produtor: “Mesmo com preços semelhantes, os grãos de inverno eu fui buscar aqui perto, enquanto que o milho veio do Mato Grosso e com problemas de qualidade”, afirma Valdecir lembrando que, apesar da cotação em alta, os cereais de inverno deverão reduzir entre 5 a 10% o custo final da ração, já que, além de substituir parte do milho, o alto teor de fibras permite reduzir também o volumoso de soja. “Só não comprei mais trigo porque não encontrei, senão a concentração de cereais de inverno poderia ser ainda maior, chegando a 50%”, avalia. A dieta dos suínos na granja é acompanhada pelo nutricionista e os cereais de inverno têm mantido o desempenho e a conversão alimentar na substituição do milho.

Em 2020, a produção de milho no Brasil esteve próxima a 103 milhões de toneladas (t), com consumo estimado em 68,7 milhões de t e exportações acima de 34 milhões de t (CONAB), além de abastecer o mercado de etanol que consome quase 8 milhões de t. Os números não fecharam e foi preciso importar milho. A escassez de milho e o aumento da demanda de trigo no mercado interno afetou a indústria de proteína animal que continuou crescendo. De acordo com o Presidente da ABPA (Associação Brasileira de Proteína Animal), Ricardo Santin, as exportações de suínos cresceram 40% e o consumo de aves cresceu 6% no mercado interno, seguido do consumo de ovos que cresceu 9% entre os brasileiros. “O trigo foi rapidamente absorvido pelos moinhos e a oferta de milho enfrentou problemas climáticos”, avalia Santin.

“O cenário para o milho não deverá mudar tão cedo”, lamenta o presidente da Fecoagro/RS Paulo Pires. “Mesmo sabendo da importância do milho para a sustentabilidade agronômica do sistema, acredito que o produtor não vai aumentar a área de milho no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina. Neste ano a quebra na região noroeste do RS chegou a 100%, afetando também as áreas com irrigação que perderam 40% da produção. Nossa saída depende do aumento na área de inverno, com culturas capazes de gerar renda. O RS estava reduzindo 100 mil hectares de trigo a cada ano por falta de mercado. Se houver destino que agregue valor ao cereal de inverno, com certeza o produtor vai abraçar essa oportunidade”.

No leite, a Região Sul responde por 33% da produção brasileira. Segundo o Centro de Inteligência do Leite, em 2019 PR, RS e SC produziram 11,6 milhões de litros. Projeções no setor indicam que a Região Sul deverá produzir mais da metade de todo o leite brasileiro até 2025. A produção depende tanto de grãos de verão para a elaboração de silagem, rações e concentrados, quanto dos cereais de inverno para forragens.

Para Francisco Turra, presidente do conselho consultivo da ABPA, é possível aumentar a área com cereais de inverno para 300 mil hectares na Região Sul já no próximo ano: “Este trabalho vai movimentar diversas cadeias no setor produtivo, na indústria de máquinas e insumos, na alimentação, além de proteger o solo que fica descoberto no inverno, gerando renda em diferentes níveis da sociedade. Contamos com tecnologia da Embrapa, apoio do poder político federal e estadual, e disposição do setor produtivo e industrial para acelerar o processo”.

Para os representantes da indústria de proteína animal a viabilidade econômica do projeto é o próximo passo a ser definido: “Nos preocupa como planejar a produção com estas oscilações na oferta de milho. Sofremos com as oscilações do clima e do mercado que impactaram nossa competitividade, mas apesar das dificuldades, novos empreendedores estão apostando na Região Sul. Precisamos agir rapidamente para manter o abastecimento na produção de alimentos. A viabilidade econômica da produção de trigo precisa estar bem definida neste projeto para garantir a longevidade da parceria com o produtor”, avalia o presidente da ASGAV (Associação Gaúcha de Avicultura), José Eduardo dos Santos.

Rogério Kerber, do SIPS (Sindicato das Indústrias de Produtos Suínos) avalia que é preciso desencadear ações para abastecer o mercado ainda na próxima safra: “Temos espaço para produzir, tecnologia para utilizar e mercado para comprar. Resta agora definir o nível de remuneração do produtor e o comprometimento da indústria em absorver a produção”.

Conhecimento em pesquisa e assistência técnica

O uso de cereais de inverno na composição de ração para suínos e aves é objeto de estudo na Embrapa desde 1987. Nos últimos anos, pesquisadores da Embrapa Trigo e da Embrapa Suínos e Aves desenvolvem pesquisas visando mapear a variabilidade nutricional dos cereais de inverno com o objetivo de montar uma base de dados que ficará à disposição do setor produtivo. A Embrapa também trabalha no desenvolvimento de novas cultivares, específicas para a alimentação animal, e na avaliação da equivalência econômica dos cereais de inverno em substituição ao milho na composição de rações.

Em Santa Catarina, a assistência técnica e extensão rural está sendo preparada para atender este novo cenário, através da Epagri e das cooperativas. De acordo com o Secretário de Agricultura, Pesca e Desenvolvimento Rural de SC, Ricardo de Gouvêa, o programa Troca-Troca que é utilizado para fomentar o cultivo do milho, também deverá incluir os cereais de inverno, especialmente o trigo.

“O que une RS, SC e PR, em diálogos negociais de convergência, é a necessária competência competitiva para acessar o mercado de proteína animal com cereais de inverno de qualidade, gerando renda e bem estar no sul do Brasil”, conclui o Chefe de Transferência de Tecnologia da Embrapa Trigo, Jorge Lemainski, lembrando que a tecnologia está disponível, cabe agora a movimentação da indústria com o setor produtivo para definir o melhor plano de negócios.

Autor: Joseani Antunes (MTb 9693/RS) – Embrapa Trigo
Fonte: Emprapa

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